quarta-feira, 11 de maio de 2011

Caso fortuito não justifica atraso na entrega de obra

Número do processo: 1.0024.05.783245-3/001(1)

Inteiro Teor:
EMENTA: AÇÃO ORDINÁRIA - RESCISÃO DE CONTRATO - INADIMPLEMENTO DOS VENDEDORES - RESTITUIÇÃO INTEGRAL DAS PARCELAS PAGAS - DANOS MORAIS - INOCORRÊNCIA. Caso a rescisão do contrato de promessa de compra e venda decorra de ato ilícito praticado pelos promitentes vendedores, caracterizado pela não entrega do imóvel no prazo estipulado no contrato, devem os mesmos restituir ao promissário comprador a totalidade das parcelas recebidas, com atualização monetária e juros de mora. A simples frustração da obtenção de casa própria, ainda que em razão de atraso significativo na entrega do imóvel, não gera o dever de indenizar, mormente se não restaram demonstrados os alegados prejuízos de ordem moral ao autor, sendo certo que a mera intranqüilidade ou os percalços cotidianos não merecem reparação pecuniária, pois, caso contrário, estar-se-ia admitindo que os dissabores do dia-a-dia, a que todos estão sujeitos, se transformassem em ilícito ressarcível em pecúnia. A distribuição recíproca das custas e honorários advocatícios se impõe, visto que cada parte deve suportar os ônus sucumbenciais na proporção da sua derrota, bem como recebê-la na medida da sua vitória, vedada a compensação nos termos do artigo 23 do Estatuto da Advocacia.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.05.783245-3/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): TIAGO DOS SANTOS PRIMEIRO(A)(S), CONSTRUTORA TENDA S.A. SEGUNDO(A)(S) - APELADO(A)(S): CONSTRUTORA TENDA S.A., TIAGO DOS SANTOS - RELATOR: EXMO. SR. DES. OTÁVIO PORTES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR A PRELIMINAR, NEGAR PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO SEGUNDO.

Belo Horizonte, 03 de outubro de 2007.

DES. OTÁVIO PORTES - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. OTÁVIO PORTES:

VOTO

Reunidos os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade, conhece-se do recurso.

Trata-se de "Ação de Rescisão Contratual c/c Devolução da Quantia Paga com Repetição de Indébito e Antecipação de Tutela" proposta por Tiago dos Santos em face de Construtora Tenda S.A. alegando que celebraram contrato de promessa de compra e venda do imóvel descrito na exordial, estando a ré inadimplente com as obrigações contratuais, tendo alterado unilateralmente a data para entrega do apartamento, estendendo-a para mais de 03 (três) anos, além de ter sido ofendido pelos funcionários da empresa, quando entrou em contato para questionar o atraso na entrega do imóvel, o que motivou o presente procedimento, requerendo o autor a rescisão do contrato, a restituição de todas as parcelas pagas, devidamente corrigidas, a condenação da requerida em danos morais, além dos consectários legais da sucumbência.

A MM. Juíza de primeiro grau (fl. 116/122), julgou parcialmente procedente o pedido inicial, declarando rescindido o contrato objeto da lide, condenando a ré a restituir à autora a totalidade dos valores pagos, devidamente corrigidos, além das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.

Inconformado, apela Tiago dos Santos (fl. 125/130), alegando, em preliminar, nulidade da sentença em razão do julgamento antecipado da lide, que cerceou seu direito de defesa, sustentando, no mérito, que faz jus aos danos morais em razão da frustração de não conseguir o "tão sonhado imóvel próprio" (fl. 129), pugnando pela reforma da sentença, para que sejam acolhidos todos os pedido expostos na inicial.

