quarta-feira, 2 de abril de 2014

Atraso injustificado na entrega do imóvel

EMENTA: COMPRA E VENDA DE UNIDADE HABITACIONAL - ENTREGA - ATRASO PELA CONSTRUTORA - EFEITOS.

Em sede de compra e venda de imóvel, o atraso na entrega da unidade alienada autoriza a recomposição de danos materiais consistentes no requerido pagamento de aluguel ao comprador pelo correspondente período, bem como a fixação de multa penal. Recurso não provido.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.10.188131-6/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): MRV SERVIÇOS ENGENHARIA LTDA - APELADO(A)(S): MARCONI BITENCOURT SILVA

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. SALDANHA DA FONSECA 

RELATOR.

DES. SALDANHA DA FONSECA (RELATOR)

V O T O

Cuidam os autos de ação ordinária ajuizada por Marconi Bitencourt Silva em face de MRV Serviços de Engenharia Ltda., ao argumento de que a ré, infringindo disposição contratualmente estabelecida, não logrou entregar a unidade alienada no prazo a que se obrigou, disto resultando inadimplência apta a ensejar o pagamento de indenização pelos prejuízos causados.

A teor da sentença de f. 185-187, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes para condenar a Ré no pagamento de multa pena de 1% sobre o montante pago pelo imóvel, durante o período de inadimplência na entrega da unidade alienada, e, ainda, a ressarcir ao autor a quantia referente às despesas de aluguel constantes às f. 39/42, ambos os valores acrescidos de juros moratórios de 1% ano mês e correção monetária calculados individualmente a partir de cada mês devido. 

Insatisfeita, recorre a demandada. Valendo-se da apelação de f. 204-214, defende em resumo que as obras atrasaram por fato imprevisível, não lhe podendo ser imputadas as obrigações impostas na origem. Sustenta, ato contínuo, que "não existe previsão para que o Poder Judiciário exerça uma atividade positiva, no sentido de criar cláusula favorável ao consumidor com o intuito de igualar as partes", impondo-se reconhecer a impossibilidade da cobrança cumulativa de indenização por danos materiais e multa por inadimplência decorrente de um mesmo fato, sob pena de se caracterizar bis in idem. 

Em contrarrazões de f. 217-226, o apelado, refutando a insurgência recursal, pugna pelo seu desprovimento.

Preparo e remessa regulares, f. 215.

Cumpridos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

A questão litigiosa gravita em torno do contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel estabelecido entre as partes, nos termos do instrumento de f. 28-38.

É que, em síntese, diz o autor estar eivada de nulidade, posto que abusiva, a cláusula quinta, do instrumento epigrafado que prevê prazo de carência de 180 (cento e oitenta) dias para a conclusão das obras referentes à unidade imobiliária, objeto do presente, entrega das unidades do empreendimento, bem como da unidade objeto do presente, depois de ultrapassada a data prevista no ITEM 5 da folha de rosto, impondo-se, diante do atraso havido na conclusão da obra, recomposição de danos materiais e morais ditos existentes.

Após compulsar o conjunto probatório verifico que a ré deixou mesmo transcorrer em branco o prazo a que estava sujeita para entrega da unidade alienada, fazendo-o ao arrepio de qualquer permissivo legal ou contratual.

Não se pode olvidar que o enlace contratual, porque estabelece um vínculo jurídico entre as partes, tem condão de criar obrigações, sujeitando os contratantes ao que lograram pactuar, respeitadas, por óbvio, boa-fé objetiva e função social do contrato.

O contrato firmado pelos litigantes, além de identificar o objeto alienado, fixava em junho de 2009 o prazo para sua entrega, sujeitando-se esse marco temporal à prorrogação máxima de 180 dias. A única exceção contratualmente estabelecida acerca desse termo contratual tem sede na cláusula quinta e, porque se refere apenas a "caso fortuito" ou de "força maior", não caracterizados na hipótese.

É que o atraso no registro do imóvel, bem como na individualização das matrículas, em razão de hipoteca constituída sobre o terreno, além de não encontrar lastro material no conjunto probatório, revela-se como condição absolutamente previsível para a execução do empreendimento.

Nesse contexto fático, a ré, ao preterir o prazo contratual para entrega do bem, incorreu em flagrante descumprimento contratual apto a ensejar a pretensão de ressarcimento pelo contratante prejudicado. Em verdade, a conduta da construtora assemelha-se a verdadeira propaganda enganosa, eis que permitiu a autora conceber como verdadeira a informação de que o imóvel estaria pronto em Junho de 2009, para depois alterar unilateralmente tal data.

Com efeito, o atraso na entrega do imóvel sem a apresentação de prévia justificativa técnica legítima enseja danos para o comprador, pois planejou sua vida com base no prazo contratado.

No que respeita à cláusula penal, e ainda que a apelante afirme o contrário, o contrato litigioso prevê pacto desta natureza já que impõe ao comprador penalidades em caso de descumprimento de distintas obrigações, (cláusula 4.2; cláusula 6.1, e) e cláusula 7). Se assim ocorre, porque em pauta contrato bilateral em que as partes assumem obrigações mútuas e sem desconsiderar que a chamada pena convencional denota pacto acessório à obrigação principal prevista pelas partes para a hipótese de qualquer delas furtar-se ao regular cumprimento da obrigação assumida (artigo 408, do CC), tenho que a multa imposta na origem não se reveste de nenhuma mácula. Por conseguinte, não há falar-se no bis in idem a que se refere a demandada recorrente.

Ao abrigo de tais fundamentos, nego provimento à apelação para manter a sentença nos moldes em que proferida na origem.

Custas pelo apelante. 

DES. DOMINGOS COELHO (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "NEGARAM O PROVIMENTO AO RECURSO."

Fonte: TJMG