quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Indenização por atraso na entrega do imóvel

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - APELAÇÃO - AÇÃO ORDINÁRIA - CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL PELA PROMITENTE VENDEDORA - INOCORRÊNCIA DE FORTUITO EXTERNO OU FORÇA MAIOR - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DE INDENIZAR - CARACTERIZAÇÃO - ART. 14 DO CDC - DANOS MORAIS EM FAVOR DOS PROMISSÁRIOS COMPRADORES - CONFIGURAÇÃO - QUANTUM INDENIZATÓRIO - CIRCUNSTÂNCIAS - RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - MAJORAÇÃO - POSSIBILIDADE - RECURSO PRINCIPAL NÃO PROVIDO E RECURSO ADESIVO PROVIDO.

- Os promissários compradores que não recebem o imóvel adquirido na planta, no prazo previsto no contrato, inexistindo prova nos autos que demonstre fortuito externo ou força maior, sofrem danos morais que devem ser indenizados pela promitente vendedora, cuja responsabilidade civil contratual é objetiva, a teor do art. 14 do CDC, haja vista a situação de angústia e frustração de legítima expectativa ao direito de moradia própria experimentada.

- A fixação do valor da indenização por danos morais deve se dar com prudente arbítrio, observadas as circunstâncias do caso, a razoabilidade e a proporcionalidade.

- Deve ser majorada a indenização moral, se arbitrada em valor reduzido, considerando o caso dos autos.

- Recurso principal não provido e recurso adesivo provido.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.10.279962-4/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): CONSTRUTORA TENDA S/A - APTE(S) ADESIV: EDMEIA ALMEIDA SILVA E OUTRO(A)(S), MARCOS VINÍCIUS RODRIGUES - APELADO(A)(S): CONSTRUTORA TENDA S/A, MARCOS VINÍCIUS RODRIGUES, EDMEIA ALMEIDA SILVA

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO PRINCIPAL E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO.

DESA. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO

RELATORA.

DESA. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO (RELATORA)



VOTO DA RELATORA

RELATÓRIO:

Cuida-se a espécie de recursos de apelação, principal e adesivo, interpostos em razão da r. sentença de fl. 143/150, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 27ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, nos autos da ação ordinária proposta por Edméia Almeida Silva e Marcos Vinícius Rodrigues em desfavor de Construtora Tenda S/A, que julgou parcialmente procedente a pretensão inicial, para declarar rescindido o contrato de compromisso de compra e venda de imóvel celebrado entre as partes; condenar a ré a ressarcir aos autores a integralidade dos valores pagos pelo imóvel, acrescidos de correção monetária desde o momento de cada desembolso e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, condenando-a ainda ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 10.000,00, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora, a partir da sentença. Julgou improcedente o pedido de condenação da ré ao pagamento da pena convencional prevista no § 2º da cláusula 9ª do ajuste firmado entre as partes, ao fundamento de que a multa pelo atraso na conclusão da obra, apenas seria devida, caso os promissários compradores tivessem optado pela manutenção da avença.

Por considerar a mínima sucumbência dos autores, a ré foi responsabilizada pela integralidade do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação.

Foi interposto recurso de apelação pela ré, Construtora Tenda S/A (fl. 151/158), buscando o julgamento de improcedência do pedido indenizatório por danos morais, ao argumento de que o inadimplemento do contrato de promessa de compra e venda de imóvel pela vendedora, por si só, não gera responsabilização civil. Na eventualidade, pede que haja a redução do quantum fixado a título de dano extrapatrimonial.

Os apelados apresentaram contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso principal (fl. 166/178).

Por sua vez, os autores, Edméia Almeida Silva e Marcos Vinícius Rodrigues, aviaram recurso adesivo (fl. 179/193), em que pedem a majoração do valor da indenização moral, pois, segundo entendem, a quantia arbitrada pelo MM. Juiz está aquém dos parâmetros utilizados para casos como o dos autos.

Intimada, apresentou a ré contrarrazões (fl. 203/215), oportunidade em que refuta as alegações veiculadas pelos apelantes adesivos.

É o relatório.

Passo à análise conjunta dos recursos.

