segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Indenização por atraso na entrega de imóvel

EMENTA: RESCISÃO CONTRATUAL - ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL - CULPA EXCLUSIVA DA CONSTRUTORA - MULTA CONTRATUAL POR ATRASO NA ENTREGA - POSSIBILIDADE - DANOS MORAIS DEMONSTRADOS - RECURSO ADESIVO - MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS - SENTENÇA MANTIDA.

I - Demonstrado que o atraso por quase 07 (sete) anos na entrega do imóvel se deu por culpa exclusiva da construtora, é indiscutível a existência do dano moral ante a notória frustração da compradora.

II - A multa contratual estipulada por atraso na entrega do imóvel deve ser aplicada mesmo depois de haver sido declarado judicialmente rescindido o contrato celebrado.

III - A indenização pelos danos morais sofridos pela ofendida deve ser estabelecida em valor suficiente e adequado para a compensação dos prejuízos por ela experimentados e para desestimular a prática reiterada da conduta lesiva pelo ofensor, não se podendo prestar, entretanto, para o enriquecimento desproporcional daquela.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.10.175392-9/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): CONSTRUTORA TENDA S/A - APELANTE ADESIVO(A)(S): MARIA DIMAS MOREIRA ALVES - APELADO(S): OS APELANTES

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS, VENCIDO PARCIALMENTE O DES. RELATOR.

Belo Horizonte, 28 de agosto de 2012.

DES. CORRÊA CAMARGO

RELATOR.

DES. CORRÊA CAMARGO (RELATOR)

V O T O

Trata-se de apelação cível interposta por Construtora Tenda S/A, em razão da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 5ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte/MG, que, nos autos da "Ação de Rescisão Contratual c/c Indenização por Danos Materiais e Morais", ajuizada por Maria Dimas Moreira Alves, julgou parcialmente procedente a demanda, declarando nulo o contrato de promessa de contra e venda celebrado em 23/03/2006, rescindindo o contrato de contra e venda firmado em 07/08/2003 e condenando a construtora apelante a devolver, de forma simples, e em uma única parcela, a totalidade das quantias pagas pela apelada, corrigidas pela tabela do CTJMG, desde a data do seu desembolso até a efetiva devolução pela apelante, acrescidas de juros de mora de 1% ao mês, contados da citação da apelante. Condenou ainda a construtora ao pagamento de multa no importe de 0,5% ao mês, calculada sobre o valor já pago pela apelada, conforme o disposto na cláusula 14ª do contrato, a contar da data de 31/07/2005, época em que o imóvel deveria ter sido entregue, até a efetiva devolução dos valores pagos pela apelada, e ainda, a título de danos morais, condenou a construtora ao pagamento de R$15.000,00 (quinze mil reais), com a incidência de juros de mora e correção monetária a partir da sentença.

Nas razões de ff.97-110, insurge-se a construtora apelante, alegando, precipuamente, que a multa indenizatória, prevista na cláusula 14ª, somente é devida no caso de atraso na entrega e manutenção do contrato, sendo descabida sua imposição quando declarada a rescisão do contrato, pois não se trata de multa rescisória, mas de pena convencional em razão da demora na entrega do imóvel. Eventualmente, sustenta que o termo inicial e final para incidência da mencionada multa merecem alteração, pois há na referida cláusula previsão de atraso de 06 meses, de modo que a multa deveria fluir a partir de 31/01/2006, data em que expiraria o mencionado prazo de tolerância, e encerrar na data de ajuizamento da ação, eis que fora determinada a rescisão contratual. Por fim, sustentou, em síntese, não ser cabível indenização por danos morais por atraso na entrega do imóvel, e, na eventualidade de que este Tribunal entenda pela manutenção da indenização a título de danos morais, que esta seja reduzida, devendo nessa hipótese, os juros de mora e correção monetária serem contados a partir da sentença.

O recurso de foi recebido à f.113, em ambos os efeitos.

