quarta-feira, 3 de abril de 2013

Indenização por atraso na entrega do imóvel

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - ATRASO SIGNIFICATIVO NO INÍCIO DAS OBRAS E NA ENTREGA DO BEM - RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA RECONHECIDA - DANO MORAL CONFIGURADO - INDENIZAÇÃO - FIXAÇÃO EM QUANTIA RAZOÁVEL. O atraso injustificado e descomedido da construtora ré em dar início às obras de construção da unidade imobiliária adquirida pela parte autora, frustrando o cumprimento do contrato de promessa de compra e venda firmado entre as partes e, sobretudo, o sonho desta última de adquirir a sua própria residência, bem como causando-lhe imensuráveis transtornos que ultrapassaram, em muito, o mero dissabor, deixa patente a responsabilidade da empresa ré e a configuração de um verdadeiro dano moral suportado pelo requerente/contratante. A indenização deve ser fixada segundo critérios de razoabilidade e proporcionalidade, com observância das peculiaridades do caso e buscando sempre atingir os objetivos do instituto do dano moral, quais sejam, compensar a parte lesada pelos prejuízos vivenciados, punir o agente e inibi-lo na adoção de novas condutas ilícitas, sem jamais implicar no enriquecimento indevido do indenizado.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.09.572250-0/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): RONAN FERREIRA DA CONCEIÇÃO - APELADO(A)(S): CONSTRUTORA TENDA LTDA

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. ARNALDO MACIEL

RELATOR.

DES. ARNALDO MACIEL (RELATOR)

V O T O

Trata-se de recurso de apelação interposto por RONAN FERREIRA DA CONCEIÇÃO contra a sentença de fls. 332/334, proferida pelo MM. Juiz Richard Fernando da Silva, que julgou improcedente a Ação de Indenização por Danos Morais ajuizada em face da CONSTRUTORA TENDA LTDA, com fundamento na não configuração dos danos morais alegados pelo apelante, condenando-o no pagamento das custas e dos honorários, estes fixados em R$1.500,00.

Nas razões recursais de fls. 337/345, sustenta o apelante que a entrega do imóvel estava prevista para julho/2004 e que até os dias atuais a apelada sequer teria dado início às respectivas obras, que em 2006 teria tentado rescindir a avença, mas o que apenas conseguiu após ajuizar uma outra ação, face aos empecilhos colocados pela apelada, que a conduta ilícita desta última teria lhe causado enormes transtornos, como a necessidade de residir na casa de familiares, aborrecimentos e a frustração do sonho de ter uma casa própria, gerando um verdadeiro dano moral passível de reparação e pleiteando a fixação de uma indenização a tal título no valor de, no mínimo, R$80.0000,00.

Intimada, ofertou a apelada as contrarrazões de fls. 351/367, pugnando pelo não provimento do recurso aviado.

Estando o apelante dispensado do preparo, por litigar amparado pela assistência judiciária, foi o recurso recebido às fls. 347.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à sua análise.

Do mérito

Em que pese meu profundo respeito pelo entendimento firmado pelo digno Juiz a quo e a despeito de ter a apelada insistido em alegar que não praticou qualquer ilícito e que o apelante não teria vivenciado nenhum dano moral passível de reparação, fato é que todas as provas e evidências que vieram ao feito acabaram por demonstrar exatamente o contrário.

Primeiramente, imprescindível notar que a apelada não conseguiu trazer ao processo absolutamente nenhuma prova concreta que fosse capaz de justificar a sua conduta, de não ter, diga-se de passagem, até hoje, sequer dado início às obras objeto da contratação firmada entre as partes, cuja entrega estava prevista para o mês de julho do longínquo ano de 2004, apesar de não ter o ora apelante, e ao que tudo indica também os demais contratantes, descumprido com a obrigação de efetuar os pagamentos que devidos.

É fato que o contrato de promessa de compra e venda previa a possibilidade de atraso na entrega do imóvel de até 120 dias úteis, cerca de seis meses, do que se conclui que o aceitável, segundo os termos da contratação, seria a entrega do bem até janeiro de 2005, contudo a espera frustrante do apelante prolongou-se até setembro/2006, ou seja, mais de um ano e meio depois da data limite para o atraso (e não para a entrega), quando, depois de também frustradas as tentativas empreendidas junto à apelada para obter a justa rescisão da avença, decidiu por ajuizar a competente ação para alcançar tal objetivo, pleito que foi, válido destacar, julgado inteiramente procedente, dados todos esses que deixam mais do que evidente a desídia e, mais, o ilícito praticado pela apelada.

Não é demais destacar que, como acima já mencionado, a apelada até hoje não se dignou sequer a dar início às obras, como noticiado nos autos e em momento algum rechaçado, de modo que, considerando a data prevista para a entrega (julho/2004), o seu atraso já se prolonga por absurdos oito anos e meio, fato que deixa ainda mais latente a sua desídia.

