sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Juros maiores que 12% ao ano

Número do processo: 1.0024.08.151064-6/001

EMENTA: AÇÃO REVISIONAL - JUROS REMUNERATÓRIOS - LEI N°. 4.595/64 - NÃO RECEPÇÃO PELA CONTITUIÇÃO - INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA - CÓDIGO CIVIL E CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL - LIMITAÇÃO DO ENCARGO AO PATAMAR DE 12% AO ANO - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - ONEROSIDADE EXCESSIVA - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - NEGATIVAÇÃO DO NOME DO DEVEDOR - POSSIBILIDADE. - A discussão acerca da auto-aplicabilidade do art. 192, §3º da CR/88 restou superada, em razão da revogação do dispositivo pela Emenda Constitucional 40/2003 e, principalmente, pela edição da Súmula Vinculante n°. 7, segundo a qual o mencionado dispositivo tinha sua aplicação condicionada à edição de Lei Complementar. - Segundo o art. 192, caput da CR/88 - que não foi revogado, frise-se - o sistema financeiro nacional é "estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir os interesses da sociedade, em todas as partes que o compõem [...]". No mesmo sentido, dispõe o art. 170 da Constituição que a ordem econômica "tem por fim assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social [...]". Por fim, o art. 173, §4° prevê que "a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise [...] ao aumento arbitrário dos lucros". - A livre estipulação de juros não foi recepcionada pelo conjunto de princípios e normas contidas na Constituição da República. Isso porque o custo do crédito tem impacto direto na produção e circulação de riquezas, devendo se submeter a normas que estejam alinhadas aos objetivos constitucionais perseguidos pelo Estado. - Na ausência de norma específica acerca da limitação dos juros, aplica-se o Código Civil vigente na data da celebração do contrato. - Interpretando-se, conjuntamente, Código Civil de 2002 e Código Tributário Nacional, chega-se à conclusão de que o limite de juros compensatórios permitido pelo direito brasileiro, hoje, para todas as pessoas, inclusive instituições financeiras, permanece no patamar de 12% ao ano. - Conquanto admitida em lei a capitalização mensal de nos contratos celebrados por instituição financeira, não se deve admiti-la nas relações de consumo, porquanto gera excessiva onerosidade ao consumidor. - A comissão de permanência tem natureza jurídica híbrida. Ao mesmo tempo em que remunera o credor pelo capital emprestado, é instrumento de atualização do valor de compra da moeda e também de coação do devedor para que efetue o cumprimento da obrigação o mais rápido possível, na medida em que incide diariamente, majorando a cada dia o valor do débito. - A simples discussão do débito não pode ensejar a exclusão do nome do devedor dos órgãos de proteção ao crédito, sob pena de se dar guarida ao devedor que, apesar de reconhecer o débito, ajuíza ação revisional com o exclusivo intuito de evitar a negativação do nome dele (direito legítimo do credor).

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.08.151064-6/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): BANCO CITICARD S/A - APELADO(A)(S): RAISSA LUCIO DE CARVALHO - RELATOR: EXMO. SR. DES. ELPÍDIO DONIZETTI

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL PARCIALMENTE.

Belo Horizonte, 07 de julho de 2010.

DES. ELPÍDIO DONIZETTI - Relator

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14/06/2010

18ª CÂMARA CÍVEL

ADIADO

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.08.151064-6/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): BANCO CITICARD S/A - APELADO(A)(S): RAISSA LUCIO DE CARVALHO - RELATOR: EXMO. SR. DES. ELPÍDIO DONIZETTI

O SR. DES. ELPÍDIO DONIZETTI:

VOTO

Trata-se de apelação interposta à sentença que, nos autos da ação revisional de contrato ajuizada por Raissa Lucio de Carvalho em face de Banco Citicard S/A, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial.

Na sentença (f. 283-294), o juiz de primeiro grau entendeu possível o julgamento antecipado da lide, porquanto presentes elementos que permitem auferir o patamar dos encargos questionados pela autora. Salientou também a aplicabilidade do CDC ao caso vertente e a possibilidade de revisar cláusulas abusivas.