Também inconformada, apela Construtora Tenda S.A. (fl. 139/162), alegando que o atraso na obra ocorreu por causa das chuvas, que ocasionaram o deslizamento de terra do terreno das obras, prejudicando o planejamento feito para o prazo estimado de entrega dos blocos do residencial, não podendo ser responsabilizada pelo atraso na entrega do imóvel em razão da excludente de força maior, pelo que deverá ser compelida apenas ao pagamento de multa. Aduz, ainda, que o autor tornou-se inadimplente desde o mês de abril de 2005, tendo dado causa à rescisão do contrato primeiro, não lhe podendo, portanto, exigir o cumprimento do pactuado, ressaltando que, caso seja mantida a rescisão do contrato, faz jus à retenção de valores, nos termos das cláusulas 15ª e 9ª, podendo reter de 25% a 30% do valor a ser restituído. Pugna, ao final, pela distribuição recíproca das custas e dos honorários advocatícios, com compensação, nos termos da Súmula 306 do Superior Tribunal de Justiça.

Embora devidamente intimados (fl. 164), autor e ré não ofereceram resposta aos recursos (fl. 164v.).

PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA

Cumpre ainda analisar a assertiva do autor apelante de que teve seu direito cerceado em razão do julgamento antecipado da lide.

A propósito, cumpre anotar que constitui dever do magistrado, e não mera faculdade, julgar o feito conforme seu estado, antecipando a solução da lide, se verificar que a matéria tratada na ação exige dilação probatória para sua decisão.

O eminente processualista Calmon de Passos ensina que, "sendo a verdade buscada no processo uma verdade formal, subordinada à preocupação política da pacificação social atribuída ao processo, há um momento considerado ótimo no procedimento e após o qual já não mais se admite cogitar sobre fatos, impondo-se ao magistrado dizer o direito, formando sua convicção com apoio no que se tenha provado nos autos. Este é o momento considerado pelo legislador como adequado para o exame do mérito" (Comentários ao Código de Processo Civil, III/420).

A propósito, os tribunais do País, reiteradamente, têm decidido:

"Quando, após oferecimento da contestação, o Juiz se convencer que a matéria objeto da lide versa tão-somente sobre questões de direito ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência, deve proferir julgamento antecipado da lide" (Adcoas, 1996, nº 8149217).

"Não constitui cerceamento de defesa, nem viola os princípios do contraditório, da igualdade de tratamento das partes ou da ampla defesa, o desate antecipado da lide se entende o julgador já dispor, com os elementos carreados para os autos na fase postulatória do feito, de dados suficientes à formação de seu livre convencimento" (Adcoas, 1996, nº 8149491).

Se é certo que cabe à parte o direito de propor, tempestivamente, as provas que pretende produzir, não menos correto é que compete ao Julgador aquilatar as que são necessárias ao seu convencimento, já que o magistrado, na direção do processo, é dotado de competência discricionária para selecionar os elementos probatórios requeridos pelos litigantes, indeferindo os que demonstrem ser inúteis ou meramente protelatórios, segundo dispõe o artigo 130 do Digesto Instrumental.

O simples fato de ter a parte um de seus pedidos julgado improcedente não significa que deveria o Magistrado estender a fase probatória, mormente se não houve pedido dos litigantes nesse sentido, pois as provas requeridas pelo autor destinavam-se a comprovar apenas o atraso na entrega da obra, e os prejuízos materiais, sendo certo que o dano moral independe de prova, já que é subjetivo, podendo proferir sentença se estiver seguro a exercer um julgamento imediato do mérito.

Não obstante estejam os autos munidos de parca documentação, tal de fato se mostra suficiente à sua elucidação, mormente em se tratando da pretensão exordial de dano moral, que não revela grande esforço para entendimento.

À luz de tais considerações, denota-se que, na presente hipótese, a desnecessidade de dilação probatória, conforme pretendido pelo autor apelante, mostrando-se o conteúdo dos autos suficiente para a elucidação da demanda, razão pela qual se rejeita essa preliminar.

MÉRITO

Os recursos serão analisados em conjunto.

