O Brasil, por meio do Decreto nº 3.597 de 2000, promulgou a Convenção
nº 182 e a Recomendação nº 190, ambas da Organização Internacional do
Trabalho, que versam sobre a "Proibição das Piores Formas de Trabalho
Infantil e a Ação Imediata para sua Eliminação". Dessa forma, o nosso
país assumiu perante a comunidade internacional o compromisso de
assegurar, de forma imediata e eficaz, a proibição e eliminação do
trabalho infantil.
Procurando fazer cumprir esse compromisso, o
Ministério Público do Trabalho (PRT 3ª Região), pela Procuradoria do
Trabalho do Município de Uberlândia, ajuizou ação civil pública, com
pedido de tutela antecipada, contra o Município de Ituiutaba e o
Conselho Comunitário de Segurança Preventiva de Ituiutaba - CONSEPI, uma
vez que ficou constatado o trabalho de adolescentes, com idade entre
quinze e dezoito anos, no Projeto Zona Azul, em locais e serviços
insalubres ou perigosos, conforme lista contida no Decreto nº
6.481/2008, que descreve as piores formas de trabalho infantil. O MPT
requereu a condenação dos reclamados, de forma solidária, ao pagamento
de danos morais coletivos, além da antecipação dos efeitos da tutela,
para fazer cessar, imediatamente, o trabalho dos menores no Projeto Zona
Azul.
Em defesa, tanto o Município quanto o CONSEPI destacaram a
importância do Projeto Zona Azul e os vários desdobramentos que são
realizados com os jovens participantes e suas famílias, enfatizando o
caráter social para a formação profissional dos menores e refutando a
alegação de que eles trabalhariam sob condições insalubres ou perigosas.
Sustentaram inexistir qualquer dano a eles ou à coletividade.
Para
entender o caso: o Município de Ituiutaba, através da Lei nº
3.336/1999, criou o estacionamento rotativo nas ruas centrais da cidade,
denominado Zona Azul. Para a implementação desta Lei, instituiu o
Projeto Zona Azul em novembro de 1999, por meio do qual, adolescentes
entre dezesseis e dezoito anos, são selecionados para executar as
atividades de fiscalização do uso correto da área de estacionamento
rotativo, que incluem a abordagem de motoristas e a venda de cartões,
com o consequente acerto das vendas ao final do expediente. O CONSEPI
destacou a importância educativa do projeto para os menores que, após
deixarem o Projeto Zona Azul, passariam a ter mais vivência social,
oportunidades de estudos e de empregos.
Mas, para a juíza Tânia
Mara Guimarães Pena, que analisou o caso na 1ª Vara do Trabalho de
Ituiutaba, a prova produzida no processo não indica a existência de
qualquer procedimento voltado para a conscientização dos motoristas ou
sobre a importância educativa para os menores. Também não se verificaram
outras ações voltadas a incrementar os estudos ou facilitar a
acessibilidade dos adolescentes ao mercado de trabalho após a saída do
Projeto Zona Azul.
A magistrada destacou que o artigo 227 da
Constituição Federal incorporou o princípio da proteção integral do
menor, enumerando os direitos assegurados à criança e ao adolescente. E
essa proteção especial abrange a observância da idade mínima para o
trabalho. Já o Estatuto da Criança e do Adolescente admite duas
hipóteses de trabalho lícito do menor: na condição de menor aprendiz ou
como menor educando.
No entendimento da juíza, o trabalho dos menores no
Projeto Zona Azul não se enquadra em nenhum dos dois casos, seja porque
eles têm idade superior a quatorze anos ou porque não lhes é dada
formação técnico-profissional, de acordo com as diretrizes e bases da
legislação educacional em vigor. A julgadora também não vislumbrou no
Projeto qualquer capacitação para o exercício de atividade regular
remunerada, além do que, muitas das atividades relacionadas pelos réus,
como reuniões socioeducativas e atendimento especializado, não foram
demonstrados em Juízo.
Diante desse quadro, a magistrada concluiu
que o trabalho realizado pelos adolescentes nas nas vias e logradouros
públicos pelo Projeto Zona Azul está entre as piores formas de trabalho
infantil descritas na lista TIP do Decreto nº 6.481/2008, que
regulamentou os artigos 3º, alínea 'd', e 4º da Convenção nº 182 da OIT.
Com esse entendimento, julgou procedentes em parte os pedidos e
condenou, solidariamente, os reclamados a se absterem de submeter a
trabalho crianças e adolescentes com idade inferior a dezesseis anos de
idade.
A decisão proíbe ainda a utilização do trabalho de menores de 18
anos em atividades nas vias e logradouros públicos, especialmente no
controle de estacionamento na área azul, ou em quaisquer outras
atividades proibidas na legislação vigente, perigosas, insalubres ou
penosas. Foi fixada multa de cinco mil reais por criança ou adolescente
encontrados em situação irregular, para o caso de descumprimento da
decisão. Por fim, os réus foram condenados ao pagamento de indenização
por danos morais coletivos, no valor de 20 mil reais. A decisão foi
mantida pelo TRT-MG em grau de recurso.
Fonte: TRT/MG