Quanto ao mérito, asseverou que os juros de 9,40% ao mês mostram-se excessivos, devendo ser reduzidos para 1% ao mês. Entendeu abusiva a cobrança de comissão de permanência cumulada com demais encargos de mora, limitando tal encargo à taxa média de juros remuneratórios praticada pelo mercado. Repudiou a prática do anatocismo e limitou a multa contratual ao patamar de 2%. Indeferiu o pedido de repetição do indébito e de condenação por danos morais. Ressaltou, contudo, a impossibilidade de incluir o nome da requerente no rol de inadimplentes.

Inconformado, o banco-réu interpôs recurso de apelação (f. 298-329), alegando, em síntese, que:

a) deve-se observar o teor da súmula vinculante nº 7, que trata da auto-aplicabilidade do art. 192, §3º da CR/88;

b) a autora tinha pleno conhecimento do teor das cláusulas contratuais ao receber seu cartão de crédito;

c) permite-se o anatocismo nos termos da MP 2.170;

d) não houve a cobrança de comissão de permanência cumulada com demais encargos;

e) deve-se permitir a inclusão do nome da autora nos cadastros de inadimplentes.

Nesses termos, pugna pela reforma da sentença.

A seu turno, a autora apresentou contra-razões (f. 337-364), nas quais infirma as teses contrárias e pugna pela manutenção da sentença.

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço da apelação.

Inicialmente, cabe salientar que não foi impugnada a aplicabilidade do CDC ao caso vertente, tão-pouco a possibilidade de o judiciário revisar cláusulas contratuais.

1 - DOS JUROS REMUNERATÓRIOS

Na sentença, o juiz de primeiro grau reputou abusiva a estipulação de juros de 9,40% ao mês, reduzindo-os ao patamar de 1% ao ano.

Inconformado, o apelante (banco réu) pugna pela aplicação da súmula vinculante nº 7 ao caso vertente. Salienta que não há que se falar em limitação dos juros remuneratórios, razão pela qual pugna pela reforma da sentença nesse ponto.

Inicialmente, vale observar que é inconteste nos autos a cobrança de juros superiores a 12% ao ano. Resta analisar, então, a legalidade dessa cobrança.

Pois bem. Para solucionar a questão atinente ao patamar de juros, necessário se faz, primeiramente, traçar um breve histórico da taxa de juros no ordenamento jurídico brasileiro.

Os juros compensatórios, também chamados remuneratórios, referem-se "aos interesses devidos como compensação pela utilização do capital alheio" (NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil anotado e legislação extravagante. 2. ed. revista e ampliada. São Paulo: RT, 2003. Nota 3 ao art. 406, p. 326). Sendo assim, aquele que celebra contrato de mútuo pode pactuar tais juros a fim de obter compensação pela indisponibilidade temporária do capital emprestado. Assevere-se bem que o fundamento dos juros remuneratórios é a compensação nos termos acordados entre as partes, o que não quer dizer autonomia da vontade plena, conforme se tratará abaixo.

Feita essa conceituação, deve-se passar ao histórico dos juros no ordenamento pátrio.

Em 1933, foi editado o Decreto 22.626 - Lei de Usura -, que vedava a estipulação, em quaisquer contratos, de taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (art. 1º). Tal dispositivo remonta ao art. 1.062 do revogado Código Civil de 1916, que trata da mencionada taxa legal, a saber: 6% ao ano. Sendo assim, por simples operação aritmética percebe-se a vedação, nos termos do mencionado decreto, da fixação de juros em patamar superior ao de 12% ao ano.

Ocorre que, em 31/12/1964, foi publicada a Lei 4.595, que dispôs sobre o sistema financeiro nacional, conforme se depreende de sua ementa - "dispõe sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias, Cria o Conselho Monetário Nacional e dá outras providências". Nos termos do art. 4o, inciso IX, da Lei 4.595/64, ficou estabelecido que:

"Art. 4º. Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República:

(...)

IX - Limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, descontos comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central da República do Brasil, assegurando taxas favorecidas aos financiamentos que se destinem a promover:

(...)"

Pela leitura do referido dispositivo, verifica-se que às instituições financeiras seriam aplicáveis as limitações de taxas de juros impostas pelo Conselho Monetário Nacional, o que se poderia até justificar ao argumento de que a dinamicidade do sistema financeiro exigiria um conjunto normativo específico a fim de acompanhar as bruscas alterações do mercado financeiro. Some-se a isso o fato de que a Lei 4.595/64 foi editada no início do regime militar, e, em tal contexto histórico, pensar-se em respeito aos chamados direitos fundamentais de primeira geração - direitos civis e políticos - deixava de ser uma das preocupações do governo, o que não se dirá, pois, do respeito aos direitos dos consumidores, mormente em face das gigantescas e poderosas instituições financeiras, todas, saliente-se, atreladas ao proscrito regime.

