terça-feira, 9 de abril de 2013

Indenização por cheques adulterados e inserção do nome nos cadastros de créditos

EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - DOCUMENTOS FALSIFICADOS UTILIZADOS PARA A COMPRA DE MERCADORIA E EMISSÃO DE CHEQUE - CONFERÊNCIA - NEGLIGÊNCIA - INSCRIÇÃO NEGATIVA - IMPOSSIBILIDADE - RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR - RESSARCIMENTO DEVIDO. - A inscrição do nome de devedor no rol de inadimplentes, pela fornecedora de produtos, sem se averiguar a regularidade da documentação apresentada e do cheque emitido por falsário no ato da compra, é apta a caracterizar o fato do serviço/produto disciplinado pelo Art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. - Nesse caso, a responsabilidade do fornecedor do serviço é objetiva, só sendo afastada se e quando demonstrar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexistiu, ou, então, que foi do consumidor ou de terceiro a culpa exclusiva. - Em ação de indenização por danos morais, decorrentes de indevida inscrição de nome no cadastro dos inadimplentes, não se exige a comprovação dos danos morais, que surgem automaticamente, tão logo se dê a negativação indevida. - Embora a avaliação dos danos morais para fins indenizatórios seja das tarefas mais difíceis impostas ao magistrado, cumpre-lhe atentar, em cada caso, para as condições da vítima e do ofensor, o grau de dolo ou culpa presente na espécie, bem como para a extensão dos prejuízos morais sofridos pela ofendida, tendo em conta a finalidade da condenação, que é pedagógica, de forma a desestimular o causador do dano de praticar futuramente atos semelhantes, e propiciar ao ofendido meios para minorar seu sofrimento, evitando, sempre, que o ressarcimento se transforme numa fonte de enriquecimento injustificado ou que seja inexpressivo ao ponto de não retribuir o mal causado pela ofensa.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.08.278263-2/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): VALDIR SANTOS CRUZ - APELADO(A)(S): DMA DISTRIBUIDORA S/A - RELATOR: EXMO. SR. DES. OTÁVIO PORTES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador BATISTA DE ABREU , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL.

Belo Horizonte, 04 de fevereiro de 2011.

DES. OTÁVIO PORTES - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. OTÁVIO PORTES:

VOTO

Conhece-se do recurso, eis que presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos à sua admissibilidade.

Trata-se de ação de indenização por danos morais c/c repetição de indébito proposta por Valdir Santos Cruz em face de DMA Distribuidora S/A, afirmando que teve seu nome inscrito no Serasa pela ré mesmo sem jamais terem as partes entabulado qualquer relação jurídica, o que lhe provocou danos morais, pugnando pelo respectivo ressarcimento e cancelamento da dívida apontada.

O MM. Juiz de primeiro grau (fls. 73/79) julgou improcedentes os pedidos inicias, condenando o autor no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em R$500,00 (quinhentos reais), ficando suspensa a exigibilidade em razão de litigar sob o pálio da assistência judiciária gratuita.

Inconformado, apela Valdir Santos Cruz (fls. 80/89), alegando que não celebrou qualquer negócio jurídico com a recorrida e, portanto, o contrato firmado em seu nome é fraudulento. Afirma que a ré não se desincumbiu de seu ônus de comprovar a existência de qualquer relação jurídica entre as partes. Aduz, ainda, que a requerida agiu de forma descuidada e negligente ao incluir de forma indevida o nome do autor nos cadastros de inadimplentes, já que tinha meios de conferir a autenticidade do cheque falsificado, não tendo nem mesmo demonstrado o mínimo de cuidado na conferência dos documentos do pretenso cliente. Pugna, assim, pela reforma da sentença com a procedência dos pedidos iniciais e a inversão dos ônus sucumbenciais.

Contra-razões recursais às fls. 94/109, pugnando a apelada pela manutenção da sentença hostilizada.

A meu sentir, razão assiste ao apelante.

De fato, do exame dos autos constata-se que a ré inscreveu o nome do apelante no cadastro de inadimplentes - Serasa - em virtude de suposta compra efetuada em 21.08.2008, como incontroverso nos autos.

Ocorre que, conforme reconhecido pela própria apelada, na espécie 'se outra pessoa utilizou o cheque do mesmo portador, documentação furtada para realizar compras no estabelecimento da contestante, tal fato não é detectável pelos operadores de caixa' (fl. 33). Assim, atribui culpa pelos danos causados a terceiros, quais sejam, falsários que utilizaram tais dados e documentos fraudados para procederem à abertura de conta junto à instituição financeira, com emissão de talão de cheques.

