quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Danos morais por atraso na entrega do imóvel

EMENTA: APELAÇAO - AÇAO DE INDENIZÇAO - ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL - DANO MORAL - CONFIGURADO - VALORAÇÃO - PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE

- O dano moral é caracterizado pela lesão sofrida por pessoa, física ou jurídica, em certos aspectos da sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem, atingindo-a na esfera íntima da moralidade e afetividade, causando-lhe constrangimentos.

- No caso presente, verifico que o autor firmou contrato para aquisição da tão sonhada casa própria. As particularidades do caso denotam que o atraso na entrega do imóvel ultrapassou os meros dissabores. Houve todo um planejamento para que a mudança ocorresse para o imóvel objeto do contrato, posteriormente, ocorreu a locação de outro imóvel e, ainda, gastos não previstos, o que demonstrou de forma inequívoca o constrangimento e transtorno sofrido pelo autor.

- Embora inexista orientação uniforme e objetiva na doutrina ou na jurisprudência de nossos tribunais para a fixação dos danos morais, é ponto pacífico que o Juiz deve sempre observar as circunstâncias fáticas do caso examinado, exaltando sempre a gravidade objetiva do dano, seu efeito lesivo, a natureza e a extensão do dano, as condições sócio-econômicas da vítima e do ofensor, visando com isto que não haja enriquecimento do ofendido e que a indenização represente um desestímulo a novas agressões.

VV. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ATRASO NA ENTREGA DE UNIDADE IMOBILIÁRIA - DANOS MATERIAIS - OCORRÊNCIA - DANOS MORAIS - MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Em virtude do ilícito contratual praticado pela construtora, consistente no não cumprimento do prazo prometido para a entrega da unidade imobiliária adquirida pelo autor, deve ela arcar com os prejuízos materiais efetivamente comprovados pelo autor, consistentes em aluguéis e taxas condominiais, pelo período do atraso. - Não tendo o autor demonstrado que, em decorrência do inadimplemento contratual, por parte da ré, sofreu efetiva lesão a quaisquer de seus direitos de personalidade, não há que se falar em condenação desta a pagar indenização, a tal título, porque a jurisprudência pátria vem reiteradamente decidindo que simples inadimplemento contratual não gera direito indenizatório de cunho moral - Estando expressamente excluída pelo contrato a multa penal, em caso de o atraso na entrega da obrar advir de atraso do próprio serviço público, como no caso do fornecimento do "habite-se", não há que se falar em tal penalidade.

Apelação Cível Nº 1.0024.11.202722-2/001 - COMARCA DE Belo Horizonte - 1º Apelante: FRANCISCO WAGNER AZEVEDO COSTA e sua mulher, ANA PAULA MENDONÇA - 2º Apelante: FERNÃO DIAS EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA - Apelado (a) (s): FRANCISCO WAGNER AZEVEDO COSTA e sua mulher, ANA PAULA MENDONÇA, FERNÃO DIAS EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 14ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS, VENCIDO PARCIALMENTE O RELATOR.

Belo Horizonte, 16 de agosto de 2012.

DESEMBARGADOR ANTÔNIO DE PÁDUA

Relator.



O EXMº SR. DES. ANTÔNIO DE PÁDUA (RELATOR)

V O T O



Trata-se de recursos de apelação interpostos, respectivamente, por Francisco Wagner Azevedo Costa e sua mulher e Fernão Dias Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda., nos autos da Ação de Revisão Contratual, cumulada com indenização por Danos Morais e Materiais, movida pelos primeiros contra a segunda, em curso perante o juízo da 16ª. Vara Cível desta Comarca, inconformados com os termos da r. sentença de fls. 310/316, que julgou procedente, em parte, o pedido inicial, para condenar a ré a pagar aos autores, a título de danos materiais a quantia de R$4.470,82 (Quatro mil, quatrocentos e setenta reais e oitenta e dois centavos), correspondentes aos aluguéis pagos durante o período de atraso na entrega da unidade residencial adquirida, mais R$225,90 (Duzentos e vinte e cinco reais e noventa centavos), de diferença do condomínio pago a mais, mais R$10.000,00(Dez mil reais) a título de danos morais, valores atualizados monetariamente pelos índices publicados pela Corregedoria Geral de Justiça e juros de mora de 1% (Um por cento) ao mês, condenando, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais e da verba honorária arbitrada em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.