Em razão do advento da Lei 4.595/64, passou-se a entender que o limite de juros previstos na Lei de Usura não seria mais aplicável às instituições financeiras, em observância ao princípio da especialidade, segundo o qual, lei específica afasta a incidência da norma geral.

Na esteira de tal entendimento, foi editada, em 15 de dezembro de 1976, a Súmula 596, pelo Supremo Tribunal Federal, com a seguinte redação: "as disposições do Decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privados que integram o sistema financeiro nacional".

Com o advento da Constituição Federal de 1988, muitos entenderam que a Lei 4.595/64 não foi recepcionada pela nova ordem constitucional, notadamente em razão do disposto no art. 192, §3º, que assim dispunha:

"Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre":

§ 3o As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar."

No entanto, passou-se a discutir se o mencionado art. 192 seria ou não autoaplicável, ou seja, se a Constituição Federal, por si só, teria ou não o condão de revogar a Lei 4.595/64. Como de conhecimento geral, sempre adotei o entendimento, minoritário é verdade, de que a norma constitucional era auto-aplicável.

No entanto, a discussão sobre a eficácia do art. 192, §3ªº restou superada em razão da revogação do dispositivo pela Emenda Constitucional 40/2003 e, principalmente, pela edição da Súmula Vinculante n°. 7, segundo a qual, o art. 192, §3º da CR/88 tinha sua aplicação condicionada à edição de Lei Complementar, lei esta que nunca existiu.

Entretanto, não obstante as recentes mudanças na disciplina jurídica do tema, a limitação de juros deve ser observada. Isso porque, de fato, o art. 4º, IX da Lei n°. 4.595/64 não foi recepcionado pela Constituição da República, o que decorre não apenas do art.192, §3º, mas principalmente em decorrência do novo paradigma constitucional inaugurado pela Carta de 1988. Senão vejamos.

A despeito das inúmeras vozes que proclamam a livre estipulação de juros pelas instituições bancárias - decorrente da ausência de limitação pela autoridade competente (art. 4º, IX da Lei n°. 4.595/64) -, diversos dispositivos constitucionais apontam em sentido contrário.

Vivemos em um Estado que tem como fundamentos, entre outros, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º da CF) e, como fins, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e a promoção do desenvolvimento nacional e do bem comum (art. 3º da CF). Tais preceitos aplicam-se também à ordem econômica, por força do disposto no art. 170 da CF. Aliás, um dos objetivos da ordem econômica é justamente assegurar aos indivíduos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

Acrescente-se também que, segundo o art. 192, caput da CR/88 - que não foi revogado, destaque-se - o sistema financeiro nacional é "estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir os interesses da sociedade, em todas as partes que o compõem [...]". No mesmo sentido, prevê o art. 173, §4° que "a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise [...] ao aumento arbitrário dos lucros".

Cumpre observar que, na moderna ordem constitucional, reconhece-se a incidência dos direitos e garantias fundamentais também às relações privadas (entre os particulares), culminando na chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais1.

No entanto, a livre estipulação dos juros nos contratos bancários (de natureza privada ou pública) acaba por contrariar toda a principiologia adotada no texto constitucional de 1988. Isso porque a concessão de crédito pelas instituições bancárias, e os custos respectivos, possui impacto direto na produção e circulação de riquezas, devendo, por conseguinte, se submeter a normas que estejam alinhadas aos objetivos constitucionais que devem ser perseguidos pelo Estado, os quais podem ser sintetizados em uma única premissa: assegurar a todos uma existência digna.

Nesse ponto, cabe lembrar que o spread bancário - diferença líquida entre a taxa cobrada pelos bancos ao disponibilizar capital e os juros pagos ao captar recursos no mercado - no Brasil é o maior do mundo, conforme apurado pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial2. Resta evidente o desequilíbrio econômico oriundo da ausência de regulamentação, ainda mais se considerarmos a estabilidade econômica do País na última década.

Ademais, segundo o art. 5°. da Lei de Introdução ao Código Civil, o juiz, na aplicação da lei, atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Ora, a cobrança de juros elevados, sem qualquer limitação, aumenta o custo do crédito, o que inibe o consumo e a produção, conseqüências manifestamente contrárias aos objetivos eleitos pelo constituinte.

