segunda-feira, 28 de junho de 2010

Construtora é condenada a pagar indenização por Danos Morais e Materiais por atraso na entrega de apartamento

Construtora MRV é condenada a pagar indenização por Danos Morais e Materiais por atraso na entrega de apartamento, em processo representado por Longo e Celer Advogados Associados. Segue abaixo íntegra da sentença. "Aos 16 dias do mês de setembro de 2009, às 16:00 horas, nesta cidade e Comarca de São Paulo, na sala de audiências do Juízo da 2ª Vara Cível do Foro Regional XI - Pinheiros, sob a presidência do Meritíssimo Juiz de Direito, Dr. XXXX, comigo Escrevente abaixo assinada, foi aberta a audiência de conciliação (art. 331 do CPC), nos autos da ação e entre as partes supra-referidas. Apregoadas as partes, compareceram os autores, acompanhados do Dr. Ivan Celer, OAB 223.418, e a representante da ré, Sra. XXX, que neste ato apresenta carta de preposição, acompanhada do Dr. XXXX, OAB XXXXX, que neste ato junta substabelecimento, tendo sido deferido o prazo de cinco dias para a juntada das custas respectivas. Iniciados os trabalhos, feita a proposta conciliatória, restou infrutífera. Ato contínuo, pelo MM. Juiz foi proferida a seguinte sentença: "Vistos. XXXX e XXXXX propuseram ação em face de MRV CONSTRUÇÕES LTDA, com base nas seguintes alegações: a cláusula tratando da convenção de arbitragem é nula; a ré, com quem os autores celebraram contrato de compra e venda de bem imóvel, descumpriu o prazo de entrega do bem imóvel; embora os autores tenham cumprido todas as suas obrigações, a entrega do bem imóvel, prometida para julho de 2007, ocorreu apenas no dia 20 de setembro de 2008; a ré sempre se justificou atribuindo culpa à Prefeitura de São Paulo, com quem os autores não mantiveram qualquer relação jurídica; os abusos cometidos pela ré foram tantos, que os autores, para receberem o bem imóvel, aceitaram, em julho de 2008, mediante aditivo contratual, antecipar o pagamento do saldo devedor, ainda que ausente o habite-se e ainda que, pelos termos do contrato, pudessem optar por financiamento bancário; os autores foram vítimas de publicidade enganosa; a ré descumpriu os princípios da boa-fé e da equidade; a ré administra e comercializa de forma temerária os seus empreendimentos; os atrasos da ré são conhecidos; os autores, em virtude da falta cometida pela ré, suportaram danos materiais e morais; os autores, à luz da falha da ré, casaram-se sem receber a posse do bem imóvel prometido; os autores, diante da infração contratual, foram obrigados a pagarem aluguéis mensais de R$ 649,64; a ré ignorou todos os apelos dos autores; enfim, os autores fazem jus a uma indenização por danos materiais e morais. Destarte, os autores pedem a declaração de nulidade da cláusula décima primeira, que cuida da convenção de arbitragem, e pedem a condenação da ré na obrigação de entregar o bem imóvel prometido à venda, bem como no pagamento de uma indenização por danos materiais, correspondentes aos aluguéis suportados entre julho de 2007 e 20 de setembro de 2008, num total de R$ 9.094,64, e de uma compensação financeira por danos morais, não inferior a R$ 30.000,00 (fls. 02/19). A petição inicial veio acompanhada de documentos (fls. 20/64). A petição inicial foi emendada (fls. 68/71). A ré apresentou contestação e ponderou: diante da convenção de arbitragem, este Juízo é absolutamente incompetente para processar e julgar a lide; com relação à entrega do bem imóvel, já consumada, a falta de interesse de agir é manifesta; as obras do empreendimento já foram concluídas; o habite-se já foi concedido; o Código de Defesa do Consumidor não se aplica no caso vertente; a inversão do ônus da prova é descabida; inexistiu propagando enganosa; não ofendeu os princípios da boa-fé e da equidade; o contrato é válido; as cláusulas pactuadas são lícitas; a desconsideração da personalidade jurídica é injustificável; as obras foram concluídas em janeiro de 2008, mas o atraso na entrega do imóvel decorreu de trâmites burocráticos e administrativos impostos pela administração pública do Município de São Paulo; exigências do corpo de bombeiros e do Departamento de Parques e Áreas Verdes da Prefeitura de São Paulo determinaram o atraso questionado pelos autores; apenas em agosto de 2008, conseguiu requerer, junto à Prefeitura de São Paulo, certidão de baixa e habite-se residencial; o contrato prevê cláusula penal; a cláusula penal abrange danos materiais e morais; a indenização suplementar é inadmissível, até porque não prevista no contrato; os autores poderiam ter evitado o pagamento dos aluguéis; meros dissabores não geram danos morais; os pressupostos da responsabilidade civil estão ausentes; em resumo, o pedido dos autores, se superadas as preliminares, é improcedente (fls. 126/172). A contestação veio acompanhada de documentos (fls. 173/205). Os autores se manifestaram sobre a contestação (fls. 207/216), com documentos (fls. 217/224). Diante do parcial acolhimento da impugnação ao valor da causa (fls. 21, dos autos