A fim de dirimir a lide, importante destacar que as partes celebraram contrato de promessa de compra e venda de um apartamento, no Residencial Toronto, situado na Rua Hungria, nº 565, Nova Pampulha, em Ribeirão das Neves - MG, arcando o autor, regularmente, com o pagamento das parcelas pactuadas, até abril de 2005 (fl. 85), não obstante tenha a vendedora, unilateralmente, deixado de entregar o imóvel na data avençada, prorrogando sua entrega por mais de 03 (três) anos, conforme documentação juntada aos autos, sendo certa a possibilidade de sua rescisão, mesmo diante do inadimplemento do comprador, que somente ocorreu depois de findo o prazo inicial estipulado para entrega, ou seja, fevereiro de 2005, e de com restituição do valor adimplido pelo suplicante, notadamente em função da regra estabelecida pelo artigo 475 do Novo Código Civil, aplicável ao presente caso.

Em situações semelhantes, os tribunais do País já decidiram que:

"Não demonstrada a ocorrência de motivo legítimo a justificar o excesso de prazo na conclusão das fundações, que é o termo a quo do prazo para a entrega da obra, não podem os compradores aguardar indefinidamente, de modo que se impõe a resolução do contrato de compromisso de compra e venda" ( Revista dos Tribunais, 613/94).

Caracterizada está, portanto, a existência de culpa da recorrente pela rescisão da avença, pois lhe competia entregar o imóvel em fevereiro de 2005, tendo esta litigante prorrogado, unilateralmente, o prazo de entrega para julho de 2008, onerando sobremaneira os compradores, não havendo dúvidas quanto à sua inadimplência, o que importa na procedência do pedido rescisório.

Maria Helena Diniz, em obra sobre o tema versado, doutrina que:

"A dissolução do contrato em razão de causas posteriores à sua criação verificar-se-á por:

1) Resolução por inexecução voluntária do contrato, sempre que houver o inadimplemento do contrato por culpa de um dos contraentes, causando dano ao outro (RT, 451: 190, 491: 77)...

(...) Se o contrato for bilateral, cada uma das partes responderá por culpa (CC, art. 1057, 2ª parte), devendo indenizar o prejudicado, visto que ambas têm direitos e deveres recíprocos, devendo responder em pé de igualdade por culpa ou dolo" ('Tratado Teórico e Prático dos Contratos', 1/161 - 162).

Os pretórios pátrios têm se posicionado no sentido de que:

"Quando o contrato de compra e venda não se aperfeiçoa por inadimplemento da obrigação de qualquer das partes ou de ambas, tudo deve retornar ao estado anterior, mediante indenização por perdas e danos ou devolução, se for o caso, da importância efetivamente paga" (Revista dos Tribunais, 624/174).

"Rescindido o compromisso de compra e venda a prazo por ilícito contratual imputado ao vendedor, devidas são as quantias já pagas pelo comprador corrigidas monetariamente a partir do desembolso de cada parcela" (Revista dos Tribunais, 613/94).

Desse modo, assiste razão ao autor, por se encontrar configurada a inadimplência da suplicada em não cumprir os compromissos avençados, devendo responder pelo prejuízo imposto, em razão de sua responsabilidade.

Ainda dissertando sobre o tema, Maria Helena Diniz deixa consignado que:

"Tal resolução por inexecução voluntária, que impossibilita a prestação por culpa do devedor, tanto na obrigação de dar como na de fazer ou de não fazer, produz os seguintes efeitos:

c) Sujeita o inadimplente ao ressarcimento das perdas e danos (CC, art. 1.056), abrangendo o dano emergente e o lucro cessante; assim, o lesado pelo inadimplemento culposo da obrigação poderá exigir indenização pelos prejuízos causados, cumulativamente com a resolução..." (op. cit., p. 163).

Assim sendo, deverá a ré restituir à autora, como determinado na sentença, todos os valores pela mesma pagos, devidamente atualizados.