Diante do exposto, não há como considerar compatível com a ordem constitucional vigente a livre estipulação dos juros, razão pela qual o art. 4º, IX da Lei 4.595/64 não foi recepcionado pela Constituição da República. Assim, torna-se irrelevante a questão da aplicabilidade do art. 192, §3º da CR/88, e, via de conseqüência, a aplicação da Súmula Vinculante n°. 7.

Na ausência de norma específica acerca do patamar de juros que poderão ser aplicados nos contratos bancários após a revogação do §3° do art. 192, é de se aplicar as disposições do Código Civil, norma geral aplicável as relações privadas.

Nos termos do art. 591 do CC/02 (aplicável ao caso, uma vez que o contrato fora celebrado em 2006), os juros compensatórios pactuados nos contratos de mútuo não podem exceder a taxa a que se refere o art. 406 do referido diploma legislativo.

O artigo 406, por sua vez, estabelece que os juros moratórios legais devem ser fixados conforme a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.

Entende-se que a referida taxa é a mencionada no art. 161, § 1o, do CTN, a saber: 12% ao ano, conforme Enunciado nº 20 da Jornada de Direito Civil realizada pelo Superior Tribunal de Justiça sob a coordenação científica do Min. Ruy Rosado de Aguiar Júnior.

Interpretando-se, conjuntamente, Código Civil de 2002 e Código Tributário Nacional, chega-se à conclusão de que o limite de juros compensatórios permitido pelo direito brasileiro, hoje, para todas as pessoas, inclusive instituições financeiras, permanece no patamar de 12% ao ano.

Frise-se que a limitação de juros igualitária, tal qual prevista na legislação brasileira, não afronta de forma alguma a dinamicidade exigida no sistema financeiro nacional, muito pelo contrário, trata-se de juros que, em uma economia estável, podem ser considerados bastante razoáveis.

Ademais, essa limitação única, englobando tanto as instituições financeiras quanto os demais mutuantes, nada mais é do que o reconhecimento dos princípios da isonomia e da razoabilidade. Afigurar-se-ia incoerente privilegiar os bancos, que possuem muito mais capital para disponibilizar aos mutuários, em detrimento daqueles que não detêm tal poderio econômico.

Não se pretende dizer que o direito contratual perdeu sua feição privada, ou que se publicizou, mas sim que, à luz do direito moderno e privilegiando-se a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, a autonomia da vontade continua válida, desde que esteja dentro de certas limitações cogentes, sob pena, até mesmo, de se desvirtuar o fundamento contratual, impedindo a circulação de riquezas e propiciando a concentração destas.

Com tais razões, deve-se manter a sentença nesse ponto.

2 - DO ANATOCISMO

O banco apelante sustenta que as instituições financeiras estão autorizadas a cobrar juros capitalizados.

Como se sabe, a capitalização de juros significa juros compostos, em contraposição aos chamados juros simples. A diferença entre essas duas formas de calcular a incidência de juros é que, nos juros compostos, há a incorporação dos juros ao capital ao final de cada período de contagem, ao passo que, nos juros simples não ocorre tal incorporação. É a lição de Bruno Mattos e Silva:

"O que são juros simples? Juros simples são aqueles que incidem apenas sobre o principal corrigido monetariamente, isto é, não incidem sobre os juros que se acrescentem ao saldo devedor. Vale dizer, assim, que os juros não pagos não constituem a base de cálculo para a incidência posterior de novos juros simples. E o que são juros compostos? Juros compostos são aqueles que incidirão não apenas sobre o principal corrigido, mas também sobre os juros que já incidiram sobre o débito. Como se pode perceber, capitalização dos juros pode, matematicamente, ocorrer mês a mês, semestralmente, ano a ano, etc" (MATTOS E SILVA, Bruno. Anatocismo legalizado: a medida provisória beneficia as já poderosas instituições financeiras. In: www.direitobancario.com.br, 1/7/2001)."

Feita essa breve conceituação, é necessário realizar um pequeno retrospecto histórico para melhor compreender o atual tratamento dado à matéria.

O Código Civil de 1.916 foi um dos primeiros diplomas legais a tratar da matéria, permitindo livremente a pactuação de juros capitalizados (art. 1.262).