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Conheço dos recursos porque próprios, tempestivos, ressaltando que o apelo principal conta com regular preparo (fl. 159), estando os apelantes adesivos dispensados do recolhimento das custas, ante a concessão dos benefícios da justiça gratuita (fl. 56).

PRELIMINARES

Não há preliminares a serem analisadas nos recursos.

MÉRITO

Passo ao exame conjunto de ambas as apelações.

A Construtora ré apelou da sentença apenas na parte em que foi condenada a pagar aos autores, indenização por danos morais de R$ 10.000,00, em face do atraso na entrega de imóvel por eles adquirido na planta.

Examinando tudo o que dos autos consta, tenho que não lhe assiste razão. Vejamos.

O Código Civil determina que a responsabilidade civil de indenizar àquele que sofreu dano moral e material, quem praticou a conduta antijurídica e causou diretamente o prejuízo, conforme seus artigos 186 e 927, que dispõem:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."

"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem."

No dizer de Caio Mário da Silva Pereira, para a configuração da obrigação de indenizar por ato ilícito exige-se a presença de três elementos indispensáveis:

"a) em primeiro lugar, a verificação de uma conduta antijurídica, que abrange comportamento contrário a direito, por comissão ou por omissão, sem necessidade de indagar se houve ou não o propósito de malfazer; b) em segundo lugar, a existência de um dano, tomada a expressão no sentido de lesão a um bem jurídico, seja este de ordem material ou imaterial, de natureza patrimonial ou não patrimonial; c) e em terceiro lugar, o estabelecimento de um nexo de causalidade entre um e outro, de forma a precisar-se que o dano decorre da conduta antijurídica, ou, em termos negativos, que sem a verificação do comportamento contrário a direito não teria havido o atentado ao bem jurídico." (in "Instituições de Direito Civil", v. I, Introdução ao Direito Civil. Teoria Geral do Direito Civil, Rio de Janeiro: Forense. 2004. p.661).

Havendo relação de consumo, como no caso dos autos, a responsabilidade civil do fornecedor é de ordem objetiva, conforme art. 14 do CDC:

"Art. 14 - O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos."

Nesse sentido é a lição de Carlos Roberto Gonçalves:

"O Código de Defesa do Consumidor, atento a esses novos rumos da responsabilidade civil, também consagrou a responsabilidade objetiva do fornecedor, tendo em vista especialmente o fato de vivermos, hoje, em uma sociedade de produção e de consumo em massa, responsável pela despersonalização ou desindividualização das relações entre produtores, comerciantes e prestadores de serviços, em um pólo, e compradores e usuários do serviço, no outro. Em face dos grandes centros produtores, o comerciante perdeu a preeminência de sua função intermediadora.

No sistema codificado, tanto a responsabilidade pólo fato do produto ou serviço como a oriunda do vício do produto ou serviço são de natureza objetiva, prescindindo do elemento culpa a obrigação de indenizar atribuída ao fornecedor". (GONÇALVES, Carlos Roberto. In Responsabilidade Civil. 8a ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 389).

Os autores pleiteiam indenização por danos morais, por não terem recebido o imóvel adquirido através do contrato de compromisso de venda e compra de fl. 24/26, para nele residir com sua família, no tempo previsto no ajuste celebrado com a ré.

Pois bem. O contrato de fl. 24/26 e o instrumento 'condições gerais de contratação' de fl. 30/39 comprovam que as partes celebram contrato de promessa de compra e venda, em 31 de dezembro de 2007, no qual os autores figuraram como promissários compradores e a ré como promitente vendedora.

Constou do contrato:

"5) DATA PREVISTA PARA CONCLUSÃO DAS OBRAS E ENTREGA DA UNIDADE:

30 DE NOVEMBRO DE 2009 observando-se o disposto na cláusula 9 e seguintes deste instrumento." (f. 25).

"(VI) DA ENTREGA DO IMÓVEL

CLÁUSULA 9ª: - A unidade será entregue na data descrita no item 5 do Quadro de Resumo, e poderá ser antecipada, obervado o disposto nos parágrafos 6º e 7º desta cláusula. Ficará a entrega, entretanto, sujeita à tolerância de 180 (cento e oitenta) dias, contados do dia de sua expiração, e, além disso, na hipótese de ocorrência de caso fortuito ou de força maior, nos termos do Artigo 393 do Código Civil, fica pactuado que a TENDA não poderá ser responsabilizada por eventuais atrasos na entrega das unidades, cujo prazo ficará automaticamente prorrogado pelo mesmo número de dias em que permanecer o evento que lhes deu causa". (f. 32/verso).

