Alegando que trabalhou por quase três anos como empregada de uma
cooperativa de reciclagem para catadores de material reciclável, na
função de "triadeira", sem assinatura da CTPS e sem receber os direitos
trabalhistas, uma reclamante procurou a Justiça do Trabalho, pedindo o
reconhecimento do vínculo de emprego com a cooperativa, com o pagamento
dos direitos trabalhistas decorrentes. Conforme afirmou, embora tenha
prestado serviços na qualidade de associada da cooperativa, sempre
trabalhou com a presença dos requisitos da relação de emprego.
O
caso foi julgado na 37ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, pela juíza
Ana Maria Espí Cavalcanti que, entretanto, não acolheu os pedidos. Para a
julgadora, as provas revelaram que a trabalhadora desenvolvida suas
atividades em prol da cooperativa sem a presença da subordinação
jurídica e dos demais pressupostos do art. 3º da CLT. Assim, concluiu
pela inexistência do vínculo de emprego e julgou improcedentes todos os
pedidos.
A cooperativa afirmou que a reclamante era sua associada
e que fazia o serviço de "selecionar", também conhecido como "triar",
que, conforme explicou, é uma das ações realizadas pelos catadores de
material reciclável que atuam no sistema de autogestão em cooperativas.
Alegou ainda que entre a cooperativa e os associados, incluindo a
reclamante, não existe a subordinação jurídica presente na relação entre
empregado e empregador.
Em sua análise, a juíza ressaltou que a
subordinação jurídica é aferida com base num critério objetivo,
traduzindo-se no poder do empregador de conduzir o modo de execução dos
serviços. E, a partir das provas produzidas, ela constatou que a
reclamante, de fato, trabalhava sem a subordinação jurídica essencial à
relação de emprego.
A julgadora verificou que a ré é uma
cooperativa de reciclagem de catadores de material reciclável
regularmente constituída, conforme demonstrou seu Estatuto Social e seu
registro na JUCEMG. Ela notou também que a cooperativa funcionava em
imóvel público (galpão), cujo uso lhe foi autorizado pelo Decreto
Municipal 14.554, de 31 de agosto de 2011, que, em seu artigo 2º,
dispõe: "O imóvel objeto da Permissão de Uso destina-se
exclusivamente ao uso dos CATAUNIDOS, cuja finalidade é receber,
transportar, classificar, padronizar, beneficiar, armazenar,
industrializar e comercializar os materiais recicláveis, de qualquer
origem, de seus cooperados, condizente com as operações da cooperativa".
Tais finalidades, de acordo com a magistrada, coincidem com o
objeto da cooperativa estabelecido o estatuto social, finalidades essas
que eram, de fato, cumpridas pela cooperativa, conforme demonstrado pela
prova pericial.
A prova revelou ainda que a reclamante era
cadastrada como cooperada da ré desde o ano de 20/11/2012 e tinha por
atribuição principal fazer a triagem dos materiais que chegavam no
galpão, separando aqueles passíveis de reciclagem daqueles que não o
eram. Ou seja, "a reclamante, de fato, realizava atividades típicas dos associados", concluiu a juíza.
As
circunstâncias de a reclamante ter começado a trabalhar no galpão antes
de ser cadastrada como cooperada e de fazer café para os colegas e
manter limpo o ambiente de trabalho (como revelado pelas testemunhas)
não foram suficientes para alterar o entendimento da julgadora sobre a
inexistência do vínculo de emprego. Isso porque, conforme frisou a
magistrada, as atividades da reclamante sempre foram as mesmas e a
realização daquelas tarefas não desnatura o seu trabalho na condição de
associada.
"O cooperativismo tem como princípios a união para
a busca de objetivos comuns, a ideia de emancipação, iniciativa
própria, eliminação do lucro, mudança social. Portanto, numa
cooperativa, destacam-se os valores sociais que devem ser preservados,
tais como a ajuda mútua, a solidariedade, a democracia, a participação e
igualdade, que sem dúvida, representam importantes passos na conquista
da cidadania e inclusão social, sobretudo de categorias de trabalhadores
colocados à margem dos direitos trabalhistas, como na hipótese", registrou
a julgadora, na sentença. Além do mais, na visão dela, a ausência de
subordinação ficou evidente, já que as testemunhas informaram que a
presidente da Cooperativa raramente comparecia no galpão e que os
associados não precisavam justificar suas faltas.
Quanto ao fato
de a reclamante ter recebido, durante vários meses, o valor fixo de R$
700,00, a magistrada considerou explicado no depoimento de um cooperado
fundador. Ele disse que era estabelecido um valor mínimo mensal de
retirada, independentemente da produção, no montante de R$ 700,00: "se
a produção fosse insuficiente pegavam emprestado, pegavam adiantamento
de carga, por exemplo, para quitar o valor mínimo estabelecido." Para a juíza, essa situação talvez explique a dificuldade financeira vivida pela cooperativa quando a reclamante se desligou, "mas não configura pagamento de salário", arrematou. A reclamante apresentou recurso ordinário, mas a sentença foi mantida pela 4ª Turma do TRT/MG.
Fonte: TRT/MG