Em decisão inédita, a 4ª Turma do TRT-MG confirmou a sentença que
declarou o vínculo de emprego entre uma estagiária de Direito e o
escritório de advocacia onde ela trabalhava. O fato de se tratar de
estágio não foi considerado impedimento à relação de emprego, uma vez
que a reclamante já era bacharel em Direito. Ou seja, havia a
formalização de um contrato de estágio, mas o fato de ela já ser
graduada (apenas não tinha ainda a carteira da Ordem dos Advogados)
torna inviável esse tipo de contrato. E os julgadores constataram que a
relação entre as partes se deu com todos os pressupostos do vínculo de
emprego, previstos no artigo 3º da CLT.
A reclamante se formou em
Direito no segundo semestre de 2010 e iniciou o estágio no escritório
réu em 01/06/11, onde ficou até 23/07/12. Ao analisar o recurso do
escritório, juiz convocado Oswaldo Tadeu Barbosa Guedes esclareceu que
existem duas normas que tratam de estágio: a Lei 11.788/08, que dispõe
sobre o estágio de estudantes em geral (lei geral do estágio) e a do
artigo 9º da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados
do Brasil), que regula o estágio profissional dos estudantes e
bacharéis em Direito. Enquanto a última é uma norma específica, a
primeira tem caráter de norma geral, sendo aplicável aos estudantes de
qualquer curso.
Na visão do magistrado, a Lei 11.788/08 não
revogou o artigo 9º da Lei 8.906/94, que traça os requisitos para a
caracterização do estágio profissional no ramo de direito. Tanto isso é
verdade que a Lei 8.906/94 não se encontra no rol das normas
expressamente mencionadas como revogadas no artigo 22 da Lei 11.788/08. O
juiz convocado destacou que as disposições da lei geral podem ser
aplicadas em caso de omissão desta e quando não haja incompatibilidade
entre os dois regramentos.
Para o relator, o caso do processo é de estágio profissional do bacharel em Direito, não se tratando de estudante de Direito. "O
estágio profissional do bacharel em Direito se trata de uma situação
sui generis, eis que não se está diante do estágio típico do estudante
de Direito, e sim do estágio de quem já se graduou em Direito",
registrou. Por isso mesmo, condições para validade do estágio, tais como
existência de convênio/termo de compromisso entre o escritório,
reclamante e instituição de ensino, dentre outras, não são exigidas.
Ele
lembrou que o parágrafo 4º do artigo 9º da Lei 8.906/94 permite o
estágio profissional do bacharel em Direito, que queira se inscrever na
Ordem dos Advogados. Essa forma de estágio destina-se a quem já se
graduou em Direito, mas ainda não se submeteu ao exame de ordem da OAB. "O
bacharel é aquele que já se graduou em Direito, mas ainda não foi
aprovado no exame de ordem da OAB, ou seja, embora não esteja mais
vinculado, como aluno, a uma faculdade ou instituição oficial de ensino,
não pode ainda atuar como advogado profissional" destacou a decisão.
Conforme ponderou o relator, o profissional permanece, por assim dizer, em uma "espécie de limbo profissional".
É que ele ainda não pode exercer a atividade de advogado, embora já
esteja diplomado. A situação é diferente da do estudante de Direito, que
ainda não obteve o diploma. Na avaliação do julgador, a intenção da lei
foi proporcionar ao bacharel em Direito a oportunidade de continuar a
manter contato com o mundo jurídico e com a rotina dos escritórios de
advocacia. "O estágio profissional seria uma preparação ou treinamento
para o bacharel em Direito exercer a atividade de advogado, quando
aprovado no exame da OAB, propiciando-se ao futuro advogado a prática de
atividades compatíveis com o ramo profissional no qual se graduou, para
que se mantenha em atividade e atualizado em relação à legislação;
doutrina e jurisprudência", explicou no voto.
Mas nem por isso o
vínculo de emprego deixa de existir. É que, segundo a decisão, em
momento nenhum a Lei 8.906/94 diz que o estágio profissional do bacharel
em Direito não caracteriza vínculo de emprego nos moldes da CLT. Para o
julgador, o disposto no artigo 3º, caput, da Lei 11.788/08 (pelo qual, o
estágio não cria vínculo empregatício de qualquer espécie) não se
aplica de forma subsidiária no caso de bacharel de Direito. Este artigo
se refere apenas aos casos de estágio obrigatório e não-obrigatório de
estudante. "Ora, o caso dos autos não se trata de estágio de
estudante, e sim de estágio de bacharel em Direito, já graduado, o que
afasta a aplicação do aludido artigo, levando à inexorável conclusão de
que o estágio do bacharel é prestado em caráter profissional, ocorrendo,
portanto, o vínculo de emprego", concluiu o relator.
O
próprio parecer jurídico trazido pelo reclamado reforçou essa conclusão.
A peça foi elaborada pelo advogado Estevão Mallet, a pedido da OAB-SP,
concluindo que o 'estágio profissional de advocacia', prestado pelo
bacharel, caracteriza relação de emprego, quando presentes os requisitos
dos artigos 2º e 3º da CLT, já que não irá incidir a excludente da Lei
11.788/08.
No modo de entender do relator, este é exatamente o
caso da reclamante. Assim como o juiz de 1º Grau, ele não teve dúvidas
de que os pressupostos da relação de emprego se fizeram presentes no
caso: a não-eventualidade; a subordinação jurídica; a pessoalidade e a
onerosidade na prestação de serviços. O julgador notou, ainda, que o
próprio reclamado reconheceu que a inscrição de estagiária da reclamante
foi cancelada em 14/05/2012. Para ele, isso evidencia ainda mais o
vínculo de emprego, na medida em que a reclamante continuou a prestar
serviços para a reclamada até 23/07/2012, sem inscrição de estagiária.
Por
todos esses motivos, a Turma de julgadores considerou correto o
reconhecimento do vínculo de emprego por todo o período de prestação de
serviços. A decisão ainda manteve o entendimento de que a dispensa
ocorreu sem justa causa em 23/07/12, o que foi presumido verdadeiro, nos
termos da Súmula 212 do TST.
Fonte: TRT/MG