em apenso, e 225, item 1, destes autos), os autores complementaram a taxa judiciária recolhida (fls. 232/233). A ré requereu o depoimento pessoal dos autores (fls. 228/230), enquanto os autores pediram o julgamento antecipado da lide (fls. 232). A tentativa de conciliação restou infrutífera. ESSE É O RELATÓRIO. DECIDO. O processo comporta imediato julgamento, pois é prescindível o alongamento da atividade probatória: os autos estão instruídos com as informações e os documentos indispensáveis ao bom desfecho da lide. Aliás, os depoimentos pessoais dos autores, única prova expressamente requerida, é, no caso, irrelevante e inútil para o satisfatório deslinde da causa. Ao contrário do afirmado pela ré, este Juízo é competente para processar e julgar a lide, pois a cláusula compromissória, fixada em contrato de adesão, marcado pela vulnerabilidade dos aderentes, é ineficaz perante os consumidores, já que estipulada no próprio contrato - não em documento anexo -, desacompanhada de assinatura ou de visto lançado especialmente para tal disposição (artigo 4.º, § 2.º, da Lei n.º 9.307/1996). Na realidade, é possível ir mais além, afirmando, inclusive, que tal cláusula é abusiva e, portanto, nula de pleno direito, nos termos do artigo 51, VII, do Código de Defesa do Consumidor. A propósito, oportuna a lição de Leonardo Roscoe Bessa, exposta no Manual de Direito do Consumidor, obra feita em co-autoria com Antônio Herman V. Benjamin e Claudia Lima Marques (São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 304-305): -Em que pese o cuidado da Lei 9.307/1996 com a vontade real do aderente, a doutrina sustenta majoritariamente que, em face da vulnerabilidade do consumidor, principalmente quando pessoa natural, a instituição da arbitragem em contratos de adesão é extremamente desvantajosa para o consumidor, e, portanto, nula de pleno direito. Outro argumento, de índole constitucional, se impõe contra a arbitragem nas relações de consumo. É dever do Estado promover a defesa do consumidor na forma da lei (artigo 5.º, XXXII). A principal norma de proteção ao consumidor, editada em atenção ao comando do art. 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é justamente a Lei 8.078/90. Cuida-se de norma de ordem pública e interesse social. ...Significa dizer que as normas do Código de Defesa do Consumidor, tanto processuais como materiais, não são disponíveis, não podem ser afastadas por conjugação de vontade. Aí está a incompatibilidade do CDC com o procedimento de arbitragem, que legalmente só pode ser instituído para -dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1.º). ... Ademais, o julgamento arbitral não precisa necessariamente se basear na lei – pode ser apenas de eqüidade, faculta-se às partes -escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem- (art. 2.º). Fica claro, portanto, que a instituição de arbitragem nas relações de consumo esvazia por completo o disposto no art. 5.º, XXXII, da Constituição Federal e encontra óbice na própria Lei 9.307/96, ao se estabelecer que apenas os litígios concernentes a direitos patrimoniais disponíveis podem ser submetidos à arbitragem-. Logo, a primeira preliminar argüida pela defesa não vinga (fls. 126/172, item III.1). Contudo, a segunda preliminar procede (fls. 126/172, item III.2): ora, de acordo com o relato contido na petição inicial, o bem imóvel prometido à venda, embora com atraso, já foi entregue. Por conseguinte, os autores, no que diz respeito ao pedido de condenação da ré na entrega do bem imóvel (fls. 02/19, item 5.g), não têm interesse de agir. Evidentemente, prescindem da intervenção judicial, até porque a obrigação já foi cumprida e a certidão de baixa e o habite-se obtidos. Sendo assim, o presente processo, inclusive com a expressa concordância dos autores, manifestaram na réplica (fls. 207/216, item II), prossegue apenas visando ao exame do pedido indenizatório. Agora, no tocante ao pedido indenizatório, o pedido dos autores é procedente. A celebração do contrato de compra e venda é fato incontroverso. Também não se discute que a ré assumiu o compromisso de entregar o bem imóvel prometido à venda até o mês de julho de 2007. É ainda inquestionável que a ré obteve a certidão de baixa e o habite-se residencial apenas em agosto de 2008. Ao lado disso, a ré sequer impugnou que procedeu à entrega do imóvel apenas no dia 20 de setembro de 2008, mais de um ano depois de escoado o prazo convencionado e muitos meses depois de encerrado o prazo contratual de respiro de cento e vinte dias. A ré, inegavelmente, frustrou as justas e legítimas expectativas dos autores. Não obrou com a diligência e a eficiência exigidas e esperadas, ainda mais de um profissional. Não se comportou com a exemplariedade imposta pelo princípio da boa-fé objetiva. Seguramente, causou transtornos para os autores. Aliás, ela nem mesmo questiona que os autores, em razão do atraso, foram obrigados a locar um bem imóvel residencial e suportaram, no período correspondente ao atraso, despesas