Em suas razões recursais, de fls. 318/322, os primeiros apelante buscam, em síntese, a reforma parcial da sentença, para o fim de que a ré condenada ao pagamento de uma multa a ser estipulada, em decorrência do atraso na entrega da obra por eles adquirida do apelado, independentemente da comprovação de quaisquer prejuízos.

Já a segunda apelante, em suas razões recursais de fls. 323/340, após traçar uma síntese dos principais acontecimentos do processo, aduz que a sentença deve ser reformada para ser isenta de qualquer responsabilidade pelo atraso na entrega da obra, afigurando-se, na espécie, motivo de força maio prevista contratualmente e fato de terceiro, tendo ela, de sua parte, cumprido integralmente tudo a que se obrigou.

Insurge-se também contra a sua condenação ao pagamento de dano moral, afirmando que, ainda que tivesse havido descumprimento do contrato, este, por si só, consoante reiterada jurisprudência, não acarretaria dano moral.

Postula, ao final, o provimento do recurso para o fim de que seja reformada a sentença e julgado inteiramente improcedente o pedido inicial, ou que, pelo menos, seja afastado o dano moral.

Contrarrazões nas fls. 349/357, pelos segundos apelados.

A primeira apelada não apresentou contrarrazões, apesar de regularmente intimada para tal fim.

Preparo na fl. 341, pela segunda apelante.

Os primeiros apelantes litigam com os benefícios da gratuidade judiciária, não tendo, por conseguinte, efetuado o preparo do respectivo recurso.

Conheço de ambas as apelações, presentes suas condições de admissibilidade.

ANÁLISE CONJUNTA DAS APELAÇÕES.



Cuida-se de recursos contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado nos autos de ação de revisão contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais.

Alegam os primeiros apelantes que, em 21 de julho de 2008, compraram o apartamento descrito na peça de ingresso, a ser construído pela ré, com prazo de entrega previsto para o mês de abril de 2010, mas as chaves do imóvel só lhes foram entregues no mês de janeiro de 2011, mais de 08 (oito) meses depois de esgotado o prazo contratual, acarretando-lhes vários prejuízos, tanto de natureza material quanto moral.

Bem examinados os elementos de convicção presentes nos autos, verifica-se que, de fato, houve um atraso na entrega da obra por parte da ré, perfeitamente previsível, e que, por isso mesmo, não se pode falar na espécie em caso fortuito ou força maior, como quer a segunda apelante, em face da inocorrência de qualquer acontecimento extraordinário que os justifiquem.

Igualmente não se pode falar em fato de terceiro, sendo o atraso de responsabilidade exclusiva da réu.

Conclui-se, portanto, que o atraso imputável à ré, em aproximadamente nove meses, consiste no descumprimento do prazo prometido para o término das obras, o que a obriga a arcar com os prejuízos materiais efetivamente comprovados pelos autores.

Assim, os autores fazem jus à restituição do valor que tiveram de pagar, a título de aluguéis e condomínios, porquanto, com a não entrega do apartamento no prazo contratual, não lhes deu outra alternativa senão a de contratar a locação nos moldes já delineados, o que lhes gerou um gasto extra. Diante desse quadro, deve a ré indenizá-los pelos aluguéis pagos, devidamente comprovados por meio dos documentos, no período compreendido entre maio de 2010 a janeiro de 2011, com a correspondente taxa condominial, nos valores de R$4.470,82 (Quatro mil, quatrocentos e setenta reais e oitenta e dois centavos) e R$225,00(duzentos e vinte e cinco reais), respectivamente.

