A auxiliar de cozinha procurou a Justiça do Trabalho, pedindo a
declaração da nulidade do seu pedido de demissão, porque feito sob
ameaça. Ela contou que estava levando restos de alimentos que não
poderiam mais ser utilizados no restaurante onde trabalhava, como
permitido pela empresa. Contudo, foi surpreendida pela revista da
sacola, quando a chefe "sugeriu" que ela redigisse, de próprio punho,
uma carta de demissão. Segundo alegou, se recusasse, seria dispensada
por justa causa, sob a acusação de prática de furto.
Na sentença,
a juíza reconheceu o vício na manifestação de vontade da reclamante e
invalidou o pedido de demissão. Com isso, a dispensa foi convertida para
sem justa causa. E a decisão foi mantida pela 6ª Turma do TRT-MG, que
julgou desfavoravelmente o recurso interposto pela empresa do ramo de
alimentação.
Mas, conforme observou o relator, juiz convocado
José Marlon de Freitas, o que invalida o ato de demissão não é apenas a
ausência da homologação sindical (já que a trabalhadora tinha mais de um
ano de casa). Esse foi o fundamento utilizado na decisão de 1º Grau,
diante da controvertida prova testemunhal, que não esclareceu se a
reclamante realmente foi coagida a se demitir. Mas, para o relator, o
problema é outro: a empresa agiu de forma arbitrária, levando a
empregada a pedir demissão.
É que a trabalhadora foi colocada em
suspeita, com revista na bolsa à procura de alimentos escondidos. Ocorre
que, conforme apurou o magistrado, a própria ré admite que sejam
levados os restos de comida que não são mais utilizados, além de carnes
embaladas e que não podem ser novamente congeladas. Na visão do
magistrado, ao permitir que alimentos sejam levados e, ao mesmo tempo,
que bolsas sejam fiscalizadas arbitrariamente, a empresa acaba dando
margem a situações excepcionais e desnecessárias, como a dos autos. Ele
alertou para a necessidade de o patrão adotar normas claras e
específicas a respeito da fiscalização, a fim de evitar abusos.
Para
o julgador, pouco importa se a reclamante foi ou não coagida, de forma
literal. O certo é que ela se viu acuada e compelida a pedir demissão,
não tendo chance de raciocinar sobre as consequências do ato. "A
empresa não pode criar esse clima e exigir pronta resposta do empregado,
vez que a simples menção de uma suposta dispensa por justa causa, por
roubo ou furto, aflige o trabalhador e o impulsiona a agir de forma não
intencional" , ponderou o juiz convocado.
Bom senso e
prevenção foram palavras lembradas no voto, para destacar que o
empregador poderia ter se valido de meios lícitos e não arbitrários para
apurar os fatos. Se, ao final, concluísse que a reclamante havia
praticado ato de improbidade, poderia tê-la dispensado por justa causa.
Para o julgador, é inaceitável que a própria empresa investigue eventual
prática de ato de improbidade, realizando vistoria em bolsas e retendo o
empregado em sala específica, na presença de superiores hierárquicos,
como revelado pela prova oral. Essa conduta é "desarrazoável e
arbitrária", destacou. Ainda segundo o magistrado, qualquer menção ou a
mera insinuação à possibilidade de justa causa por furto ou roubo
demonstra rigor excessivo no poder disciplinar do empregador.
Por
tudo isso, o relator concluiu que a reclamante não tinha alternativa a
não ser o desligamento da empresa, por demissão. Esse pedido não foi
feito espontaneamente, caracterizando-se o que se chama de "vício de
consentimento". Nesse contexto, a Turma de julgadores, por unanimidade,
manteve a conversão da dispensa para sem justa causa, condenando a
empresa do ramo de alimentação ao cumprimento dos deveres pertinentes.
Fonte: TRT/MG