Nada obstante, entendo que após a inscrição o dano já estava consubstanciado, e a mera existência de defeito na prestação do serviço, como se deu no caso, somada ao dano e ao nexo etiológico entre eles, autoriza a condenação ao dever de indenizar, uma vez aplicar-se à espécie o Código de Defesa do Consumidor.

Tal diploma, ao consagrar a responsabilidade pelo fato do serviço, trouxe relevantes inovações no âmbito da responsabilidade civil, assegurando ao consumidor, independentemente do fornecedor ter agido sem culpa, o direito à reparação pelos acidentes de consumo, decorrentes do serviço prestado de maneira defeituosa.

Dispõe o art. 14 do CDC:

'Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.' (grifei)

A exceção à responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços delineada pelo suso transcrito artigo vem no seu § 3º, verbis:

'§ 3º. O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.'

Como brilhantemente observa o desembargador Francisco de Assis Vasconcellos Pereira da Silva, do Tribunal de Justiça paulista, no julgamento da apelação cível nº 208.071-1/3, para o Código de Defesa do Consumidor a responsabilidade com apuração da culpa (negligência, imprudência ou imperícia) já não era mais suficiente para salvaguardar os direitos do consumidor no mercado de consumo atual. Se, toda vez que sofresse algum dano, o consumidor tivesse que alegar culpa do fabricante do produto ou do prestador do serviço, suas chances de ser indenizado seriam mínimas, pois a apuração e prova da culpa são muito difíceis.

Com efeito, no mundo atual, de consumo de massa, o importante é o fato de que mesmo que o fabricante ou o prestador do serviço não aja com culpa, ainda assim seus produtos e serviços eventualmente apresentam defeitos e podem ocasionar danos.

É a chamada 'responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço prestado' ou, em outras palavras, é a preocupação com o dano que a coisa, o produto, bem como o serviço em si, possam causar ao consumidor. É a teoria moderna que coloca o próprio objeto e serviço como causas do evento danoso, pois são eles, em si mesmos considerados, os causadores do evento danoso.

Comentando o citado dispositivo do estatuto consumerista, James J. Marins de Souza pontua:

'O fato do serviço é a causa objetiva do dano ocasionado ao consumidor em função de defeito na prestação de serviço, isto é, a repercussão do defeito do serviço, causadora de danos na esfera de interesse juridicamente protegido do consumidor (...) Responsabilizam-se independentemente da apuração de culpa todos os fornecedores de serviço, quer imediatos como mediatos, solidariamente, pelos danos ocasionados aos consumidores em função de defeito na prestação do serviço ou por incompletude nas informações acerca da segurança na sua execução ou fruição.' (Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins, Código do Consumidor Comentado, RT, 2ª tiragem, p. 47)

Percebe-se, outrossim, que o fornecedor de serviços/produtos responde, em regra, independentemente de culpa perante o consumidor porque, ao exercer sua atividade econômica, assumiu os riscos inerentes à profissão que desenvolve no mercado de consumo. Destarte, ocorrendo um acidente de consumo que causa danos à personalidade do consumidor ou de outra vítima, que é equiparada ao destinatário final de produtos e serviços para os fins de proteção legal (art. 17 da Lei 8.078/90), cabe a responsabilidade do fornecedor independentemente de culpa (cf. Roberto Senise Lisboa, 'Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo', 2001, p. 237).

Outra não poderia ser a posição da jurisprudência, que acolhe integralmente esta orientação:

'Tratando-se de defeito (imperfeição do serviço), a responsabilidade do fornecedor do serviço é objetiva, só sendo afastada se e quando demonstrar (e a prova fica a seu cargo) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexistiu, ou, então, que foi do consumidor ou de terceiro a culpa exclusiva (artigo 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor)' (TJSP - 6ª C. Dir. Privado - AC 70.286-4 - Rel. Antonio Carlos Marcato - j. 29.04.1999)

'O Código de Defesa do Consumidor responsabiliza o fornecedor, independentemente da existência de culpa, pelo reparo dos danos causados ao consumidor, por defeito na prestação de serviços (art. 14). Apenas eventual culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, e não a concorrente, pode elidir a responsabilidade.' (TAPR - 1ª C. - Ap. 66.096-8 - Ementa 3/9.915 - Repertório IOB de Jurisprudência 15/94)

Ora, na hipótese 'sub cogitatione' restou demonstrado o defeito do serviço/produto, vez que realizada a compra de bem com documentação - e cheque - falsa e posteriormente procedida a negativação do nome do autor sem que este tivesse qualquer ciência do que estava acontecendo.

De fato, um terceiro, que não foi identificado, falsificou documentos do autor e através deles realizou negócios com a empresa apelada e assim usufruiu dos seus serviços, conquanto indevidamente. A falha na prestação do serviço pela recorrida é patente, posto que cabia a ela averiguar a veracidade daquelas informações e documentos apresentados pelo terceiro para a contratação, bem como da assinatura lançada no título apresentado para pagamento.