Todavia, o mencionado artigo do CC/16 foi revogado pela Lei de Usura (Decreto nº 22.626/33), que dispõe em seu artigo 4º que "é proibido contar juros dos juros; esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano". Assim, o Decreto nº 22.626/33 adotou posição mais restritiva em relação ao CC/16, permitindo, apenas como exceção, a capitalização anual de juros.

Seguindo essa linha restritiva, o STF editou, em 1.963, a Súmula nº 121, com a seguinte redação: "É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada".

Em 1.964 foi promulgada a conhecida Lei 4.595/64, que, entre outras várias disposições, determinou que às instituições financeiras seriam aplicáveis as limitações de taxas de juros impostas pelo Conselho Monetário Nacional. Ocorre que, ainda que se entenda que a Lei 4.595/64 tenha derrogado a Lei da Usura no tocante ao limite da taxa de juros para instituições financeiras, o mesmo entendimento não prevalece com relação à capitalização de juros, uma vez que o art. 4º, IX, da referida lei faz menção apenas à limitação de taxa de juros, e não à forma de cálculo de juros. Assim, não houve revogação, pela Lei 4.595/64, da norma geral constante do Decreto nº 22.626/33.

Em 31/3/2000, porém, foi editada a Medida Provisória nº 1.963-17, que dispunha, em seu art. 5º, caput, que, "nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano".

Tal medida provisória foi reeditada diversas vezes, mantendo-se, em todas as reedições, a redação integral do caput do art. 5º. Com a publicação da Emenda Constitucional nº 32/2001, acabou-se dando força de lei a tal disposição, que se encontrava em vigor, em razão da Medida Provisória nº 2.170-36, de 24/8/2001.

Ante a inexistência de outra medida provisória ou lei revogando explicitamente a Medida Provisória nº 2.170-36, assim como de deliberação do Congresso Nacional a esse respeito, há de se reconhecer que subsiste no ordenamento jurídico brasileiro, desde 31/3/2000, permissão para que as instituições financeiras pactuem juros capitalizados com periodicidade inferior a um ano.

Saliente-se que o novo Código Civil não revogou o tratamento dado à matéria pelo Decreto nº 22.626/33 nem pela Medida Provisória nº 2.170-36, visto que apenas estabelece que, em se tratando de contrato de mútuo, é permitida a capitalização anual de juros (art. 591, in fine).

Assim, conclui-se que a capitalização de juros é, em princípio, vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro (regra geral constante do Decreto nº 22.626/33). Permite-se, porém, que se pratiquem juros capitalizados em algumas situações específicas, como ocorre nas cédulas de crédito bancário (Lei 10.931/04), nos contratos celebrados por instituições financeiras e no caso da capitalização anual prevista expressamente no novo Código Civil (art. 591, in fine).

No caso sob julgamento, verifica-se que, por se tratar de contrato celebrado por administradora de cartão de crédito - pessoa jurídica equiparada às instituições financeiras -, dever-se-ia, em princípio, admitir a capitalização de juros em períodos inferiores a um ano.

Todavia, por estarmos diante de relação de consumo, não se pode admitir tal prática, haja vista que o consumidor, em razão da sua manifesta vulnerabilidade, não tem condições de se manifestar em sentido contrário à imposição, por meio de contrato de adesão, de uma prestação que, ao fim, tornar-se-á extremamente onerosa.

Saliente-se, ainda, que a capitalização mensal de juros implica evolução exponencial da dívida, onerando de forma excessiva o consumidor. Desse modo, ainda que, em regra, não exista restrição legal para a pactuação de juros capitalizados nas cédulas comerciais, deve-se considerar que, nos termos do art. 51, § 1º, III, do CDC, a capitalização de juros em períodos inferiores a um ano é cláusula nula de pleno direito nos contratos de consumo.

Dessa forma, deve-se manter a sentença também nesse ponto.

3 - DA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA

Em diversas oportunidades repudiei fortemente também o embuste conhecido como comissão de permanência.

Na sentença o juiz de primeiro grau permitiu a incidência de comissão de permanência limitada à taxa de mercado, seja ela qual for.

Ocorre que apenas a instituição financeira recorreu da decisão, o que impossibilita a aplicação do meu entendimento ao caso concreto, uma vez que configuraria reformatio in pejus. Dessa forma, deve-se manter a sentença que limitou o referido encargo À taxa média de mercado.