Não bastasse, tem-se que a pretensão encontra-se amparada pela Legislação Consumerista, nos termos do entendimento jurisprudencial hodierno, corroborando-se a decisão ora vergastada:

"RESCISÃO CONTRATUAL C/C PERDAS E DANOS - CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - ATRASO NO CUMPRIMENTO DA OBRA - CULPA DA CONSTRUTORA CARACTERIZADA - PROCEDÊNCIA PARCIAL - DECISÃO CONFIRMADA, EM PARTE - 1. Tendo expirado há vários meses o prazo de tolerância de noventa dias, previsto no contrato, para o atraso na entrega do imóvel, sem motivo plausível (não comprovado caso fortuito ou fato de terceiro) para o inadimplemento, caracteriza-se a conduta culposa da construtora, ensejando a rescisão do compromisso de compra e venda e as perdas e danos. 2. Vindo o consumidor pagando regularmente as prestações devidas, mesmo após o término do prazo contratual máximo para a entrega da obra, desde que não haja expectativa razoável para a conclusão do imóvel, não pode a construtora amparar-se na exceção de contrato não cumprido (art. 1.092/CC) para imputar ao promitente comprador a culpa pelo inadimplemento contratual. 3. A taxa de juros moratórios, não sendo convencionada, é de 6% ao ano (art. 1.062/CC)" (Apelação Cível nº 0116276-3, TJPR, 7ª C.Cív., Rel. Des. Accácio Cambi, p. no DJPR de 01.04.02).

"... RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA DE IMÓVEL - UNIDADE HABITACIONAL EM CONSTRUÇÃO - ATRASO NA ENTREGA DA OBRA - RESSARCIMENTO DEVIDO - RECURSO DESPROVIDO - O atraso na entrega da obra conclusa na data contratualmente prevista é causa de rescisão do contrato por culpa da ré construtora/incorporadora, com a obrigação de devolução ao comprador de todos os valores pagos. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.092 DO CC - EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRATUS - Uma parte não pode alegar o inadimplemento da outra senão após quitar a sua parte da avença, nos termos do art. 1.092 do CC. Ou seja, se a incorporadora atrasa na construção da obra contratada, não pode mais exigir o pagamento das parcelas por parte dos compromissários compradores. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICABILIDADE - INTELIGÊNCIA DO SEU ART. 51 - CONTRATO DE ADESÃO - RESTITUIÇÃO DE TODOS OS VALORES PAGOS - Existindo no contrato de empreitada verdadeira avença de cunho adesivo à outra parte, tem esta o direito à restituição de todas as parcelas efetivamente pagas, sob pena de configurar-se o enriquecimento ilícito daquela que retém o quantum adimplido e ofensa ao art. 51 do Codecon e jurisprudência pacífica deste Sodalício e Tribunais Superiores" (Apelação Cível nº 00.022414-6, TJSC, 1ª C.Cív., Rel. Des. Carlos Prudêncio, j. em 26.06.01).

Assinala-se, ainda, que devem ser aplicadas ao caso as disposições constantes do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista satisfazerem as partes os conceitos de fornecedor e de consumidor estabelecidos pelos artigos 2º e 3º do referido diploma legal.

Assim, tem-se que o artigo 51 da Lei 8.078/90 determina que "São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade".

"In casu", nota-se que pretende a recorrente retenção de 25% a 30% dos valores pagos pela autora pelo imóvel que negociaram, como indenização por administração e multa contratual.

Nesse sentido, tem-se que, tendo em vista o descumprimento contratual da vendedora, que deu causa à rescisão, já que deixou de entregar o imóvel na data aprazada, não há que se falar em percentual de retenção, devendo a Construtora devolver ao autor todos os valores pagos, integralmente, devidamente corrigidos.

Quanto à indenização por danos morais importa registrar, a princípio, que, genericamente, conceitua-se o dano como qualquer mal ou ofensa pessoal, deteriorização, prejuízo a uma pessoa (Dicionário da Língua Portuguesa, Caldas Aulete), sendo que, na linguagem jurídica, constitui a efetiva diminuição da estabilidade psíquica alheia, provocada por ação ou omissão de terceiro, agredindo "la victima, em su honor o en sus afectos", segundo elucida Mazeand (Tratado de La Responsabilidad Civil, p. 298).

