quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Indenização por atraso na entrega de imóvel

Número do processo: 1.0024.07.499799-0/001

EMENTA: RESCISÃO DE CONTRATO - COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - CDC - PRAZO DE ENTREGA - INOBSERVÂNCIA - CORREÇÃO MONETÁRIA - RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS PAGAS - HONORÁRIOS - COMPENSAÇÃO - 1. Tratando-se de contrato de adesão, através do qual o promitente comprador aceita uma situação contratual definida de forma prévia e unilateral pela construtora, tal relação jurídica deve ser regulada pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. Não comprovando a promitente vendedora a ocorrência de caso fortuito ou de força maior, a justificarem o não cumprimento da obrigação, deve restituir integralmente as parcelas pagas pelo promitente comprador. 3. A correção monetária representa mecanismo de mera atualização da real desvalorização da moeda em virtude da corrosão pela inflação, devendo ser aplicada a partir da data em que se deram os efetivos pagamentos das prestações. 4. Os honorários advocatícios, por pertencerem aos advogados, não admitem compensação com valor devido por qualquer das partes.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.07.499799-0/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): CONSTRUTORA TENDA S/A - APELADO(A)(S): CLÁUDIO ALVES DE PAIVA E OUTRO(A)(S) - RELATOR: EXMO. SR. DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO PARCIALMENTE O REVISOR.

Belo Horizonte, 26 de maio de 2009.

DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES:

VOTO

Trata-se de ação ordinária de rescisão c/c pedido de repetição do indébito e reparação por danos morais ajuizada por Cláudio Alves de Paiva e Sandra Maura de Jesus em face de Construtora Tenda S.A., visando a rescisão do contrato de promessa de compra e venda de imóvel com a requerida, sob a alegação de que esta descumpriu o contrato, não entregando o imóvel na data avençada, além de ter transmitido informações equivocadas acerca da construção de um parque próximo ao terreno, pelo que deve ser condenada a devolver-lhe, em dobro, o valor das parcelas pagas, bem como a reparar os danos morais causados.

Juntaram documentos às f. 16-51.

Pela decisão de 55-57, foi deferido o pedido liminar formulado pelos autores, determinando-se que a ré se abstenha de inscrever seus nomes nos cadastros de proteção ao crédito.

Citada, a ré ofereceu contestação às f. 62-87, alegando, em suma, que não houve atraso na entrega do imóvel; que restou previsto no contrato a prorrogação do prazo por mais 120 (cento e vinte) dias; que não é cabível a devolução em dobro dos valores pagos, nem a indenização pretendida.

Audiência de instrução e julgamento às f. 127-129, ocasião em que foram ouvidas duas testemunhas. Outra testemunha foi ouvida por carta precatória à f. 139.

Após regular trâmite, o feito culminou na sentença de f. 148-153, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para declarar a rescisão do contrato e condenar a ré a restituir aos autores todos os valores pagos, acrescidos de correção monetária, desde a data dos pagamentos, e juros de mora, a partir da citação.

Inconformada, a ré aviou recurso de apelação (f. 154-173), onde lega, em resumo, que no momento do ajuizamento da ação ainda não havia ocorrido o vencimento do prazo de entrega do imóvel; que, nos termos da cláusula décima quarta do contrato, o prazo para entrega do imóvel é prorrogável por mais 120 (cento e vinte) dias úteis; que, caso prevaleça a rescisão do contrato, deve ser retido o percentual de 30% (trinta por cento), como multa compensatória pela rescisão contratual; que a correção monetária somente é cabível após a citação; que, diante da sucumbência recíproca, deve haver a compensação da verba honorária.

Preparo recursal à f. 174.

Contra-razões às f. 177-186.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Revelam os autos que os litigantes, no dia 23 de novembro de 2005, firmaram o "contrato particular de promessa de compra e venda" de f. 22-26, com entrega da unidade imobiliária prevista para o mês de janeiro de 2007, conforme consta do item 1.4 do contrato (f. 22).