4 - DA POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DO CONSUMIDOR INADIMPLENTE NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO

O simples ajuizamento de ação revisional, por si só, não elide a exigibilidade da dívida e, por conseqüência, a mora do devedor. Para tanto, deveria a apelada ter providenciado o depósito judicial do montante incontroverso, o que não ocorreu no caso dos autos.

Nesse sentido:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. AJUIZAMENTO ANTERIOR DE AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. MORA QUESTIONADA. AUSÊNCIA DE DEPÓSITO DO MONTANTE INCONTROVERSO. CONEXÃO. AFASTADA. LIMINAR MANTIDA. o ajuizamento de ação revisional de contrato, ainda que anterior à busca e apreensão não obsta a manutenção do deferimento da liminar nesta, quando o autor daquela sequer demonstrou ter depositado em juízo o valor que entende incontroverso, de forma a demonstrar sua boa-fé contratual, ou mesmo o principal do débito. conquanto a conexão possa ser suscitada de ofício pelo julgador, antes da formação do contraditório na ação de busca e apreensão não é possível aferir sua identidade com a ação revisional, porque é insuficiente a causa remota consubstanciada no contrato de financiamento, havendo de ser analisada a similitude de defesa. (tj-mg- agravo n° 1.0024.06.191063-4/001, relator: afrânio vilela, julgamento: 13/12/2006, grifos lançados)

REVISÃO DE CONTRATO. DEPÓSITO DE VALOR QUE ENTENDE DEVIDO. POSSIBILIDADE. INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR EM ORGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. PROIBIÇÃO. Estando sub judice a legalidade do débito, realizado o depósito do valor incontroverso ou efetivada a prestação de caução idônea nos autos, considera-se elidida a mora, ficando a instituição financeira impedida de incluir ou de manter o nome do autor em órgãos de proteção ao crédito, enquanto pender a demanda. V.v.: Para a concessão da tutela antecipada é necessário além do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, prova inequívoca capaz de impingir no magistrado o juízo de verossimilhança da alegação do autor, ausente tal requisito deve o MM. juiz indeferir a medida pleiteada. (TJ-MG- AGRAVO N° 1.0707.06.123806-9/001, Relator: Duarte de Paula, julgamento: 14/02/2007, grifos lançados)

Assim, não há empecilho à negativação do nome da apelada, caso se verifique que, não obstante a revisão das cláusulas contratuais, se encontre inadimplente.

Desse modo, deve-se reformar a sentença nesse ponto, para permitir que o banco apelante inclua o nome da apelada nos cadastros de inadimplentes.

5 - CONCLUSÃO

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação, apenas para possibilitar ao apelante a inclusão do nome da apelada nos cadastros de inadimplentes.

Face à reforma mínima da sentença, custas recursais ao apelante.

O SR. DES. FABIO MAIA VIANI:

VOTO

De acordo com o Des. Relator.

O SR. DES. ARNALDO MACIEL:

VOTO

Peço vista.

SÚMULA : O DES. RELATOR E O DES. REVISOR DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, O DES. VOGAL PEDIU VISTA.

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NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. PRESIDENTE:

O julgamento deste feito foi adiado na sessão anterior, a pedido do Des. Vogal, quando, então, os Desembargadores Relator e Revisor davam provimento parcial ao recurso.

O SR. DES. ARNALDO MACIEL:

VOTO

Peço vênia ao eminente Relator, Desembargador Elpídio Donizetti, para divergir do seu judicioso voto, tão somente no que tange à limitação dos juros remuneratórios, pois a despeito de haver grande controvérsia acerca do assunto, entendo que não há previsão legal atual capaz de impor tal limitação, mas sendo oportuno, a priori, tecer algumas considerações.

Os juros remuneratórios são aqueles que remuneram diretamente o capital emprestado, compensando o credor pela privação do seu uso e pelo risco de não recebê-lo de volta, sendo geralmente pactuado nos contratos de mútuo financeiro, com o objetivo de restituir o mutuante pela indisponibilidade temporária do capital cedido.

Em que pesem os entendimentos voltados para a possibilidade de limitação dos juros remuneratórios ao percentual de 12% ao ano, com fundamento no art. 192, inciso VIII e §3º da CF/88 e no Decreto 22.626/33, fato é que nenhum desses dispositivos aplicam-se atualmente.

Isso porque, além de o inciso VIII e o §3º, do artigo 192 da CF/88, terem sido revogados pela Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003, o caput do supramencionado artigo tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar que o regulamentasse, mas o que de fato não ocorreu.