No plano jurídico nacional, o dano e o conseqüente dever de o ressarcir advém de ato ilícito traduzido em infringência à ordem jurídica, com ofensa ao direito alheio e lesão ao respectivo titular, conforme dispõem os artigos 186 e 927 do Novo Código Civil, aplicável à espécie.

Analisando a regra legal transcrita "in retro", que repete a previsão legal que continha o artigo 159 do vetusto Diploma Substantivo Civilista, ensina Sílvio Rodrigues que constituem "pressupostos da responsabilidade civil: A) ação ou omissão do agente; B) culpa do agente; C) relação de causalidade; D) dano experimentado pela vítima" (Direito Civil, IV/14), doutrinando, semelhantemente, Antônio Lindbergh C. Monteiro que os pressupostos necessários à imposição da obrigação de indenizar são: "a) o dano, também denominado prejuízo; b) o ato ilícito ou risco, segundo a lei exija ou não a culpa do agente; c) um nexo de causalidade entre tais elementos" (Do Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais, p. 10).

Subtrai-se dessas normas, que o dever de reparar assenta-se na conjugação necessária de três requisitos indissociáveis, quais sejam, o dano ou o prejuízo sofrido pela vítima, a culpa do agente e o nexo causal entre tais elementos, resultando induvidoso que a ausência de um desses pressupostos afasta a obrigação de indenizar, à vista do que, não é suficiente apenas a alegada conduta antijurídica da ré para que se reconheça o dever de ressarcir, sendo necessária a prova de que o ato praticado pela mesma ocasionou ao autor ofensa passível de indenização.

Os tribunais pátrios têm decidido ser "sabido que em matéria de responsabilidade civil por danos patrimoniais ou morais, é necessário que se verifique a presença simultânea de três elementos essenciais, ou seja, da ocorrência induvidosa do dano; a culpa, dolo ou má-fé do ofensor; e o nexo causal entre a conduta ofensiva e o prejuízo da vítima, não se satisfazendo a responsabilidade civil na ausência de qualquer deles" (Apelação Cível nº 24.517-4, TJSP, rel. Des. Brenno Marcondes, Jurisprudência Informatizada Saraiva, CDROM nº 16).

Assim, nos termos da previsão contida na legislação consumerista, para a configuração do dever de reparar deverão restar demonstrados no feito o efetivo dano havido na honra do promitente-comprador, bem como o nexo de causalidade entre este e os fatos alegados na exordial.

Em sintonia com esses conceitos, tem-se que ocorre o dano moral em havendo prejuízo decorrente da dor imputada a uma pessoa, em razão de atos que, indevidamente, ofendem seus sentimentos de honra e dignidade, provocando mágoa e atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral, escrevendo José Eduardo Callegari Cenci, a respeito, que "dano moral é, em síntese, o sofrimento experimentado por alguém, no corpo ou no espírito, ocasionado por outrem, direta ou indiretamente derivado de ato ilícito" (RT 683/46).

Para Wilson Mello da Silva (O Dano Moral e sua Reparação, p. 13) constituem danos morais as "lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico", conceituação esta adotada, "mutatis mutandis", por Zulmira Pires Lima (Revista da Faculdade de Direito, Coimbra, p. 226), ao ensinar como sendo "aqueles que operam exclusivamente sobre a nossa personalidade, consistindo numa dor que não tem nenhuma espécie de repercussão sobre o patrimônio presente ou futuro da pessoa lesada".

Esse ressarcimento encontra-se assegurado, indistintamente, na atualidade, na Constituição Federal de 1988, ao estabelecer direito à vida privada, à integridade física e moral, à honra e à imagem das pessoas, como direitos invioláveis, passíveis de serem indenizados em situações que evidenciem a presença de prejuízos efetivos, sendo que, da redação do artigo 5º, V e X da Carta Magna, verifica-se que o equilíbrio moral das pessoas foi equiparado a direitos fundamentais tais como o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, sempre tutelados pela ordem jurídica, o que permite concluir que se proíbe qualquer ação que importe em lesão a outrem, máxime em se tratando de ameaça a valores protegidos como aspectos basilares da personalidade humana.