Em relação ao dano moral, embora sua reparabilidade ou ressarcibilidade seja pacífica na doutrina e na jurisprudência, mormente após o advento da Constituição Federal de 1988 (art. 5º, incisos V e X), estando hoje a matéria sumulada sob o nº 37, pelo STJ, tenho que, na espécie, assiste razão a segunda apelante, não sendo devida a indenização pleiteada pelos autores e concedida pela sentença, consoante reiteradas decisões deste tribunal e do STJ, por se cuidar de simples inadimplemento contratual.

Nesse sentido, decisões do STJ:

EMENTA: AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO. EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO. IMPONTUALIDADE NA ENTREGA DA OBRA. DANOS MORAIS. -1. O inadimplemento de contrato, por si só, não acarreta dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. É certo que a inobservância de cláusulas contratuais pode gerar frustração na parte inocente, mas não se apresenta como suficiente para produzir dano na esfera íntima do indivíduo, até porque o descumprimento de obrigações contratuais não é de todo imprevisível - 2 Conforme entendimento pacífico do STJ, a correção monetária tem como marco inicial a data da prolação da sentença que fixa o quantum indenizatório - 3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido." (REsp 876.527/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 01/04/2008, DJE 28/04/2008)

No mesmo norte, as decisões deste Tribunal:

EMENTA: RESCISÃO DE CONTRATO - COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL - INDENIZAÇÃO - DANO MATERIAL - PAGAMENTO DE ALUGUEL - DANO MORAL - IMPOSSIBILIDADE. Havendo responsabilidade da construtora pela não entrega do imóvel no prazo contratado, deverá devolver à adquirente as prestações pagas, em sua totalidade, além de ressarci-la pelos aluguéis despendidos no período. "O inadimplemento de contrato de promessa de compra e venda pelo vendedor, por si só, não gera direito à indenização por danos morais em caso de rompimento do pacto." (TJMG, 15ª Câm. Cível, Emb. Infr. nº 2.0000.00.439364-2/002, rel. Des. D. Viçoso Rodrigues, j. em 25.8.2005).

Também este Relator já teve oportunidade de decidir matéria análoga, do seguinte teor:

EMENTA: RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - INADIMPLEMENTO DO PROMITENTE VENDEDOR - RESCISÃO E DANOS MATERIAIS RECONHECIDOS PELO RÉU - DANO MORAL INEXISTENTE. A responsabilidade civil aquiliana, prevista no art. 159 do Código Civil de 1916, para sua configuração, depende da ocorrência dos seguintes elementos: a culpa ou dolo, o dano e o nexo de causalidade. Um acontecimento só configurará o dano moral se for suficiente para afetar os sentimentos dos indivíduos pertencentes a uma realidade semelhante à da vítima. "Os aborrecimentos gerados pelo descumprimento de um contrato de compra e venda não são suficientes para configurar dano moral que dão ensejo a uma indenização." (TJMG, 9ª Câm. Cível, Ap. Cível nº 2.0000.00.514221-8/000, rel. DES. ANTÔNIO DE PÁDUA, j. em 27.9.2005).

No tocante ao pedido de aplicação de multa, formulado pelos primeiros apelantes, tenho que razão não lhes assiste, porquanto, em tal hipótese, a Cláusula X-I a exclui expressamente, quando o atraso na entrega física da obra decorrer de atraso na execução dos serviços públicos, como no caso, que, incontroversamente, houve atraso no fornecimento do "habite-se", pelo município de Belo Horizonte.

Assim, o recurso apresentado pelos autores não merece prosperar.

À vista do exposto, NEGO PROVIMENTO à primeira apelação e DOU PARCIAL PROVIMENTO à segunda apelação para afastar da condenação o dano moral arbitrado.

Custas recursais, em 50% (cinquenta por cento) para cada parte, suspensa a respectiva exigibilidade em relação aos primeiros apelante, por força do disposto no art. 12 da Lei 1060/50.