É o que dispõe a Súmula 648 do STF:

"A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela EC 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar".

É verdade que o Decreto 22.626/33, conhecido como a Lei de Usura, em seu art. 1º, dispõe sobre a vedação da estipulação de juros contratuais superiores ao dobro da taxa legal, o que, em princípio, fundamentaria a tese da limitação em análise.

No entanto, no ano de 1964, foi editada a Lei 4.595, que passou a disciplinar de forma especial o Sistema Financeiro Nacional e suas instituições, e afastou a aplicabilidade do Decreto supracitado no tocante à limitação dos juros, ao atribuir expressamente ao Conselho Monetário Nacional poderes normativos para limitar referidas taxas em operações e serviços bancários ou financeiros.

Oportuno ainda salientar que a limitação tratada pela mencionada lei restringiu-se aos contratos de crédito rural e similares, como se depreende do inciso IX, de seu art. 4º, ficando as taxas de juros cobradas pelas instituições bancárias ou financeiras, em seus demais negócios jurídicos, subordinadas ao contrato celebrado entre as partes e às regras de mercado.

Tal conclusão encontra-se inclusive sumulada pelo STF:

"Súmula 596. As disposições do Decreto 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional."

Oportuno ainda citar jurisprudência do STJ sobre o tema:

"AGRAVO REGIMENTAL - JUROS BANCÁRIOS - LIMITAÇÃO - INEXISTÊNCIA - LEI DE USURA - CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS - PREQUESTIONAMENTO - AUSÊNCIA - ARTS. 5º, LIV E LV, E 192, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - IMPERTINÊNCIA - IMPROVIMENTO. I. A questão da taxa de juros já se encontra pacificada nesta Corte, sendo certo que, no mútuo bancário comum não se aplica a limitação dos juros em 12% ao ano, prevista no Decreto 22.626/33. II. O tema relativo à capitalização dos juros não foi prequestionado, mesmo com a oposição de embargos de declaração. Incidência da Súmula 211/STJ. III. No que diz respeito à violação do artigo 5º, incisos LIV e LV, e 192, § 3º, da Constituição Federal, foge do campo do recurso especial. Agravo improvido". (STJ, 3ª T., AgRg no REsp 598884 / MG, Agravo Regimental no Recurso Especial 2004/0050544-0, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 05/08/2008, p. 22/08/2008).

No mesmo sentido é o entendimento deste Tribunal:

"Bancárias - Capitalização de juros - Expressa previsão legal - Possibilidade - Súmula 121 do STF - Jurisprudência do STJ - Comissão de permanência - Cumulação com multa e juros - Ilegalidade - Preliminares rejeitadas, primeiro recurso não provido e segundo parcialmente provido. Não é nula a execução por iliqüidez do título se o acertamento do quantum debeatur do título executivo depende de simples cálculo aritmético. O vencimento da obrigação líquida e certa, no seu termo, autoriza a propositura da ação de execução independentemente de prévia notificação. A limitação de juros não pode ser imposta às instituições bancárias, vez que o artigo 192, § 3º, da CF, foi revogado pela EC n.º 40 e as disposições do Decreto 22.626/33 não são aplicáveis às operações financeiras, devendo prevalecer o índice pactuado entre as partes. Não são abusivos os juros remuneratórios de 2,95% ao mês.Havendo previsão contratual, admite-se a capitalização de juros em contratos bancários.É admitida a incidência da comissão de permanência após o vencimento da dívida, desde que não cumulada com juros e multa moratória" (TJMG, 12ª C. CÍV., AC Nº 1.0024.03.998449-7/001(1), REL. DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA, J. 01/08/2007, P. 18/08/2007).

(GRIFADO)

Ademais, de suma importância registrar que sequer seria cabível a aplicação, à hipótese, do art. 591 c/c o art. 406, ambos do CC/2002.

Isso porque o STF já solidificou o entendimento de que a Lei 4.595/64 foi recepcionada como lei complementar, considerando-se que a Constituição Federal determina que o sistema financeiro nacional deve ser unicamente regulamentado por norma dessa natureza, não sendo admissível que o simples formalismo do processo legislativo, cujo rito é diferente para a edição de lei ordinária, seja capaz de desqualificar o seu caráter de norma complementar, conforme decisões já proferidas pelo Plenário daquele Tribunal.

