O estagiário é um trabalhador intelectual que reúne elementos
fáticos-jurídicos inerentes à relação de emprego. Porém, em razão de
objetivos pedagógicos e educacionais, o ordenamento jurídico nega o
caráter empregatício ao contrato de estágio. Para que ele prevaleça, é
imprescindível que permita ganho educacional e profissional específico
para o estudante trabalhador, compatível com a escolaridade formal
deste. Assim, a extrapolação das atividades previstas no contrato de
estágio e o exercício de atividades que escapem aos específicos
objetivos do contrato em questão são suficientes para desvirtuá-lo e
caracterizar a relação de emprego.
Recentemente, a 7ª Turma do
TRT de Minas apreciou um caso envolvendo essa questão, e manteve a
decisão de 1º Grau que declarou a nulidade do contrato na modalidade de
estágio e reconheceu a existência da relação de emprego entre as partes
Segundo
explicou o desembargador Fernando Luiz Rios Neto, relator do recurso, a
Lei 11.788/08, que revogou a Lei 6.494/77, fixa requisitos específicos à
configuração do contrato de estágio, sob pena de caracterizar-se o
vínculo empregatício. "A caracterização legal do contrato de estágio
pressupõe a presença de requisitos formais e materiais inerentes a essa
modalidade de trabalho em complementação do ensino. Para que se cumpram
os requisitos materiais, torna-se necessário que o estágio ocorra em
unidades que tenham condições reais de proporcionar experiência prática
de formação profissional ao estudante, complementando o ensino e a
aprendizagem. Se as atividades desenvolvidas no estágio são
incompatíveis com a programação curricular estabelecida para o curso, o
contrato é nulo na modalidade em que celebrado e o trabalhador faz jus
ao reconhecimento da relação de emprego com a parte concedente do
estágio e beneficiária do trabalho", destacou.
No caso
analisado, a autora postulou o reconhecimento do vínculo de emprego,
argumentando ter sido admitida como estagiária de direito pela
universidade onde estudava e, um mês após sua admissão no suposto
estágio, foi encaminhada ao setor de Telemarketing. Lá ela passou a
atuar no atendimento de clientes e alunos da instituição de ensino,
desempenhando atividades que não guardavam qualquer relação com o curso,
percebendo como contraprestação pelos serviços prestados a isenção da
mensalidade do curso, no valor de R$450,00 mensais e jornada de oito
horas, tendo o contrato ultrapassado o período de dois anos.
Embora
a instituição de ensino tenha alegado que não houve desvirtuamento das
atividades desempenhadas pela autora como estagiária, afirmando que as
funções exercidas contribuíam para o seu crescimento profissional e suas
atividades eram conexas com o curso frequentado, não foi o que restou
demonstrado nos autos.
Ao contrário, o relator constatou,
mediante a análise do conjunto probatório que, de fato, houve
desvirtuamento do contrato de estágio. Segundo observou, as atividades
desempenhadas não possuíam qualquer relação com o programa curricular do
curso de Direito, já que consistiam em efetuar cadastro dos alunos no
sistema, contactá-los e resolver questões referentes à matrícula, além
de fiscalizar provas de vestibular.
"Em outras palavras,
apesar de ter existido, formalmente, um contrato de estágio entre as
partes, o fato é que a reclamante, na maior parte do tempo, não atuou
como efetiva estagiária, mas sim como empregada da ré, exercendo funções
ligadas a questões administrativas da universidade, no setor de
telemarketing, sem qualquer ligação com o curso frequentado",
concluiu o relator, frisando que não teve dúvidas quanto à nulidade do
contrato de estágio, o que leva ao reconhecimento do vínculo de emprego
entre as partes, conforme definido em sentença.
O entendimento foi acompanhado pelos demais julgadores da Turma.