DES. ROGÉRIO MEDEIROS (REVISOR)

V O T O

SÚMULA: NEGAR PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS

EMENTA: APELAÇAO - AÇAO DE INDENIZÇAO - ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL - DANO MORAL - CONFIGURADO - VALORAÇÃO - PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE

- O dano moral é caracterizado pela lesão sofrida por pessoa, física ou jurídica, em certos aspectos da sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem, atingindo-a na esfera íntima da moralidade e afetividade, causando-lhe constrangimentos.

- No caso presente, verifico que o autor firmou contrato para aquisição da tão sonhada casa própria. As particularidades do caso denotam que o atraso na entrega do imóvel ultrapassou os meros dissabores. Houve todo um planejamento para que a mudança ocorresse para o imóvel objeto do contrato, posteriormente, ocorreu a locação de outro imóvel e, ainda, gastos não previstos, o que demonstrou de forma inequívoca o constrangimento e transtorno sofrido pelo autor.

- Embora inexista orientação uniforme e objetiva na doutrina ou na jurisprudência de nossos tribunais para a fixação dos danos morais, é ponto pacífico que o Juiz deve sempre observar as circunstâncias fáticas do caso examinado, exaltando sempre a gravidade objetiva do dano, seu efeito lesivo, a natureza e a extensão do dano, as condições sócio-econômicas da vítima e do ofensor, visando com isto que não haja enriquecimento do ofendido e que a indenização represente um desestímulo a novas agressões.



VOTO DIVERGENTE DES. ROGÉRIO MEDEIROS

Peço vênia ao ilustre Relator, para divergir do seu judicioso voto no que passo a expor.

Não podemos desprezar os preceitos da boa-fé. A ética impregnou o Direito Civil contemporâneo. Quanto ao princípio da boa-fé, já era definido doutrinariamente, segundo Orlando Gomes (in Contratos. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 10ª ed., 1984, p. 43):

"Para traduzir o interesse social de segurança das relações jurídicas, diz-se, como está expresso no Código Civil alemão, que as partes devem agir com lealdade e confiança recíprocas. Numa palavra, devem proceder com boa fé. Indo mais adiante, aventa-se a idéia de que entre o credor e o devedor é necessária a colaboração, um ajudando o outro na execução do contrato".

O preceito sobre boa-fé é considerado por Miguel Reale o "artigo-chave" do Novo Código Civil Código Civil (in Estudos Preliminares do Código Civil. São Paulo: Editora RT, 2003, pp. 75 e 77):

"Em todo ordenamento jurídico há artigos-chave, isto é, normas fundantes que dão sentido às demais, sintetizando diretrizes válidas 'para todo o sistema'.

"Nessa ordem de idéias, nenhum dos artigos do novo Código Civil me parece tão rico de conseqüência como o art. 113, segundo o qual 'os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração'(...).

"Boa-fé é, assim, uma das condições essenciais da atividade ética, nela incluída a jurídica, caracterizando-se pela sinceridade e probidade dos que dela participam, em virtude do que se pode esperar que será cumprido e pactuado sem distorções ou tergiversações, máxime se dolosas, tendo-se sempre em vista o adimplemento do fim visado ou declarado como tal pelas partes".

O Código Civil de 2002 expressou o princípio da boa-fé objetiva. Na dicção de Álvaro Villaça Azevedo (in Teoria Geral dos Contratos Típicos e Atípicos. São Paulo: Atlas, 2002, p. 26/27):

"Deve existir, ante a lealdade, a honestidade e a segurança, que se devem os contratantes, nas tratativas negociais, na formação, na celebração, na execução (cumprimento) e na extinção do contrato, bem como após esta.

"Assim, desde o início devem os contratantes manter seu espírito de lealdade, esclarecendo os fatos relevantes e as situações atinentes à contratação, procurando razoavelmente equilibrar as prestações, expressando-se com clareza e esclarecendo o conteúdo do contrato, evitando eventuais interpretações divergentes, cumprindo suas obrigações nos moldes pactuados, objetivando a realização dos fins econômicos e sociais do contrato; tudo para que a extinção do contrato não provoque resíduos ou situações de enriquecimento indevido, sem causa. (...)