Os dados acima são suficientes para comprovar não apenas a responsabilidade, o ilícito praticado pela apelada, como também a configuração dos danos morais suportados pelo apelante, na medida em que a situação posta em análise, ao contrário do que constou do julgado a quo, não se limitou a um simples descumprimento contratual, este sim sem capacidade para dar ensejo aos danos discutidos, mas, na verdade, provocou a frustração de um sonho do apelante, criou-lhe falsas expectativas, gerou-lhe aborrecimentos desmesurados e deixou-o absolutamente decepcionado em relação a um planejamento que não se faz do dia para a noite, pois como é de conhecimento geral, a aquisição de um imóvel não se trata de uma decisão ou de um negócio simples, e sendo certo que tal situação prolongou-se por tempo mais do que razoável ou aceitável.

A respeito do tema, outro não vem sendo o posicionamento consolidado por este Tribunal, como se depreende dos exemplos abaixo transcritos:

EMENTA: Ação de obrigação de fazer cumulada com indenização - atraso na entrega do imóvel - cláusula de carência e cláusula penal - razoabilidade - indenização suplementar - impossibilidade - ausência de pactuação - parágrafo único do art. 416 do CC - danos morais - ocorrência - fixação - razoabilidade e proporcionalidade - apelação à que se dá parcial provimento. É válida a cláusula de tolerância em contrato de compra e venda de imóvel em construção, desde que expressamente pactuada, e fixada com prazo razoável para o atraso na entrega. A cláusula penal implica arbitramento prévio das perdas e danos em caso de inadimplemento. O contratante faz jus apenas ao valor contratado, caso não tenha sido estipulada indenização suplementar. Incidência do parágrafo único do art. 416 do Código Civil de 2002. O descaso da construtora, representado pela não entrega do imóvel no prazo contratado, implica desrespeito ao consumidor, além de meros aborrecimentos, a ensejar danos morais indenizáveis. Na fixação do quanto indenizatório o juiz deve se pautar pelos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0145.11.052582-4/001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - APELANTE(S): JONATHAN MORATORI - APELADO(A)(S): API SPE 26 PLANEJAMENTO DESENVOLVIMENTO EMPREEND IMOBILIARIOS LTDA - RELATOR: DES. MARCELO RODRIGUES)

EMENTA: "AÇÃO INDENIZATÓRIA. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. CONSTRUTORA. ENTREGA DO IMÓVEL. ATRASO INJUSTIFICADO. FORÇA MAIOR. NÃO OCORRÊNCIA. INDENIZAÇÃO DANOS MATERIAIS. TERMO INICIAL. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. 1) Não configura força maior o problema decorrente da negligência da Construtora ao planejar a execução de suas obras. 2) A condenação da construtora ao pagamento da multa contratual ao comprador inocente, em razão da inexecução do contrato, impede a cobrança de reparação pelos alugueis pagos, sob pena de se punir duplamente a construtora que deixou de entregar o imóvel no prazo contratado (art. 916 CC/16 e 408 CC/02). 3) Caracteriza dano moral indenizável a conduta da Construtora de procrastinar, sem motivo justificado, a entrega da obra, frustrando o sonho do comprador de ter a casa própria. 4) A quantificação do dano moral obedece ao critério do arbitramento judicial, que, norteado pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixará o valor, levando-se em conta o caráter compensatório para a vítima e o punitivo para o ofensor." (APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.11.021178-6/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): PABLO CESAR GOMES PEREIRA - 1º APELANTE: CLEIDINEIA FERREIRA PACHECO E OUTRO(A)(S) - 2º APELANTE: CONSTRUTORA TENDA LTDA - APELADO(A)(S): PABLO CESAR GOMES PEREIRA, CLEIDINEIA FERREIRA PACHECO E OUTRO(A)(S), CONSTRUTORA TENDA LTDA - RELATOR: DES. MARCOS LINCOLN)