Em nosso ordenamento jurídico pátrio impera o sistema legal do ônus da prova baseado nos ditames do art. 333 do CPC, que dispõe:

'Art. 333: O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito.'

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.'

Eis a propósito o ensinamento de Humberto Theodoro Júnior, em Curso de direito processual civil, 41. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, vol. I, p. 387/388:

'No processo civil, onde quase sempre predomina o princípio dispositivo, que entrega a sorte da causa à diligência ou interesse da parte, assume especial relevância a questão pertinente ao ônus da prova.

Esse ônus consiste na conduta pessoal exigida da parte para que a verdade dos fatos por ela arrolados seja admitida pelo juiz.

Não há dever de provar, nem à parte contrária assiste o direito de exigir a prova do adversário. Há um simples ônus, de modo que o litigante assume o risco de perder a causa se não provar os fatos dos quais depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional. Isto porque, segundo a máxima antiga, fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente.

No dizer de Kisch, o ônus da prova vem a ser, portanto, a necessidade de provar para vencer a causa, de sorte que nela se pode ver uma imposição e uma sanção de ordem processual.

O art. 333, fiel ao princípio dispositivo, reparte o ônus da prova entre os litigantes. (...)

Cada parte, portanto, tem o ônus de provar os pressupostos fáticos do direito que pretenda seja aplicado pelo juiz na solução do litígio.

Quando o réu contesta apenas negando o fato em que se baseia a pretensão do autor, todo o ônus probatório recai sobre este. Mesmo sem nenhuma iniciativa de prova, o réu ganhará a causa, se o autor não demonstrar a veracidade do fato constitutivo do seu pretenso direito. Actore non probante absolvitur réus.

Quando, todavia, o réu se defende através de defesa indireta, invocando fato capaz de alterar ou eliminar as conseqüências jurídicas daquele outro fato invocado pelo autor, a regra inverte-se. É que, ao se basear em fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito do autor, o réu implicitamente admitiu como verídico o fato básico da petição inicial, ou seja, aquele que causou o aparecimento do direito que, posteriormente, veio a sofrer as conseqüências do evento a que alude a contestação.

O fato constitutivo do direito do autor tornou-se, destarte, incontroverso, dispensando, por isso mesmo, a respectiva prova (art. 334, III).

A controvérsia deslocou-se para o fato trazido pela resposta do réu. A este, pois, tocará o ônus de prová-lo. (...)

Por outro lado, de quem quer que seja o onus probandi, a prova, para ser eficaz, há de apresentar-se como completa e convincente a respeito do fato de que deriva o direito discutido no processo. Falta de prova e prova incompleta equivalem-se, na sistemática processual do ônus da prova.'

No caso, pelas cláusulas contratuais, o imóvel deveria ter sido entregue em 30 de novembro de 2009, prazo que poderia ser prorrogado por 180 dias, findando em 30/05/2010, no máximo.

O valor parcial para a aquisição do imóvel foi pago pelos autores, como se vê dos documentos de fl. 41/43.

A própria apelante principal confessa que não entregou o imóvel aos autores na data prevista no contrato.

A causa de pedir, portanto, restou demonstrada, qual seja, a ausência de entrega do imóvel na data aprazada no contrato.

A ré/apelante principal, por sua vez, sustentou em sua contestação que só não entregou o imóvel na data prevista no contrato, pois "o atraso é esperado dentro do ramo da construção civil" (f. 64).

O fato desconstitutivo de direito alegado pela apelante principal, portanto, não foi suposto fortuito externo ou força maior, sendo certo que em audiência ela informou que não tinha provas a produzir (f. 140).