"Todo o Direito dos povos obedece a esse princípio de acolher a boa-fé e de repelir a má-fé".

Na acepção de Georges Ripert (in A Regra Moral nas Obrigações Civis. Campinas: Bookseller, trad. Osório de Oliveira, 2ª ed., 2002, p. 24):

"É preciso inquietarmo-nos com os sentimentos que fazem agir os assuntos de direito, proteger os que estão de boa-fé, castigar os que agem por malícia, má-fé, perseguir a fraude e mesmo o pensamento fraudulento. (...) O dever de não fazer mal injustamente aos outros é o fundamento do princípio da responsabilidade civil; o dever de se não enriquecer à custa dos outros, a fonte da ação do enriquecimento sem causa".

Na espécie, a parte autora levou a demanda ao Estado-juiz pleiteando a reparação pelos danos morais e materiais que sofreu com o atraso na entrega do imóvel.

O dano moral é caracterizado pela lesão sofrida por pessoa, física ou jurídica, em certos aspectos da sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem, atingindo-a na esfera íntima da moralidade e afetividade, causando-lhe constrangimentos.

Assim ensina a doutrina:

"A reputação pessoal integra-se no direito da personalidade, como atributo da honra do ser humano, merecendo assim, a proteção das normas penais e das leis civis reparatórias.

Sob a égide dessa proteção devida, acentua-se cada vez mais na jurisprudência a condenação daqueles atos que molestam o conceito honrado da pessoa, colocando em dúvida a sua probidade e seu crédito.

Definem-se como tais aqueles atos que, de alguma forma, mostram-se hábeis para macular o prestígio moral da pessoa, sua imagem, sua honradez e dignidade, postos como condição não apenas para atividades comerciais, como também para o exercício de qualquer outra atividade lícita" (CAHALI, Yussef Said. Dano Moral, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, pág.358).

No caso presente, verifico que os autores firmaram contrato para aquisição da tão sonhada casa própria. As particularidades do caso denotam que o atraso na entrega do imóvel ultrapassou os meros dissabores. Houve todo um planejamento para que a mudança ocorresse para o imóvel objeto do contrato, posteriormente, ocorreu a locação de outro imóvel e, ainda, gastos não previstos, o que demonstrou de forma inequívoca o constrangimento e transtorno sofrido pelos autores.



Sobre os danos morais, frise-se que o ordenamento civil constitucional, (art. 1º. III, da CF c/c art. 12 do Código Civil), estabelece uma cláusula geral da personalidade humana destinado a proteger os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita, ou mesmo ameaça, à integralidade psicofísica, posto que o "princípio constitucional da dignidade da pessoa humana é uma radical a partir do qual se formam diversas manifestações jurídicas, dentre elas a tutela da personalidade humana, categoria jurídica através da qual se revelam as mais expressivas facetas da subjetividade do homem. Se, de uma perspectiva, o princípio da dignidade possui uma dimensão objetiva, a partir da qual se podem extrair valores éticos e princípios jurídicos que devem reger a vida em sociedade, de outra ele possui também uma dimensão subjetiva que permite que dele sejam extraídos direitos subjetivos destinados a proteger juridicamente aspectos da pessoa humana, dentre os quais se encontram os direitos da personalidade". (Cláudio Ari Mello. O novo Código Civil e a Constituição. 2ª edição, 2006. p. 91).



Nessa perspectiva o dano moral não está necessariamente vinculado a alguma reação psíquica da vítima. Para que haja a identificação do dano moral é imperativo que haja ofensa à dignidade da pessoa humana. É por essa razão que pode haver dor, vexame e sofrimento sem violação do princípio da dignidade. Dor, vexame e humilhação podem ser conseqüências e não causas". (Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho. Comentários... 2007. p. 103).