com moradia correspondentes a R$ 9.094,64. E aqui nem se alegue, até porque absurdo, que os autores poderiam ter residido com seus pais ou outros parentes. A ré não pode querer valer-se de favores alheios para fugir de suas responsabilidades. A ré, para escapar de compromissos assumidos, não pode pretender que os autores se sujeitem a situações provisórias, a arranjos familiares e a desconfortos. Não pode pretender que os autores se submetam a uma situação de constrangimento. Situação de constrangimento, aliás, a que foram levados pela ineficiência e descompromisso da ré. De mais a mais, os autores nem precisavam comprovar os prejuízos materiais. Nem mesmo dependiam da demonstração de gastos com aluguéis, que, de todo modo, repita-se, tornaram-se incontroversos. Ora, para compor perdas e danos presumidos relacionados com a tardia entrega do bem imóvel prometido à venda, o contrato celebrado pelas partes prevê cláusula penal. Com efeito, estabelece a obrigação da ré de pagar importância correspondente a 1% do preço do imóvel por mês de atraso, até a data da efetiva entrega da coisa ou até a liberação da certidão de baixa e do habite-se. Quer dizer: prevê uma indenização mensal prefixada em R$ 1.151,98. Ocorre que os autores, por mera liberalidade e procedendo com a boa-fé desprezada pela ré, requereram indenização por danos materiais no valor de R$ 9.094,64, calculada com base no aluguel mensal de R$ 649,64. Ou seja, pediram menos do que podiam requerer. Sob outro prisma, a cláusula penal estabelecida não contempla danos morais. Não abrange danos de ordem extrapatrimonial. De fato, considerada a sua finalidade no caso concreto, objetivou apenas assegurar moradia aos autores por prazo correspondente ao do atraso na entrega do imóvel, em imóvel com condições semelhantes ao do adquirido. Tanto assim que, observando a praxe comercial no mercado locatício, a cláusula penal foi fixada em 1% do preço do bem imóvel adquirido. Por sua vez, os danos morais são manifestos. A conduta da ré comprometeu a vida cotidiana dos autores. Prejudicou o início da vida de casados. Abalou, por certo, a tranqüilidade e o sossego dos autores. Estes, induvidosamente, sentiram-se atingidos nos seus sentimentos próprios de respeitabilidade e auto-estima. A ré obrigou os autores a correrem atrás de moradia provisória. Desorganizou a vida dos autores. Ofendeu o padrão de confiança e a lealdade que devem presidir as relações jurídicas. Demonstrou descaso pelos autores, desrespeito para com eles. Nessa linha, para compensar os danos morais, arbitro indenização no valor correspondente ao dobro da indenização por danos materiais, ou seja, R$ 18.129,28. Tal valor, salvo melhor juízo, presta-se, a um só tempo, a dar certo conforto aos autores e a sancionar a conduta ilícita da ré. Por fim, observo: os trâmites burocráticos e administrativos tratados na contestação não afastam a obrigação e a responsabilidade da ré. As exigências impostas pelo corpo de bombeiros, pela Prefeitura Municipal e, especificamente, pelo Departamento de Parques e Áreas Verdes da Prefeitura de São Paulo são despidas de aptidão para romper o nexo causal. Ora, não se qualificam como caso fortuito ou força maior, até porque, se a obra tivesse andado em boa marcha e a ré tivesse agido de modo organizado, o atraso, mesmo com as exigências aludidas, era passível de ser evitado. Ademais, tais exigências eram previsíveis, são normais no ramo de atuação da ré. A propósito, abrangem riscos inerentes, próprios, das atividades desenvolvidas pela ré. Qualificam-se, na melhor das hipóteses para a ré, como fortuito interno, inidôneo para romper o nexo causal. Pelo todo exposto, a) julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com relação ao pedido de condenação da ré na entrega do bem imóvel, nos termos do artigo 267, VI, do CPC; b) no tocante aos pedidos indenizatórios, julgo procedente o pedido dos autores para condenar a ré a pagar-lhes R$ 9.094,64, a serem acrescidos de correção monetária, da distribuição da ação, e de juros de mora de 1% ao mês, da citação, e R$ 18.129,28, a título de compensação financeira por danos morais, a serem acrescidos de correção monetária, a partir da publicação desta sentença (Súmula 362 do STJ), e de juros de mora de 1% ao mês, contados da citação. Considerando que a falta de acolhimento de estimativa feita na petição inicial para fins de indenização por danos morais não desencadeia sucumbência e levando em conta a mínima sucumbência dos autores, condeno apenas a ré nas verbas de sucumbência. Por isso, condeno a ré no pagamento das custas, das despesas processuais e dos honorários dos advogados dos autores, ora fixados em 15% do valor atualizado da condenação, considerando a dimensão e a importância econômica da lide, seu julgamento antecipado, os atos praticados e o grau de zelo demonstrado. Publicada em audiência, registre-se. Saem intimados". NADA MAIS. Lido e achado conforme, vai devidamente assinado. Eu, (XXXX), Escrevente, o digitei."

Fonte: TJSP