O fato alegado configura fortuito interno, que não a exime de responsabilidade, eis que aquele fato alegado é inerente à sua própria atividade de construção civil.

A apelante principal, portanto, confessa que a causa do atraso da entrega do imóvel é oriunda de problemas de construção.

Assim sendo, não há prova alguma nos autos que demonstre fortuito externo e que pudesse afastar a culpa da ré pelo atraso na entrega do imóvel.

A Constituição Federal de 1988 previu o direito de ressarcimento por dano moral, em seu art. 5º, V e X, dano cujo conceito doutrinário é o seguinte:

"São lesões sofridas pelas pessoas, físicas ou jurídicas, em certos aspectos da sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem. São aqueles que atingem a moralidade e a afetividade da pessoa, causando-lhes constrangimentos, vexames, dores, enfim, sentimentos e sensações negativas. Os danos morais atingem, pois, as esferas íntima e valorativa do lesado, enquanto os materiais constituem reflexos negativos no patrimônio alheio". (Carlos Alberto Bittar, "Reparação Civil por Danos Morais", in Tribuna da Magistratura, p. 33).

"O dano moral, salvo casos especiais, como o de inadimplemento contratual, por exemplo, em que se faz mister a prova da perturbação da esfera anímica do lesado, dispensa prova em concreto, pois se passa no interior da personalidade e existe in re ipsa. Trata-se de presunção absoluta. Desse modo, não precisa a mãe comprovar que sentiu a morte do filho; ou o agravado em sua honra demonstrar em juízo que sentiu a lesão (...)". (Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade Civil, Saraiva, 2003, pp. 552/553).

De fato, o STJ tem entendimento pacificado de que o simples descumprimento de contrato não enseja dano moral.

Nesse sentido:

"AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE COBRANÇA. DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE SEGURO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA. LUCROS CESSANTES. REEXAME DE PROVA. DESCABIMENTO. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. DANO MORAL. AFASTAMENTO. REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO.

I - (...).

II - (...).

III - Como regra, o descumprimento de contrato, pura e simples, não enseja reparação a título de dano moral.

IV - (...).

Agravo Regimental improvido." (AgRg no Ag 1271295/RJ, 3ª Turma/STJ, rel. Min. SIDNEI BENETI, j. 16/03/2010, DJe. 29/03/2010). - destaquei.

""o inadimplemento do contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao outro contratante - e normalmente o traz - trata-se, em princípio, do desconforto a que todos podem estar sujeitos, pela própria vida em sociedade. Com efeito, a dificuldade financeira, ou a quebra da expectativa de receber valores contratados, não tomam a dimensão de constranger a honra ou a intimidade, ressalvadas situações excepcionais' (REsp nº 202.564, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 01/10/2001)." (REsp 765.326/RJ, 4ª Turma/STJ, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 28/08/2007, DJ. 17/09/2007). - destaquei.

Contudo, tenho que no presente caso, não se trata de mero descumprimento do contrato.

Isso porque à propriedade, em nosso ordenamento jurídico, está atrelada uma função social, sendo comum o homem médio sonhar com a casa própria em um país em que poucos adquirem um imóvel para nele residir com sua família.

No caso, os autores celebraram o contrato em 31 de dezembro de 2007 (fl. 27), época em que tinham dois anos de casados, acreditando que receberiam o imóvel em 30 de novembro de 2009 onde viveriam com os três filhos da autora, considerando que todos moravam de favor na casa da mãe da autora, alegação não refutada pela ré.

Nesse caso, já passados quase três anos da data avençada para a entrega do imóvel, não se tendo notícia do cumprimento contratual por parte da ré, tenho que tamanho atraso não se trata de simples descumprimento do contrato, mas de grave ofensa à dignidade dos autores, que viram frustrado o seu direito à moradia própria.

Estão sem a moradia própria adquirida há anos, e também sem a quantia em dinheiro que pagaram à ré, com sério comprometimento de sua vida e dignidade.

Assim sendo, tenho que a apelante principal não tem razão ao negar o dano moral, não merecendo reforma a sentença neste ponto.