A seu turno, a apelada apresentou às ff. 114-117, em peça única, recurso adesivo e contrarrazões, requerendo a restituição em dobro dos valores pagos à construtora e a majoração da indenização por danos morais para o importe de R$25.500,00 (vinte e cindo mil e quinhentos reais), ao fundamento de que a entrega do imóvel teria atrasado 07 (sete) anos. Foi ainda pedida a majoração dos honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.

O recurso adesivo foi recebido à f. 118, em ambos os efeitos.

Foram acostadas às ff. 121-134, as contrarrazões ao recurso adesivo de apelação.

É o breve relatório.

Passa-se à decisão:



DO RECURSO PRINCIPAL:



Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade, passando à análise do mesmo.



I - DA MULTA PREVISTA NA CLÁUSULA 14ª, DO CONTRATO:



Insurge-se a construtora apelante contra a imposição da multa de 0,5% ao mês, calculada sobre os valores já pagos pela apelada, contados a partir de 31/07/2005 até a efetiva devolução destes à apelada, ao fundamento de que a referida sanção, prevista na cláusula 14ª, do contrato, somente é devida enquanto houver a manutenção do negocio jurídico e concomitante ocorrer atraso na entrega do imóvel. Assim, entende a apelante que com a declaração da rescisão contratual a referida cláusula passaria a ser inaplicável ao caso.

Eventualmente, na hipótese desta Câmara entender ser devida a aplicação da referida multa, que o seu marco inicial fosse considerado a partir de 31/01/2006, data em que expiraria o prazo de tolerância de 06 (seis) meses para entrega do imóvel, e que o marco final fosse a data de ajuizamento da ação, eis que determinada a rescisão contratual.

Entretanto, dispõe a referida cláusula contratual, in verbis:



CLÁUSULA DÉCIMA QUARTA: ENTREGA DO IMÓVEL

A unidade será entregue na data descrita no sub-item 1.4 da capa do contrato. A entrega da unidade poderá ser antecipada. Ficará, entretanto sujeita a uma tolerância de 120 (cento e vinte) dias úteis contados do dia de sua expiração para obras de arremate e, além disso, na hipótese de ocorrência de caso fortuito ou de força maior, nos termos do art.1.0508 do Código Civil, a Promitente Vendedora não poderá ser responsabilizada pelo atraso na entrega da unidade, ficando, esta, portanto, prorrogada pelo prazo o qual tenha perdurado o impedimento.

PARÁGRAFO PRIMEIRO: Se a Promitente Vendedora não concluir a obra no prazo fixado, após vencer o prazo acima avençado e não tendo ocorrido a prorrogação por motivo de força maior ou caso fortuito, pagará a Promitente Vendedora ao Promissário Comprador, a título de pena convencional a quantia que equivaler a 0,5% (meio por cento) do preço reajustado monetariamente da unidade, por mês ou por fração de mês de atraso, sendo exigível até a data da liberação do apartamento pela promitente vendedora.



Portanto, fora de fato pactuado uma tolerância de 120 dias úteis para a entrega do imóvel, com o fito de terminar as "obras de arremate", entretanto a mencionada regra contratual não traz qualquer estipulação ou condicionamento de que essa multa seja aplicável somente aos casos em que se tenha simultaneamente o atraso na entrega da obra e a manutenção do negócio jurídico celebrado entre as partes.

Ademais, a rescisão contratual não afasta as multas que dele decorrem, se a sua causa se deu no período de vigência do contrato, pelo que as cláusulas penais vão produzir os seus efeitos mesmo depois de rescindido o contrato.

Assim, a multa prevista por atraso na cláusula 14ª, §1º, do instrumento contratual em litígio, é medida que se impõe.

Em relação ao termo inicial e final para incidência da referida multa, tem-se que a prorrogação de 06 (seis) meses na 14ª cláusula do instrumento contratual, tem por objetivo a finalização de "obras de arremate".

Entretanto, as obras sequer começaram, restando evidente que construção não chegou à fase de "obras de arremate". Assim, não há que se conceder a tolerância de 06 meses para início da contagem de incidência da multa, porque esta só seria cabível se a construção do prédio já estivesse em sua etapa de arremate. Pelo que, a referida multa deverá incidir do dia em que a obra deveria ter sido concluída, ou seja, a partir de 31/07/2005.