Do acima exposto, pode-se concluir que a Lei 4.595/64, que deixa livre a estipulação de juros, aplica-se aos contratos de mútuo bancário, aos quais não há que se falar na incidência da limitação prevista no art. 591 do CC/2002, porquanto tal dispositivo limita-se a tratar dos contratos de mútuo civil, inclusive conforme o entendimento mais recente do STJ, que abaixo se transcreve:

COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE E DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS N. 282 E 356/STF. JUROS. LIMITAÇÃO (12% AA). LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/1933). NÃO INCIDÊNCIA. APLICAÇÃO DA LEI N. 4.595/1964. DISCIPLINAMENTO LEGISLATIVO POSTERIOR. SÚMULA N. 596-STF. INEXISTÊNCIA DE ONEROSIDADE EXCESSIVA. CONTRATO BANCÁRIO FIRMADO POSTERIORMENTE À VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO CIVIL. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO. CC, ARTS. 591 E 406. I. Carente de prequestionamento tema objeto do inconformismo, a admissibilidade do recurso especial, no particular, encontra óbice nas Súmulas n. 282 e 356 do STF. II. Inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do novo Código Civil. III. Outrossim, não incide, igualmente, a limitação de juros remuneratórios em 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos de abertura de crédito. IV. Admite-se a repetição do indébito de valores pagos em virtude de cláusulas ilegais, em razão do princípio que veda o enriquecimento injustificado do credor. V. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, parcialmente provido. (REsp 680.237/RS, Rel. Ministro Aladir Passarinho Júnior, Segunda Seção, julgado em 14.12.2005, DJ 15.03.2006, p. 211)

Não bastasse, imperioso ressaltar que em outubro de 2008 o STJ, ao julgar o Recurso Especial de nº 1.061.530/RS (publicado no DJe de 10/03/2009), elegeu-o, nos termos da sistemática prevista no art. 543-C do CPC, como recurso representativo da controvérsia envolvendo a limitação dos juros remuneratórios e firmou orientação no sentido de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (conforme Súmula 596 do STF); de que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano não indica, por si só, abusividade; de que não se aplicam as disposições do art. 591 c/c 406 do CC/2002 aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário; bem como de que é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade fique cabalmente demonstrada.

Diante de tais considerações, resta clara a impossibilidade de limitação dos juros remuneratórios, em contratos de mútuo bancário, à taxa de 12% ao ano, medida que poderia até mesmo inviabilizar a própria movimentação do mercado econômico/financeiro, em função da inevitável insegurança que teriam as instituições financeiras em celebrar contratos de empréstimo com particulares, frente à possibilidade de ver as cláusulas consensualmente pactuadas serem modificadas de modo a sempre beneficiar o mutuário, solução que iria totalmente de encontro ao princípio do pacta sunt servanda.

Nada obstante, considerando-se inclusive o grande poder atribuído às instituições financeiras na estipulação de taxas e demais encargos, imperioso que seja considerado o equilíbrio contratual, de modo a afastar a possibilidade de cobranças abusivas e, via de consequência, lesivas ao consumidor, situação em que, inegavelmente, deverão incidir as regras consumeiristas, nos moldes da Súmula 297 do STJ.

Se por um lado devem ser respeitadas as cláusulas consensualmente pactuadas, certo é que, por outro, deve-se reconhecer a necessidade de proteção do mutuário, parte hipossuficiente da relação, nas hipóteses de cobranças claramente abusivas, mas abusividade esta que deverá ser comprovada pelo interessado, conforme entendimento já consolidado pelo STF:

Súmula 382. A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

Da análise dos documentos acostados aos autos, depreende-se que os juros cobrados foram fixados em 9,40% ao mês, taxa esta praticada segundo a média de mercado nas operações desta espécie, não havendo que se falar em abusividade dos juros remuneratórios pactuados entre as partes.

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, divergindo tão somente no que pertine à limitação dos juros remuneratórios, os quais deverão ser mantidos no percentual contratado.

Como houve sucumbência recíproca, mas em maior proporção pela apelada, condeno as partes no pagamento das custas e despesas processuais de ambas as instâncias, bem como nos honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, tocando 70% (setenta por cento) de todas estas despesas para a apelada e 30%, (trinta por cento) para o apelante, ficando a respectiva cobrança suspensa em relação a primeira por litigar sob o pálio da assistência judiciária.

SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL PARCIALMENTE.


Fonte: TJMG