Nesse sentido, a jurisprudência do STJ:

"A inexecução de contrato de promessa de compra e venda de unidade habitacional, em virtude da ausência de construção do empreendimento imobiliário pela incorporadora, transcorridos 09 (nove) anos da data aprazada para a entrega, causa séria e fundada angústia no espírito do adquirente, não se tratando, portanto, de mero dissabor advindo de corriqueiro inadimplemento de cláusula contratual, ensejando, assim, o ressarcimento do dano moral. Precedentes." (REsp 830572/RJ, 4ª Turma/STJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17/05/2011, DJ. 26/05/2011). - destaquei.

"Civil. Recurso Especial. Ação de indenização por danos materiais e morais. Embargos de declaração. Omissão, contradição ou obscuridade. Não indicação. Súmula 284/STF. Inadimplemento de contrato de compra e venda de casa pré-fabricada. Ausência de mero inadimplemento contratual. Violação ao princípio da dignidade da pessoa humana. Danos morais. Ocorrência.

- A recorrente celebrou com a recorrida contrato de compra e venda de um "kit de casa de madeira", pagando-lhe à vista o valor acordado, sendo que, após alguns meses, pouco antes da data prevista para a entrega da casa, a recorrente foi informada, por terceiros, que a recorrida inadimpliu o contrato.

- Conquanto a jurisprudência do STJ seja no sentido de que o mero inadimplemento contratual não ocasiona danos morais, tal entendimento, todavia, deve ser excepcionado nas hipóteses em que da própria descrição das circunstâncias que perfazem o ilícito material é possível extrair consequências bastante sérias de cunho psicológico, que são resultado direto do inadimplemento culposo.

- No presente processo, o pedido de compensação por danos morais declinado pela recorrente não tem como causa o simples inadimplemento contratual, mas também do fato de a recorrida ter fechado suas instalações no local da contratação (Estado do Rio de Janeiro) sem lhe dar quaisquer explicações a respeito de seu novo endereço e/ou da não construção do imóvel.

- Essa particularidade é relevante, pois, após a recorrente ter frustrado o seu direito de moradia, pelo inadimplemento do contrato de compra e venda de casa pré-moldada, o descaso da recorrida agravou a situação de angústia da recorrente.

- A conduta da recorrida violou, portanto, o princípio da dignidade da pessoa humana, pois o direito de moradia, entre outros direitos sociais, visa à promoção de cada um dos componentes do Estado, com o insigne propósito instrumental de torná-los aptos de realizar os atributos de sua personalidade e afirmar a sua dignidade como pessoa humana.

- Diante dessas circunstâncias que evolveram o inadimplemento contratual, é de se reconhecer, excepcionalmente, a ocorrência de danos morais.

- Recurso especial conhecido e parcialmente provido." (REsp 1025665/RJ, 3ª Turma/STJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 23/03/2010, DJ. 09/04/2010). - destaquei.

Também nesse sentido, a jurisprudência deste eg. Tribunal:

"APELAÇÃO CÍVEL - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RESIDENCIAL - INADIMPLÊNCIA DA CONSTRUTORA - MULTA POR ATRASO - DANOS MATERIAIS - GASTOS COM ALUGUÉIS COMPROVADOS - FRUSTRAÇÃO NA AQUISIÇÃO DA CASA PRÓPRIA - DANOS MORAIS - CONFIGURAÇÃO.

I- É incontroversa a culpa da construtora pelo atraso na entrega do imóvel na data estipulada no contrato, não havendo nos autos elementos que demonstrem a configuração de qualquer outra hipótese ou circunstância que tenha ensejado a mudança do prazo estipulado.

II- Comprovados os danos materiais advindos do inadimplemento contratual (despesas com aluguel) deve o prejuízo ser ressarcido. III- A multa contratual também deve ser imposta à promitente vendedora, calculada na forma como estipulada, levando-se em consideração a prorrogação do prazo para a entrega do imóvel, na fixação do termo a quo de sua incidência.

IV- Impõe-se o pagamento de indenização por danos morais, a fim de se minimizar a lesão imaterial sofrida pelos consumidores, não pelo simples inadimplemento contratual por parte da construtora, mas por ter frustrado suas expectativas de adquirir sua casa própria, à vista de casamento já marcado.