EMENTA: AGRAVO RETIDO - INDEFERIMENTO PROVA ORAL - NÃO ESSENCIAL - NEGAR PROVIMENTO - APELAÇÃO CÍVEL - COMPRA DE IMÓVEL - PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE ENTREGA PREVISTO NO CONTRATO - RAZOÁVEL - LEGALIDADE - ENTREGA DO BEM APÓS O PRAZO DE PRORROGAÇÃO - INADIMPLEMENTO CONTRATUAL - CONFUGURADO - MULTA - CABÍVEL - DANO MORAL - POSSIBILDIADE - ALTERAÇÃO PREJUDICIAL DA DISPOSIÇÃO DAS VAGAS DE GARAGEM APÓS A REALIZAÇÃO DO NEGÓCIO - DANOS MORAIS - CONFIGURADOS. O julgamento sem a produção de prova oral não implica cerceamento de defesa quando esta não é necessária à resolução da lide. Conforme art. 130 do CPC, ao julgador incumbe indeferir, mesmo de ofício, a prova que não seja útil, porquanto destinatário real da prova. É legal a cláusula contratual que prevê a prorrogação do prazo razoável para entrega do imóvel, considerando o princípio pacta sunt servanda. O atraso na entrega do imóvel, após o prazo de prorrogação, por culpa dos promitentes vendedores, caracteriza inadimplemento contratual, podendo incidir multa. Há dano moral se a construtora, de modo injustificado, atrasa, por longo período, a entrega de imóvel, impedindo o comprador de dele tomar posse na data aprazada. A modificação prejudicial da disposição das vagas de garagem do imóvel após a realização do negócio gera dano moral. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.10.279905-3/004 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - 1º APELANTE: HABITARE CONSTRUTORA INCORPORADORA LTDA - 2º APELANTE: MARCELO MELGAÇO DE MORAIS - APELADO(A)(S): MARCELO MELGAÇO DE MORAIS, HABITARE CONSTRUTORA INCORPORADORA LTDA - RELATOR: DES. EVANDRO LOPES DA COSTA TEIXEIRA)

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AUSÊNCIA DE ENTREGA DO IMÓVEL NO PRAZO PROMETIDO - ALUGUÉIS DEVIDOS - DANO MORAL RECONHECIDO - PROVIMENTO PARCIAL. Deixando a construtora de efetuar a entrega do imóvel prometido à venda, deve responder pelos aluguéis pelo tempo de descumprimento da obrigação. Evidenciado o abalo psicológico frente à frustração decorrente da ausência de entrega do imóvel comprovado, impõe-se o reconhecimento do dano moral indenizável. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0145.11.042834-2/001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - APELANTE(S): NEMÊNCIO LUDTKE NUNES - APELADO(A)(S): API SPE 26 PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁR, ASACORP EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES S/A - RELATOR: DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA)

De tal sorte, restaram incontestes a responsabilidade da apelada, os danos morais suportados pelo apelante, danos estes que superaram e em muito a categoria de mero aborrecimento, bem como o nexo de causalidade entre um e outro, do que se verifica pela presença de todos os requisitos necessários para a configuração do dever reparatório da primeira.

No que alude ao valor indenizatório, necessário inicialmente registrar que a sua quantificação, por não possuir critérios fixos e determinados, dever ser feita com o prudente arbítrio do Julgador, com a observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e sempre tendo em vista os objetivos do instituto do dano moral, quais sejam, reparar os danos causados à parte lesada, punir o agente pela conduta já adotada e inibi-lo na adoção de novas condutas levianas e ilícitas, devendo ainda ser levando em conta o grau de culpa, o nível socioeconômico da parte lesada e o porte econômico do agente.

Na hipótese específica dos autos, não obstante a enorme frustração sofrida pelo apelante, necessário salientar que a natureza do ilícito praticado, o grau de culpa da apelada e a condição socioeconômica de ambas as partes, impedem a fixação de uma indenização significativamente elevada, sobretudo no exagerado montante equivalente a 100 (cem) salários mínimos, como pretende o apelante, que mais se aproxima dos valores indenizatórios normalmente arbitrados nas hipóteses de morte, supera, em muito, os comumente adotados pelos tribunais pátrios em casos análogos e, ainda, implicaria no enriquecimento sem causa daquele.

Sopesando-se todas as considerações acima feitas e os elementos informativos constantes dos autos, acredita este Relator que o mais justo e equânime seja a fixação de uma indenização por danos morais em favor do apelante no importe de R$6.780,00 (seis mil setecentos e oitenta reais), por ser a quantia que mais atende os objetivos do instituto do dano moral, que mais se amolda aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como às peculiaridades do caso em análise e aos valores normalmente adotados por este Tribunal, mas sem premiar o enriquecimento ilícito, a qual deverá ser devidamente corrigida pelos índices da CGJ/MG e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir da publicação deste acórdão, ou seja, do efetivo arbitramento.

Ante todo o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso e reformo a sentença de 1º Grau, para julgar parcialmente procedente o pedido inicial e condenar a apelada a pagar ao apelante a quantia de R$6.780,00 (seis mil setecentos e oitenta reais) a título de danos morais, acrescida de correção monetária pelos índices da CGJ/MG e de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir da publicação deste acórdão.

Como a fixação da indenização por dano moral em quantia inferior à pretendida não importa em sucumbência, a teor da Súmula 326 do STJ, condeno a apelada no pagamento das custas e despesas processuais de ambas as Instâncias, bem como dos honorários advocatícios, estes no mesmo patamar estabelecido no julgado primevo.

DES. JOÃO CANCIO (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES - De acordo com o(a) Relator(a).
 
SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO."

Fonte: TJMG