Muito se discute sobre a constitucionalidade do artigo 384 da CLT, o
qual prevê que, em caso de prorrogação do horário normal, a trabalhadora
terá direito a 15 minutos de intervalo antes de iniciar o período extra
de trabalho. O dispositivo causou polêmica após a entrada em vigor da
Constituição de 1988, que estabelece, em seu 5º, I, e 7º, XXX, a
igualdade e o tratamento isonômico entre homens e mulheres. Daí o
questionamento: se homens e mulheres são iguais em direitos e
obrigações, a previsão de um intervalo que beneficia apenas as mulheres
não seria inconstitucional?
Foi exatamente essa a questão
levantada pela JBS S.A, reclamada em uma ação trabalhista, que não se
conformou com a condenação ao pagamento de horas extras a uma
ex-empregada, por descumprimento do intervalo da mulher. O recurso foi
julgado pela 6ª Turma do TRT-MG, que rejeitou as alegações da empresa e
manteve a condenação.
Segundo fundamentou o desembargador Rogério Valle Ferreira, nada há de inconstitucional no dispositivo em questão.
"A norma de ordem pública inserta no artigo 384 da CLT tem por escopo a
proteção à saúde, segurança e higidez física da mulher. A mitigação de
direitos já alcançados, sob o manto da disposição contida no artigo 5º,
I, da Constituição da República não implica a busca da igualdade, na
medida em que essa só seria encontrada na ampliação do alcance das
normas a todos os trabalhadores", destacou.
O relator citou o entendimento nesse mesmo sentido que vem sendo adotado pelo TST:
"INTERVALO PARA DESCANSO. ART. 384 DA CLT. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO
DE 88. 1 - Conquanto homens e mulheres, à luz do inciso I, do art. 5º da
Constituição de 88, sejam iguais em direitos e obrigações, é forçoso
reconhecer que elas se distinguem dos homens, sobretudo em relação às
condições de trabalho, pela sua peculiar identidade bio-social. 2 -
Inspirada nela é que o legislador, no artigo 384 da CLT, concedeu às
mulheres, em caso de prorrogação do horário normal, um intervalo de
quinze minutos antes do início do período extraordinário do trabalho,
cujo sentido protetivo discernível na ratio legis afasta, a um só tempo,
a pretensa violação ao princípio da isonomia e a absurda ideia de
capitis deminutio em relação aos homens. Recurso provido" (TST - RR -
4506/2001-011-09-00 - 4ª Turma - Rel. Ministro Barros Levenhagen - DJ -
21.10.2005).
Também na doutrina é forte a corrente dos que
sustentam a constitucionalidade do artigo 384, como Mauricio Godinho
Delgado, Mozart Victor Russomano, Orlando Gomes e Elson Gottschalk,
citados pelo relator. Esses últimos destacam que "a maturidade
física e constituição fisiológica ou anatômica da trabalhadora são
fatores relevantes, que não podem ser desdenhados do ponto de vista da
disciplina jurídica da regulamentação das condições de trabalho no mundo
moderno. (...) Os biólogos e fisiologistas demonstram que a mulher, em
confronto com o homem, possui menor resistência a trabalhos extenuantes,
por isso recomendam especiais cautelas do ponto de vista físico e
espiritual" (Curso de Direito do Trabalho, 11ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1990, p. 467-468).
No mais, o Tribunal Pleno do TST,
ao julgar o IINRR-1540/2005-046-12-00.5, rejeitou o Incidente de
Inconstitucionalidade do artigo 384 da CLT, ao reconhecer as
especificidades físicas e a dupla jornada da mulher: "levando-se em
consideração a máxima albergada pelo princípio da isonomia, de tratar
desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades, ao ônus da
dupla missão, familiar e profissional, que desempenha a mulher
trabalhadora corresponde o bônus da jubilação antecipada e da concessão
de vantagens específicas, em função de suas circunstâncias próprias,
como é o caso do intervalo de 15 minutos antes de iniciar uma jornada
extraordinária, sendo de rejeitar a pretensa inconstitucionalidade do
art. 384 da CLT".
Por todos esses fundamentos, concluiu o
relator, não há que se falar em afronta ao princípio da isonomia
previsto no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal. Entendendo
comprovada a prestação habitual de horas extras pela reclamante, a Turma
manteve a sentença que deferiu a ela o recebimento, como extra, de 15
minutos por dia efetivo de trabalho.
Fonte: TRT/MG