Ocorre que, como sustentado pelos autores, expirado o prazo pactuado para a entrega do bem, a promitente vendedora não cumpriu sua obrigação.

Inicialmente, saliento que a presente relação jurídica é regulada pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que se trata de contrato de adesão, através do qual os apelados, na qualidade de consumidores, aceitam uma situação contratual definida de forma prévia e unilateral pela apelante, presumindo-se não terem podido alterar substancialmente seu conteúdo.

Assim, a relação deve ser vista sob a ótica do atendimento das necessidades e da proteção dos interesses econômicos do consumidor, em decorrência do reconhecimento de sua vulnerabilidade, tendo como finalidade o alcance do equilíbrio da relação consumerista.

Neste sentido, o seguinte julgado:

"APELAÇÃO CÍVEL Nº 2.0000.00.488347-2/000 - 17.11.2005 BELO HORIZONTE RESPONSABILIDADE CIVIL - INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS E MATERIAIS -- COMPRA E VENDA - BEM IMÓVEL - VÍCIO DE QUALIDADE - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. - A venda de imóveis configura uma relação de consumo, haja vista a empresa vendedora figurar como fornecedora, por se inferir perfeitamente nos ditames do art. 3º, § 1º do Código de Defesa do Consumidor. - O art. 18 do CDC estabelece a responsabilidade solidária dos fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo ou lhes diminua o valor, restando configurada a responsabilidade da vendedora, ainda que não seja a construtora do imóvel, pelos defeitos construtivos, em razão da solidariedade. - A responsabilidade por vícios de qualidade, tal como a do presente caso, não se confunde com a responsabilidade objetiva por fato do produto, envolvendo a apuração da culpa do fornecedor. Assim, para configuração da responsabilidade civil, faz-se imprescindível a comprovação da existência de: a) ato ou omissão antijurídico (culpa ou dolo), b) dano e c) nexo de causalidade entre ato ou omissão e dano". (TJMG - Apelação Cível Nº 2.0000.00.488347-2/000 - 13ª Câmara Cível - Rel. Desembargadora Hilda Teixeira da Costa - j.17.11.2005).

Observa-se que, nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel, basta a ocorrência do distrato contratual por qualquer das partes, sem a exigência de qualquer motivação, para que o consumidor tenha direito à restituição das parcelas efetivamente pagas, o que pode se dar até mesmo por simples desinteresse no objeto contratado, ou, ainda, em virtude de onerosidade excessiva ou descumprimento de obrigação contratual.

Dessa forma, a lei veda a cláusula de perda total das prestações pagas pelo consumidor, sendo, contudo, permitido que se convencione, previamente, penalidade para o caso de descumprimento das obrigações contratuais.

Todavia, tal penalidade deve ser estipulada de forma equitativa, estabelecendo vantagem razoável para o fornecedor, proporcional à sua posição e participação no contrato, pois, do contrário, seria abusiva e ofenderia o postulado do equilíbrio contratual e a cláusula geral da boa-fé.

No caso dos autos, a meu sentir, restou comprovado que a rescisão contratual se deu por responsabilidade da Construtora Tenda, ora apelante, contra a qual pesa o fato incontroverso do atraso na construção e entrega do imóvel, e, em consequência, a presunção de culpa pelo prejuízo provocado aos consumidores, apelados.

Ademais, não obstante a tese recursal de que não há atraso, posto que a presente ação fora ajuizada ainda no decurso dos 120 (cento e vinte) dias previstos para prorrogação do prazo de entrega do imóvel, tal argumento não merece respaldo.

Com efeito, quem pretende erguer um edifício deve tomar todas as cautelas necessárias ao bom andamento da obra, traçando um rígido cronograma, e prestando informações aos promissários compradores, que estão ajudando a financiar a construção.