Subtrai-se das lições transcritas "in retro" que o dano moral indenizável é aquele que, decorrente de uma conduta antijurídica, submete a vítima a uma dor íntima, ferindo-lhe a honra e a dignidade, abalando sua imagem e resultando em ofensa aos atributos pessoais que lhe são mais caros, donde se conclui que se exige que o prejuízo causado seja verdadeiramente relevante, ultrapassando a fronteira do simples desconforto, constrangimento ou incômodo passageiros, mesmo porque, se assim não fosse, a Lei Maior não o teria equiparado aos direitos fundamentais, que são de indiscutível relevância, alçando o dano moral ao patamar dos interesses que, juridicamente, apresentam-se como indispensáveis à sobrevivência digna do cidadão.

O Mestre e Desembargador Décio Antônio Erpeu (TJRGS), depois de advertir para a cautela a que se deve arrogar, para si, o julgador ao aferir o fato, a segurança jurídica dos cidadãos, demandante e demandado, prestigiar a temperança e até mesmo a "tolerância", acentua que "a cobrança persistente e judicializada nos pequenos percalços, traduzida em litígios generalizados, vai tornar a vida insuportável", devendo-se jamais descurar "a condição de criatura e não de criador", e como tal "falível", acentuando que:

"Há que se definir, pois, o que seja tolerável e o que seja indenizável, para valorizar-se qualitativamente a atividade judicante e não esvaziá-la de seus mais nobres e profundos objetivos..." e conclui dever sofrer essa indenização "os temperos da lei e da vida. Sua incidência há que se dar numa faixa dita tolerável. Se o dano causado, injustamente, a outrem, integra uma faixa da ruptura das relações sadias, a reparação do mesmo não pode servir de motivo para gerar mais uma espécie de desagregação social", e persiste na adoção "da moderação no acolhimento" (RT 758/49-51).

Induvidosamente, traduz a indenização pecuniária por "pretium doloris" em subtração de um bem jurídico, decorrida de dura agressão à honra, à dignidade, ao respeito e à dignidade de alguém perante terceiros, não coadunando com a finalidade desse instituto os incômodos, meros aborrecimentos, advindos de "erro de conduta", doutrinando, a respeito, Rui Stoco (Responsabilidade Civil e Sua Interpretação Jurisprudencial, p. 49), que:

"Não basta que o agente haja procedido 'contra jus', isto é, não se define a responsabilidade pelo fato de cometer um 'erro de conduta'. Não basta que a vítima sofra um dano, que é o elemento objetivo do dever de indenizar, pois se não houve um prejuízo a conduta antijurídica não gera obrigação de indenizar.

É necessário que se estabeleça uma relação de causalidade entre a injuridicidade da ação e o mal causado, ou, na feliz expressão de Demogue, 'é preciso esteja certo que, sem esse fato, o dano não teria acontecido'".

"In hipothesi", verifica-se que, embora o autor tenha sofrido transtornos com todos os fatos narrado na inicial, o certo é que a rescisão do contrato não passa de mero percalço que pode ser vivido no dia-a-dia por todos os que se submetem a relações negociais, devendo-se destacar que a quebra contratual, por si só, não gera dano moral passível de indenização.

Destarte, embora provado o aborrecimento vivenciado pelo suplicante, inclusive com a alegada ofensa por prepostos da ré, não se mostra passível de ressarcimento, eis que derivado de solução de contrato firmado com a parte adversa, como acontecimento cotidiano, notadamente com pessoas que travam as hodiernas relações contratuais de mútuo através de pacto de adesão.

Não destoam as decisões pretorianas:

"Indenização - Dano moral - Ausência de provas quanto à sua ocorrência - Mero equívoco que não expôs o autor em situação vexatória - Recurso não provido" (Apelação Cível nº 28.449-4, TJSP, 3ª Câmara de Direito Privado, rel. Des. Toledo César, Jurisprudência Informatizada Saraiva, CDROM nº 16).

