Elas estão onde menos imaginamos: nos elevadores, escadas, halls,
lojas, empresas e até nas ruas a céu aberto. Em geral ocultas, as
câmeras nos observam e vigiam nossos passos por onde andamos, como se
vivêssemos um verdadeiro "Big Brother" em tempo integral. E, como tudo
tem dois lados, isso pode ser bom e ruim: ruim, porque muitas vezes
somos invadidos em nossa privacidade; bom, porque as imagens gravadas
podem ajudar a esclarecer situações conflituosas que, antes, ficariam só
nas palavras e versões dos envolvidos.
Nos conflitos trazidos à
apreciação da Justiça, é essencial que a parte faça prova de suas
alegações para conseguir o fim pretendido. É aí que entra a força e
importância dessas gravações obtidas por câmaras de segurança, ou mesmo
por celulares de curiosos ou interessados que, sempre à mão, são bem
úteis para registrar acontecimentos considerados relevantes. Esse
material ajuda a trazer à tona a verdade real para o julgador.
E
as câmeras foram cruciais para a solução de um caso analisado pela
juíza Keyla de Oliveira Toledo e Veiga, em sua atuação na da 3ª Vara do
Trabalho de Juiz de Fora. Ao examinar as gravações feitas pelas câmaras
de segurança da empresa e de celulares de alguns empregados, a juíza
pôde ver, com os próprios olhos, uma briga entre a reclamante e sua
colega de trabalho. E, pelas imagens, ela viu claramente que as
agressões à reclamante se iniciaram dentro da empresa e continuaram do
lado de fora, sem que os seguranças, que a tudo assistiam, agissem para
apartar a briga. Diante disso, a magistrada entendeu ser evidente o
despreparo dos profissionais de segurança da empresa para controlar a
situação e concluiu que a ré descumpriu sua obrigação de fornecer aos
empregados um ambiente de trabalho seguro e sadio. Por essa razão,
condenou a empresa a pagar indenização por danos morais à empregada
agredida.
No caso, a empregada afirmou que, em certo dia, quando
se preparava para iniciar o serviço, foi verbal e fisicamente agredida
por uma colega de trabalho, situação que teve início dentro da empresa e
continuou fora dela. Disse que, sem qualquer razão, essa pessoa a
arrastou com violência para o exterior do prédio e, embora tenha pedido
ajuda aos seguranças da empresa, eles nada fizeram. Acrescentou que a
"cena" foi filmada por vários colegas e também pelas câmeras de
segurança internas da empresa. Ela disse que precisou fazer tratamento
psicológico em decorrência do trauma que sofreu e, por isso, pediu uma
compensação financeira pelos danos morais sofridos.
No processo, a
juíza teve acesso às filmagens internas da empresa no dia do fato, sem
áudio, assim como gravações feitas por colegas da reclamante através de
celular, com áudio, que mostraram o momento em que a reclamante e a
outra empregada se aproximaram da catraca eletrônica na saída da
empresa, vindo de dentro do prédio. A colega empurrava a reclamante,
dizendo-lhe para sair que elas iriam "resolver lá fora". Pelas imagens,
ficou clara a alteração de ânimos e o conflito que se dava entre as
duas. Além disso, as imagens mostraram os seguranças se aproximando e se
comunicando no rádio e, após a saída das duas empregadas da empresa, a
câmera captou ainda que um segurança permaneceu próximo a porta,
testemunhando os desdobramentos do fato. Essas cenas foram
minuciosamente examinadas pela magistrada.
Logo de início, a
julgadora afastou a alegação da empresa de que a atitude da agressora
para com a reclamante "deveria ter um motivo". "A Constituição
Federal nos garante a presunção de inocência, não servindo de
argumentação jurídica a distorcida lógica de que se a autora foi
agredida, alguma razão para tal teve a agressora. A narrativa da
empregadora vai contra os princípios basilares do nosso Estado
Democrático de Direito.", destacou. E, para a magistrada, apesar de
não esclarecidas as motivações das agressões havidas entre as
funcionárias, nem mesmo como ela se iniciou, a prova produzida deixou
evidente a negligência da ré em face dos acontecimentos, pois os
profissionais de segurança da empresa nada fizeram para impedir que as
duas colaboradoras deixassem a sede da empresa aos empurrões.
De
acordo com a juíza, a situação ficou bem clara: as empregadas estavam se
desentendendo, já havendo contato físico e violência. E os seguranças
se mostraram absolutamente despreparados, não apartando o embate e não
impedindo a saída das duas da empresa. Além disso, a julgadora observou
que a reclamante teve uma conduta mais apática, sem revidar os empurrões
da colega, levando a crer que quem partiu para a agressão e pretendia o
confronto físico era a outra.
Nos termos do art. 7º, XXII da
Constituição Federal, é obrigação do empregador propiciar ambiente
harmônico e sadio, condizente com o espaço e a importância que o
trabalho tem na vida das pessoas, frisou a juíza, acrescentando que o
ambiente de trabalho possui proteção constitucional no artigo 200, VIII,
da CF/88. Assim, independente dos acontecimentos anteriores aos
filmados no saguão da empresa, na visão da julgadora, a negligência e o
despreparo dos profissionais de segurança em conter a situação
conflituosa atrai a responsabilização subjetiva da empresa, pois é dever
do empregador zelar pela integridade física e psíquica de seus
funcionários durante a jornada de trabalho.
Nesse quadro, a
magistrada concluiu serem presumidos os prejuízos morais causados à
trabalhadora pela inércia da empresa, surgindo a obrigação de indenizar,
nos termos do artigo 7o, inciso XXVIII, da Constituição e dos artigos
186 e 927 do Código Civil Brasileiro. A empresa foi condenada a pagar à
reclamante indenização no valor de R$5.000,00. Houve recurso da empresa
que se encontra em trâmite no TRT/MG.
Fonte: TRT/MG