Em relação ao termo final, tem-se que por previsão contratual seria o dia em que a construtora apelante entregaria o imóvel, ou seja, até o dia do adimplemento da obrigação assumida pela apelante. Assim, com a rescisão do contrato, o adimplemento da obrigação assumida pela construtora passa a ser o dia em que esta restituir os valores pagos pela apelada para aquisição do imóvel.



II - DA INEXISTÊNCIA DO DANO MORAL:



A construtora apelante aduz que o atraso na entrega do imóvel não enseja indenização por danos morais e eventualmente a sua redução, caso entenda-se pela manutenção da referida indenização, devendo nesta hipótese, os juros de mora e correção monetária ser contados a partir da sentença.

Como cediço, a indenização por dano moral tem merecido do Poder Judiciário a mais ampla interpretação, principalmente após a promulgação da Constituição da República/1988, sendo entendida como forma de compensação pela dor, sofrimento ou constrangimento injustamente sofridos pela vítima, que possam merecer correspondente economicamente apurável, além de punição para o ofensor, impedindo-lhe de repetir o ato ofensivo.

Dispõe o art. 186, do Código Civil:



"Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."



Em sendo assim, os danos morais surgem em decorrência de uma conduta ilícita por parte do agente responsável pelo dano, que venha a causar sentimento negativo a qualquer pessoa de comportamento e senso comuns, como vexame, constrangimento, humilhação, dor etc.

Na lição de Caio Mário da Silva Pereira, os elementos da responsabilidade civil são:



"a) em primeiro lugar, a verificação de uma conduta antijurídica, que abrange comportamento contrário a direito, por comissão ou por omissão, sem necessidade de indagar se houve ou não o propósito de mal fazer; b) em segundo lugar, a existência de um dano, tomada a expressão no sentido de lesão a um bem jurídico, seja este de ordem material ou imaterial, de natureza patrimonial ou não patrimonial; c) e em terceiro lugar, o estabelecimento de um nexo de causalidade entre um e outro, de forma a precisar-se que o dano decorre da conduta antijurídica, ou, em termos negativos, que sem a verificação do comportamento contrário a direito não teria havido o atentado ao bem jurídico." (in Instituições de Direito Civil, v. I, Introdução ao Direito Civil. Teoria Geral do Direito Civil, Rio de Janeiro: Forense. 2004. p.661"



Assim, para a sua ocorrência, há que se observar a presença de alguns pressupostos, quais sejam: a existência do dano, o nexo de causalidade entre a conduta ilícita e o resultado lesivo, e o elemento subjetivo, caracterizado pela existência de culpa ou dolo do agente, derivada de ato omissivo ou comissivo voluntário.

Pois bem, analisando os autos, verifica-se que a construtora apelante deixou de cumprir sua parte no negócio entabulado, pois não chegou sequer a iniciar as obras que deveriam ter sido concluídas em 31/07/2005.

Desta forma, incontroverso que a rescisão do contrato ocorreu por culpa exclusiva da apelante, que não entregou o imóvel prometido à venda no prazo consignado, extrapolando o prazo para entrega do mesmo em quase 07 (sete) anos.

Portanto, resta nítido o desgaste emocional da autora/apelada, que regularmente vinha pagando as parcelas do seu imóvel por mais de 10 (dez) anos sem ver sequer iniciada a sua construção.

Nesse diapasão, inconteste a presença dos requisitos ensejadores do dano moral, bem como o dever da construtora de indenizar a autora/apelada.

No que se refere ao quantum da indenização, será procedida análise conjunta com o recurso adesivo, uma vez versarem sobre o mesmo objeto.

Por sua vez, no que concerne ao pedido da construtora apelante, para que seja reformada a decisão de primeiro grau, para que a incidência de juros sobre a condenação por danos morais seja contada a partir da sentença, tenho por indeferi-lo na medida em que a sentença recorrida determinou em seu dispositivo que os juros de mora incidam a partir da decisão recorrida.