No caso dos autos, contudo, a ré não apresentou qualquer justificativa para o atraso na entrega do imóvel, limitando-se a consignar que a data prevista para entrega do bem seria 30 de junho de 2007, computando, portanto, os 120 (cento e vinte) dias previstos no contrato.

Ocorre que a aludida prorrogação, nos termos da cláusula 14ª do contrato (f. 25), refere-se às "obras de arremate", bem como à "ocorrência de caso fortuito ou de força maior", o que, inegavelmente, não restou comprovado nos autos. Ao contrário, compulsando a prova oral produzida nestes autos, pode-se constatar que as obras de construção do edifício sequer começaram.

Depoimento da testemunha Sonia dos Santos (128):

"que já sabe onde o imóvel em questão seria construído, já que no local esteve por duas vezes; que esteve no local, neste ano de 2007, sendo, entretanto, que não se lembra a data; que no local não havia nenhuma construção, estando o lote ainda com mato".

Depoimento da testemunha Telma Lúcia Rocha Dias (f. 139):

"o local está sendo utilizado como depósito de lixo; (...); que no local objeto da compra e venda foi feita a terraplanagem, mas somente isso, nem um outro sinal de construção existe no terreno objeto da compra e venda".

Conforme muito bem salientou o douto juiz sentenciante, caberia a ora apelante comprovar a ocorrência de alguma das hipóteses autorizadoras da prorrogação, nos termos do art. 333, II do CPC.

Evidentemente, não há que se falar em "arremate" de uma obra que ainda não começou. E, quanto à "ocorrência de caso fortuito ou de força maior", a tese sequer foi alegada pela recorrente.

Nesse contexto, considerada a culpa da apelante, esta deve restituir a integralidade das prestações quitadas pelos apelados, além de não ter o direito de retenção de qualquer percentual, o qual serviria para cobrir despesas que ocorreram com a ausência de entrega do imóvel, como continuidade de locação de outro imóvel e gastos com nova aquisição.

A seu turno, a segunda apelante, caso realize a obra, ainda poderá vender o imóvel a outro comprador, talvez por preço até superior ao anterior.

Também sem razão a apelante em relação à correção monetária, na medida em que esta representa mecanismo de mera atualização da real desvalorização da moeda, corroída pela inflação, devendo ser aplicada a partir da data em que se deram os efetivos pagamentos das prestações, e não do ajuizamento da ação, sob pena de enriquecimento sem causa da requerida.

Já os juros de mora, de 1% ao mês, incidem a partir da citação, data em que a ré foi constituída em mora.

Quanto à compensação dos honorários, dispõe o art. 21 do CPC que, se cada litigante for em parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas.

Como tenho me manifestado reiteradamente, sigo a corrente que entende que, a partir da vigência do novo Estatuto da Advocacia, está revogado o dispositivo supra referido.

Com efeito, diz o art. 23 do referido Estatuto (Lei 8.906/94):

"Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor."

Ora, se os honorários pertencem aos advogados das partes, não existe a coincidência entre credores e devedores. O advogado do autor é credor do réu e o advogado do réu é credor do autor.

Com a compensação, o direito próprio dos advogados, de cobrarem os seus honorários diretamente das partes vencidas, ficaria prejudicado.

A propósito, os seguintes arestos:

"PROCESSUAL CIVIL - SUCUMBÊNCIA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - COMPENSAÇÃO - LEI 8.906/94 (ART. 23 E § 1º) - LEI 6.830/80 (ARTS. 2º, § 2º E 8º) - CTN, ARTIGO 23 - CPC, ARTIGOS 20 E SEGUINTES - 1. Os honorários profissionais pertencem ao Advogado, e constituindo direito autônomo não podem ser apropriados à compensação com crédito ou valor reconhecido em favor da parte que o constituiu para representá-la judicialmente (art. 23 e § 1º, Lei 8.906/94). No CPC permanecem as normas gerais de regência (arts. 20 e segts.). 2. Precedentes jurisprudenciais. 3. Recurso em provimento." (STJ - REsp 167498 - SP - 1ª T. - Rel. Min. Milton Luiz Pereira - DJU 15.04.2002);

"HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - COMPENSAÇÃO COM VALOR RELATIVO À REPETIÇÃO DO INDÉBITO - INADMISSIBILIDADE - 1. Tendo em vista que os honorários advocatícios pertencem ao advogado (Lei nº 8.906/94, arts. 23 e 24, § 4º), e não à parte, não tem fundamento jurídico a determinação no sentido de que o valor relativo a eles, a ser pago pelo embargado (exeqüente), deve ser deduzido da quantia devida a este pela embargante (executada), referente à repetição do indébito, uma vez que não existe um dos requisitos da compensação, consistente na identidade entre credor e devedor. Precedentes desta Corte. 2. Apelação provida." (TRF 1ª R. - AC 01000726233 - MG - 2ª T. Supl. - Rel. Juiz Conv. Leão Aparecido Alves - DJU 29.05.2003 - p. 82);

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - AUSÊNCIA DE OBSCURIDADE, OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO - COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS - IMPOSSIBILIDADE - O acórdão embargado não traz omissão, obscuridade, contradição ou erro material a corrigir. Ademais, os embargos de declaração não se prestam ao reexame da matéria. Os honorários advocatícios não são compensáveis, à luz da Lei nº 8.906/94, art. 23. Desacolheram os embargos. Vencida em parte a relatora. (TJRS - EMD 70005827589 - 9ª C.Cív. - Relª Desª Rosa Terezinha Silva Rodrigues - J. 26.02.2003).

Ademais, se a compensação fosse somente entre os honorários, como ficariam os do patrono de uma das partes, se a outra estivesse pela justiça gratuita?

Com essas considerações, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.

Custas recursais pela apelante.

O SR. DES. MOTA E SILVA:

VOTO

Com o devido respeito ao eminente Des. Relator, ouso divergir de seu respeitável voto, em relação à possibilidade de compensação dos honorários advocatícios, estando de acordo com os demais termos.

Nos termos do art. 21 do Código de Processo Civil, em caso de sucumbência recíproca são recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre os litigantes os honorários e as despesas.

Com o advento da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB), houve alteração tão-somente da legitimação quanto à destinação dos honorários. Em relação ao instituto da sucumbência e distribuição do ônus permanece a norma ditada pelo Código de Processo Civil.

Em outras palavras, o art. 23 da Lei 8.906/94 não revogou o art. 21 do CPC. O direito autônomo do advogado para execução de honorários sucumbenciais, no caso de sucumbência recíproca, limita-se ao saldo da verba honorária eventualmente existente após efetivada a compensação.

Este posicionamento encontra-se pacificado perante o Supremo Tribunal Federal e perante o Superior Tribunal de Justiça:

Não obstante a disposição do art. 23 do EA, pela qual os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, admite-se, no cade de sucumbência recíproca, a compensação dos honorários. (STF - 2ª Turma, AI 343.841-2-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, j. 20.11.2001, negaram provimento, v.u., DJU de 05.4.2002, p. 45).

Súmula 306 - STJ. Os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte.

Não obstante, no caso em apreço observo que a sentença apelada não merece reparos nesse ponto, tendo em vista que apenas a parte ré foi condenada ao pagamento de honorários, arbitrados em 15% sobre o valor da condenação "aí já considerada a sucumbência parcial". Vê-se, portanto, que o MM. Juiz aplicou o instituto da compensação, o que deve ser mantido.

Diante dos fundamentos acima, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo inalterada a sentença apelada.

O SR. DES. FABIO MAIA VIANI:

VOTO

De acordo.

SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO PARCIALMENTE O REVISOR.


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.07.499799-0/001

Fonte: TJMG