V- Em se tratando de danos morais, a correção monetária e os juros de mora são devidos a partir do provimento que estipula a indenização, já considerada atualizada naquela data, mesmo porque até então não se tinha idéia de qual valor seria devido, para que sobre ele incidissem aqueles consectários legais." (AC 1.0024.10.150152-6/001, 18ª CCível/TJMG, rel. Des. João Câncio, j. 31/01/2012, DJ. 03/02/2012). - destaquei.

"AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS- CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - ATRASO NA ENTREGA - INOCORRÊNCIA DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR - RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA - CARACTERIZAÇÃO. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS NA INTEGRALIDADE- DANO MORAL DEVIDO.

- O caso fortuito e a força maior são acontecimentos maiores, que escapam do controle da vontade humana, sendo imprevisíveis e inevitáveis, não havendo que se falar em tais hipóteses se houve atraso da entrega de imóvel por parte da construtora decorrente de problemas na rede de esgoto do empreendimento, configurado o fortuito interno, ínsito às suas atividades.

- Tem o promissário-comprador direito à rescisão contratual por descumprimento das obrigações do promitente- vendedor, devendo ocorrer a devolução integral das parcelas pagas, de forma simples, se não restou delineada a existência de má-fé, bem como indenização pelos danos morais sofridos havendo a "quebra dos deveres anexos do contrato", a violação ao princípio da confiança." (AC 1.0024.08.192116-5/001, 17ª CCível/TJMG, rel. Des. Luciano Pinto, j. 17/12/2009, DJ. 22/01/2010). - destaquei.

Pela eventualidade, a ré pede no apelo principal, a redução do valor indenizatório fixado a título de danos morais. Por sua vez, os autores postulam a majoração da quantia arbitrada em primeiro grau, pois, segundo entendem, a quantia arbitrada pelo MM. Juiz está aquém dos parâmetros utilizados para casos como o dos autos.

É cediço que inexistem critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, sendo recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, atendendo ao caráter pedagógico da condenação, atendendo à teoria do desestímulo, segundo a qual o valor a ser ressarcido deve inibir o ofensor à prática semelhante, e atendendo às peculiaridades do caso concreto, tendo como pressuposto, o prudente arbítrio do julgador, que não deve se escusar em atentar para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de sorte a evitar o enriquecimento injustificado do ofendido.

Desse modo, a condenação não deve ser tão ínfima que não sirva de lição para quem a recebe - afinal, a indenização, não pode ser irrisória a ponto de não compensar a vítima pela ofensa, nem tampouco demasiada que possa proporcionar o enriquecimento sem causa de quem a recebe, sob pena de desvirtuamento do instituto do dano moral.

Com relação à fixação dos danos morais, Caio Mário da Silva Pereira leciona:

"O problema de sua reparação deve ser posto em termos de que a reparação do dano moral, a par do caráter punitivo imposto ao agente, tem de assumir sentido compensatório. Sem a noção de equivalência, que é própria da indenização do dano material, corresponderá à função compensatória pelo que tiver sofrido. Somente assumindo uma concepção desta ordem é que se compreenderá que o direito positivo estabelece o princípio da reparação do dano moral. A isso é de se acrescer que na reparação do dano moral insere-se uma atitude de solidariedade à vítima." (in Responsabilidade Civil, 6ª ed., Forense, 1995, p.60).

Ensina Maria Helena Diniz que, para o arbitramento da indenização moral, compete ao julgador observar que:

"Na quantificação do dano moral, o arbitramento deverá, portanto, ser feito com bom-senso e moderação (CC, art. 944), proporcionalmente ao grau de culpa, sendo caso de responsabilidade civil subjetiva, à gravidade da ofensa, ao nível socioeconômico do lesante, à realidade da vida e às particularidades do caso sub examine". (Curso de Direito Civil Brasileiro, Maria Helena Diniz. 7º volume, Editora Saraiva, 19ª Edição, pág. 104). - destaquei.