DO RECURSO ADESIVO:



Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade, passando à análise do mesmo.

A autora/apelante pretende em seu recurso adesivo a majoração da indenização sofrida a título de danos morais em razão do atraso na entrega do imóvel adquirido da construtora apelada, elevando-o para o importe de R$ R$25.500,00 (vinte e cindo mil e quinhentos reais), bem como a restituição dos valores já pagos em dobro e a majoração dos honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.

No tocante ao pedido de majoração do dano moral, tem-se que diante da inexistência de parâmetros estabelecidos por lei para a quantificação do dano moral, doutrina e jurisprudência vêm se manifestando no sentido de que a indenização deve ser fixada em valor suficiente a compensar o ofendido pelo prejuízo experimentado sem gerar enriquecimento indevido, desestimulando, por outro lado, a reiteração da conduta pelo ofensor, o que exige do magistrado a observância dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Por conseguinte, em consonância aos valores que vêm sendo fixados em ações desta natureza, o quantum a ser estabelecido deve atender ao princípio restitutio in integrum, pois a importância ressarcitiva deve mostrar-se compatível com a extensão do dano causado e, ainda, de modo especial, com o caráter pedagógico e sancionador da pena cominada, a fim de se evitar a repetição, no futuro, de infortúnios como o ocorrido na espécie.

Assim, observando que o atraso na entrega do imóvel prometido à venda foi de quase 07 (sete) anos, tenho por majorar o valor da indenização, estabelecido na instância primeva, para o patamar de R$25.500,00 (vinte e cinco mil, e quinhentos reais), quantum este que atende à reparação devida à autora/apelada, mas sem ensejar seu enriquecimento ilícito, bem como cumpre o cunho sancionador à construtora apelante.

Em relação à pretensão da autora/apelante para que a restituição dos valores por esta já pagos seja feita em dobro, tem-se que não restou demonstrado nos autos que o atraso na entrega do imóvel decorreu de ato praticado com má-fé.

Desta forma, as quantias a serem restituídas à autora/apelante deverão obedecer à forma simples.

Por derradeiro, em relação ao pedido de majoração dos honorários advocatícios, tem-se que analisando a complexidade da causa, o trabalho realizado pelos advogados e a duração do processo, hei por fixá-los em 15% por cento sobre o valor da condenação.





DA CONCLUSÃO:



Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO PRINCIPAL E DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO, para majorar a condenação a título de danos morais para o importe de R$25.500,00 (vinte e cinco mil, e quinhentos reais) e para fixar os honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação, mantendo-se no mais irretocada a sentença de primeiro grau.

Custas recursais pela apelante.

É como voto.



DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES (REVISOR)

V O T O

Com minhas escusas ao eminente Relator embora tenha o mesmo entendimento quanto exame do recurso principal, ouso dele discordar em relação ao recurso adesivo.

É que tenho que o valor de R$15.000,00, fixado na sentença a título de dano moral, atende ao caso em exame.

Em assim sendo, NEGO PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS.

DES. MOTA E SILVA

V O T O DO VOGAL

Acompanho o voto do relator, quanto a negar provimento ao recurso da Construtora. CONTUDO, quanto ao recurso adesivo, tenho comigo recente julgado do STJ, em caso idêntico a este em que a construtora atrasou a entrega da obra por mais de 10 (dez) anos (RESP. 617177), da 4ª Turma, Rel. Min. Luiz Felipe Salomão, citando inclusive julgamento anterior da lavra do Min. Aldir Passarinho Junior em que se estabeleceu o valor de R$ 18.000,00, também em virtude de atraso na obra por quase 10 (dez anos conforme fixado na sentença recorrida.(hhtp://www.stj. jus.br/portal/publicado em 3/5/2011).

Diante disso, considerando que o atraso na entrega da obra no presente caso durou menos de 07 (sete) anos, tenho que o valor fixado na sentença de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) deve ser mantido para manter coerência com os precedentes do STJ, nesses casos.

É COMO VOTO

DES. MOTA E SILVA

VOGAL

SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS, VENCIDO PARCIALMENTE O DES. RELATOR"