“O Poder Judiciário não pode ser utilizado como mero cartório que
incluirá, em documentos submetidos à sua sumária avaliação, um mero
selo, que sequer pode ser chamado selo de qualidade, porque não é
submetido, do ponto de vista substancial, a seu controle efetivo.” Esse
entendimento da ministra Nancy Andrighi embasou decisão da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou homologação de
acordo extrajudicial, por falta de interesse das partes.
Para a
relatora, não há utilidade em homologar judicialmente um acordo
extrajudicial, em que partes capazes transigem sobre direitos
disponíveis, com assistência de seus advogados, por meio de instrumento
particular, na presença de duas testemunhas.
Desjudicialização
“Admitir
que acordos extrajudiciais se transformem em títulos executivos
judiciais, tal qual pretendido, seria imaginar uma atividade cognitiva
judicial que efetivamente não ocorreu”, acrescentou a ministra.
Para
ela, esses acordos devem ser negociados fora do processo, com a
participação dos advogados, figuras indispensáveis para a administração
da Justiça. Mas não se deve envolver o Judiciário nesses procedimentos.
Segundo
a relatora, há um processo legislativo de democratização do direito,
evidenciando uma tendência à "desjudicialização dos conflitos" e
valorização das negociações extrajudiciais, com o afastamento da
autoridade judiciária do papel de mera chanceladora.
475-N
A
ministra esclareceu ainda que o dispositivo processual que permite a
homologação judicial de transação extrajudicial exige a existência de
uma lide submetida previamente à jurisdição. Ou seja, o acordo poderia
abarcar conteúdo mais amplo que o da lide em trâmite, devendo ser,
então, homologado.
Esse dispositivo do Código de Processo Civil
(CPC), o artigo 475-N, teria suplantado na legislação processual geral o
artigo 57 da Lei 9.099/95, dos juizados especiais cíveis.
“As
normas processuais têm sido criadas para possibilitar o melhor
desenvolvimento dos processos, num ambiente fluido no qual as partes
tenham a possibilidade de postular e receber sua resposta do estado de
forma rápida e justa”, afirmou a ministra.
Nesta hipótese, porém,
“não há qualquer lide subjacente a exigir a propositura de uma atuação
judicial, tampouco se está diante de uma hipótese de jurisdição
voluntária, em que a lei obriga as partes a buscar o Judiciário como
condição para o exercício de um direito”, completou a relatora.
“O
acordo aqui discutido, substancialmente, é uma transação extrajudicial,
e já está dotado de sua eficácia específica de título executivo
extrajudicial. Não se pode admitir que as partes tenham interesse
jurídico em transformar algo que substancialmente está correto, em algo
fictício, em algo que, do ponto de vista da moral e do direito, não
encontra fundamento de validade”, concluiu a ministra.
Fonte: STJ