"Responsabilidade civil - Danos Morais - Transtornos normais do dia-a-dia - Simples sensação de desconforto que não cabe indenização - Não cabem no rótulo de 'dano moral' os transtornos, aborrecimentos ou contratempos que sofre o homem no seu dia a dia, absolutamente normais na vida de qualquer um" (Apelação Cível nº 217320-2, TJSP, 11ª Câmara Cível, rel. Des. Pinheiro Franco, Jurisprudência Informatizada Saraiva, CDROM nº 16).

Quanto aos honorários advocatícios, tem-se que a distribuição da sucumbência deve ser feita, no caso em análise, na forma do artigo 21 do Código de Processo Civil, no qual se estabelece que "se cada litigante for em parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas".

Trata-se de norma que impõe a reciprocidade e proporcionalidade na distribuição dos honorários e despesas do processo na hipótese de ambas os litigantes terem saído vencidos e vencedores na lide, o que equivale a dizer que, em havendo sucumbência recíproca, é imperioso que sejam as partes condenadas, em proporção, ao pagamento das custas e da verba honorária, a serem rateadas entre as mesmas.

O doutrinador Ernane Fidélis dos Santos elucida que:

"Se houver sucumbência recíproca, os honorários e as despesas serão proporcionais, fazendo-se a devida compensação. Dando-se procedência, por exemplo, apenas a cinqüenta por cento do pedido, as partes pagarão as despesas na mesma proporção. Os honorários advocatícios poderão fixar-se com a mesma operação, mas nada impede que o juiz, atendendo à diversidade do grau de zelo profissional e ao trabalho realizado pelos advogados (artigo 20, parágrafo 3º, a e c), estabeleça critérios diversos à remuneração de cada um. Se o pedido, no entanto, for atendido a mais ou a menos de cinqüenta por cento e o juiz quiser fazer a fixação de honorários em cotas iguais, como comumente ocorre, faz-se a compensação e as despesas se pagam proporcionalmente" (Manual de Direito Processual Civil, I/105, nº 237).

A propósito, Humberto Theodoro Júnior ensina que "opera-se a sucumbência recíproca quando o autor sai vitorioso apenas em parte de sua pretensão. Tanto ele como o réu serão, pois, vencidos e vencedores, a um só tempo.

Nesses casos, 'serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas' (art. 21).

Para tanto, ter-se-á que calcular o total dos gastos do processo e rateá-lo entre os litigantes na proporção em que se sucumbiram. Se a derrota for igual (50%), a verba de um anulará a do outro, de modo que não haverá honorários e as custas só serão reembolsadas se algum deles antecipou mais despesas que o outro. Se a sucumbência for maior para uma parte, esta terá de arcar com maior parcela da despesas. O cálculo, para ser justo, deverá ser sempre total, para que depois de apuradas as parcelas de um e outro possa efetuar-se a recíproca compensação" (Curso de Direito Processual Civil, I/92, nº 81).

Com efeito, a distribuição recíproca das custas e honorários advocatícios se impõe, visto que cada parte deve suportar os ônus sucumbenciais na proporção da sua derrota, bem como recebê-la na medida da sua vitória.

Desta feita, deve a requerida arcar com 60% das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor total da condenação, ficando a cargo do autor 40% das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$1.000,00 (hum mil reais), suspensa a exigibilidade quanto a requerente, nos termos do artigo 12, da Lei 1.060/50, cabendo ainda destacar que os honorários advocatícios não podem ser compensados, tendo em vista a vedação constante do artigo 23 do Estatuto da Advocacia.

Mediante tais considerações, nega-se provimento ao primeiro recurso e dá-se parcial provimento ao segundo apelo, apenas para determinar a distribuição da sucumbência, nos termos explicitados "in retro".

Custas recursais, 50% pela ré e 50% pelo autor, suspensa a sua exigibilidade quanto a este, nos termos do artigo 12 da Lei 1.060/50.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): NICOLAU MASSELLI e JOSÉ AMANCIO.

SÚMULA : REJEITARAM A PRELIMINAR, NEGARAM PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO SEGUNDO.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.05.783245-3/001

Fonte: TJMG