Cumpre enfatizar, como o faz Marina Celina Bodin de Moraes, que a importância de conceituar o dano moral como lesão à dignidade, que numa de suas facetas envolve, como já referido, a personalidade humana enquanto manifestação da subjetividade nas mais diversas situações cotidianas, são as conseqüências daí advindas, posto que "em primeiro lugar, toda e qualquer circunstância que atinja o ser humano em sua condição humana, que (mesmo longinquamente) pretenda tê-lo como objeto, que negue sua qualidade de pessoa será automaticamente considerada violadora de sua personalidade e, se concretizada, causadora de dano moral a ser reparado. Acentue-se que o dano moral, para ser identificado, não precisa estar vinculado à lesão de algum 'direito subjetivo' da pessoa da vítima, ou causa algum prejuízo a ela. A simples violação de uma situação subjetiva extrapatrimonial (ou de um "interesse não patrimonial") em que esteja envolvida a vítima, desde que merecedora de tutela, será suficiente para garantir a reparação" (Danos à Pessoa... p. 188).



Deste modo, "não será toda e qualquer situação de sofrimento, tristeza, transtorno ou aborrecimento que ensejará a reparação, mas apenas aquelas situações graves o suficientes para afetar a dignidade humana em seus diversos substratos materiais, já identificados, quais sejam, a igualdade, a integridade psicofísica, a liberdade e a solidariedade familiar ou social, no plano extrapatriminial em sentido estrito" (Maria Celina Bodin de Moraes. Danos à Pessoa Humana... 2007. p. 188/189).



Necessário enfatizar que "como já assentado na jurisprudência não é necessário provar o prejuízo (...), mas, apenas, a existência do fato capaz de gerar constrangimento, sofrimento, perturbação psíquica". (STJ. Min. Menezes Direito. Resp. 233.597), posto que não é possível aferir-se o abalo íntimo sofrido na esfera psíquica da pessoa, que ademais é conseqüência do dano moral e não causa, como já assentado.



No que concernente à quantificação do dano moral, Humberto Theodoro Junior leciona que:



"Para cumprir a tarefa de um árbitro prudente e eqüitativo, na difícil missão de dar reparação ao dano moral, sem cair na pura arbitrariedade, adverte a boa doutrina que: 'ao fixar o valor da indenização, não procederá o juiz como um fantasiador, mas como um homem de responsabilidade e experiência, examinando as circunstâncias particulares do caso e decidindo com fundamento e moderação. Arbítrio prudente e moderado não é o mesmo que arbitrariedade. (Oliveira Deda, Enciclopédia Saraiva, cit., v. 22, p.290)". (Dano moral. - ed. Oliveira Mendes - 1ª ed. - 1998, p.46).



Embora inexista orientação uniforme e objetiva na doutrina ou na jurisprudência de nossos tribunais para a fixação dos danos morais, é ponto pacífico que o Juiz deve sempre observar as circunstâncias fáticas do caso examinado, exaltando sempre a gravidade objetiva do dano, seu efeito lesivo, a natureza e a extensão do dano, as condições sócio-econômicas da vítima e do ofensor, visando com isto que não haja enriquecimento do ofendido e que a indenização represente um desestímulo a novas agressões.



Desta forma, levando-se em consideração todos os parâmetros mencionados, especialmente as circunstâncias do fato, as condições econômico-financeiras das partes, a gravidade objetiva do dano e a extensão de seu efeito lesivo, aliados à necessidade de se fixar uma indenização que não constitua enriquecimento da parte autora, mas que configure desestímulo de novas agressões, bem como a vedação do art. 7º, IV, da CF/88, entendo que a verba indenizatória fixada na sentença no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) se amoldou ao caso em julgamento.

Pelo exposto, reiterando vênia ao conspícuo Relator, NEGO PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS.

Custas recursais na proporção de 50% para cada recorrente, suspensa a exigibilidade da parte que litiga sob os auspícios da gratuidade judiciária.



DES. ESTEVÃO LUCCHESI

V O T O

Peço vênia ao relator, para acompanhar integralmente o voto do revisor, em sintonia com o entendimento de ser cabível danos morais na espécie.



NEGARAM PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS, VENCIDO PARCIALMENTE O RELATOR.


Fonte: TJMG