Sobre essa matéria, Humberto Theodoro Júnior observa que:

"nunca poderá, o juiz, arbitrar a indenização do dano moral, tomando por base tão somente o patrimônio do devedor. Sendo, a dor moral, insuscetível de uma equivalência com qualquer padrão financeiro, há uma universal recomendação, nos ensinamentos dos doutos e nos arestos dos tribunais, no sentido de que 'o montante da indenização será fixado eqüitativamente pelo Tribunal' (Código Civil Português, art. 496, inc. 3). Por isso, lembra, R. Limongi França, a advertência segundo a qual 'muito importante é o juiz na matéria, pois a equilibrada fixação do quantum da indenização muito depende de sua ponderação e critério' (Reparação do Dano Moral, RT 631/36)" (in Dano Moral, Ed. Oliveira Mendes, 1998, São Paulo, p. 44).

No STJ, a orientação é a de que o arbitramento se faça com observância do princípio da razoabilidade. Vejamos:

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE AMBAS AS PARTES. PRISÃO ILEGAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VALOR NÃO IRRISÓRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. VALOR EXORBITANTE. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRETENSÃO DE REEXAME DO MATERIAL FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 7/STJ. 1. (...). 2. O valor estabelecido pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto, tão somente nas hipóteses em que a condenação revelar-se irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso, em que o recorrente ficou preso, indevidamente, por oito anos. 3. (...). 4. No caso dos autos, o Tribunal a quo analisou os elementos fáticos para concluir que a verba honorária foi estimada com equilíbrio, inexistindo razões para sua majoração ou redução, situação que impede a revisão no Superior Tribunal de Justiça, em razão do óbice previsto na Súmula 7/STJ. Conforme se verifica do aresto, os honorários foram estipulados em valor fixo, mediante a análise do desempenho do patrono da parte.Agravos regimentais improvidos." (AgRg no AREsp 78967/GO, 2ª TURMA, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, data do julgamento 02/02/2012, DJe 09/02/2012).

"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. QUITAÇÃO DA DÍVIDA. MANUTENÇÃO DO NOME. DANO MORAL. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. RAZOABILIDADE DO QUANTUMINDENIZATÓRIO. QUESTÕES CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME. 1. (...). 2. O quantum indenizatório arbitrado a título de dano moral não é passível de ser revisto pelo STJ quando fixado com razoabilidade. 3. A via do recurso especial é imprópria ao exame de questões de natureza constitucional. 4. Agravo regimental desprovido." (AgRg no Ag 1234207/RO, 4ª TURMA, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, data do julgamento 10/05/2011, DJe 19/05/2011).

O art. 944 do CCB exige o critério da proporção no arbitramento da indenização:

"Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano."

No caso, analisando as circunstâncias do fato, as condições da ofensora, o elevado grau de culpabilidade da ré, os sérios efeitos lesivos da ofensa para os autores, como já exposto, e os parâmetros referidos, tenho que a indenização fixada na sentença, de R$10.000,00, deve ser majorada para o equivalente a 20 (vinte) salários mínimos, qual seja, R$ 12.440,00 (doze mil quatrocentos e quarenta reais).

Tal quantia é razoável e proporcional para compensar o tempo em que os autores ficaram privados de seu dinheiro e do imóvel, cuja aquisição não se efetivou, por ato culposo da ré, atendendo o disposto no art. 944 do CCB.

Por conseguinte, tenho que as razões recursais contidas no apelo adesivo merecem ser acolhidas.

DISPOSITIVO:

Isso posto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO PRINCIPAL E DOU PROVIMENTO AO ADESIVO, para majorar a indenização concedida em primeiro grau, a título de danos morais, para a quantia de R$ 12.440,00 (doze mil quatrocentos e quarenta reais) devendo incidir correção monetária da data da publicação do acórdão ( Súmula 362 do STJ), e juros de mora na forma fixada na sentença, não recorrida em tal ponto.

No mais, segue confirmada a sentença em todos os seus termos.

Custas recursais, pela apelante principal.


DES. LEITE PRAÇA (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. EVANDRO LOPES DA COSTA TEIXEIRA - De acordo com o(a) Relator(a).


SÚMULA: "RECURSO PRINCIPAL NÃO PROVIDO E RECURSO ADESIVO PROVIDO"

Fonte: TJMG