Com efeito, para a formalização do contrato, há a necessidade, por parte do comprador, da entrega de uma série de documentos e de prestação de informações, as quais devem ser devidamente conferidas pela fornecedora de produtos, para que não se corra o risco da ocorrência de fraudes que possam acarretar prejuízos não só a ela, mas também a terceiros.

Se, porventura, o vendedor (que nada mais é do que um fornecedor de produtos, nos termos do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor) não age com a devida cautela, averiguando a autenticidade de todas as informações que lhe são repassadas, bem como a veracidade das informações contidas nos documentos que lhe são entregues, assume o risco da produção de um evento danoso não só para si, mas também para terceiros, em caso de fraude, sendo que, em face disso, deve indenizá-los.

Partindo desse pressuposto, e analisando o caso em tela, verifica-se que, conquanto tenha a recorrida afirmado que agiu com todo o zelo necessário quando da contratação com o falsário, na realidade constata-se que assim não procedeu.

Isso porque se tivesse agido com o mínimo de cautela, e fizesse a averiguação das informações e das assinaturas constantes nos documentos apresentados à ela, teria checado os dados e verificado, por exemplo, que a assinatura no cheque não era a do apelante (na verdade, sequer há nos autos prova de que a apelada realmente exigiu documentação do estelionatário).

Ademais, com a devida venia, deveria a suplicada, ao aceitar pagamento mediante cheque, forma que a prática comercial hodierna já repudia, haja vista ser tal documento objeto de constantes fraudes, exigir do falsário um pouco mais do que a mera apresentação de um documento de identidade, que, diga-se, também foi extraviado.

Se fosse o comprador forçado a passar referências bancárias, comerciais ou até mesmo pessoais para a compra desejada, seria de pronto constatada fraude pela ré, e, assim não fazendo, assumiu o ônus de ser omissa, ou até negligente, o que configura o ilícito civil hábil a motivar indenização.

Quanto ao dano, surge, independentemente de prova, após a negativação indevida do nome de alguém no rol de inadimplentes.

Segundo Carlos Alberto Bittar:

'Danos morais são lesões sofridas pelas pessoas, físicas ou jurídicas, em certos aspectos de sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem. São aqueles que atingem a moralidade e a afetividade da pessoa, causando-lhe constrangimentos, vexames, dores, enfim, sentimentos e sensações negativas. Contrapõem-se aos danos denominados materiais, que são prejuízos suportados no âmbito patrimonial do lesado. Mas podem ambos conviver, em determinadas situações, sempre que os atos agressivos alcancem a esfera geral da vítima, como, dentre outros, nos casos de morte de parente próximo em acidente, ataque à honra alheia pela imprensa, violação à imagem em publicidade, reprodução indevida de obra intelectual alheia em atividade de fim econômico, e assim por diante.

Os danos morais atingem, pois, as esferas íntima e valorativa do lesado, enquanto os materiais constituem reflexos negativos no patrimônio alheio. Mas ambos são suscetíveis de gerar reparação, na órbita civil, dentro da teoria da responsabilidade civil.'

Nesta seara, é relevante ainda transcrever a brilhante lição do Professor Caio Mário:

'O fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos'. (Caio Mário da Silva Pereira: Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro, Forense, 1994, p. 54)

Ou ainda:

'O ofendido ou vítima deve receber não pelas perdas materiais, senão, também, pelas restrições ocasionadas em seu bem-estar ou em suas conveniências, pelas incomodidades, pelas agitações, pelos vexames' (in Dano Moral e sua Reparação, de Augusto Zenun, 2ª ed., Forense, p. 132, TAMG ApCív. 287.528-9)

Erigido como direito individual na Constituição de 1988, o dano moral encontra-se esculpido nos incisos V e X do artigo 5º da Magna Carta. Dizem eles:

'V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem.

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.'

O dano moral, na relação descrita nos autos, está consubstanciado pelo sofrimento, injusto, infligido pela apelada ao autor, pela inscrição indevida de seu nome no cadastro do Serasa, ato este de valor social desprimoroso, ou seja, 'o que a dor retira à normalidade da vida, para pior' (Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, SP, Ed. RT, 3.ª ed., tomo XXVI, p. 32, § 3.108, n. 2)

Ora, o descrédito econômico, enquanto perda de confiança pública na capacidade de cumprir as obrigações negociais, é, sobretudo na sociedade capitalista, pesada ofensa à honra. Mas, por haver a mesma ofensa, não seria sequer necessário que estivesse presumida, como está, a difusão do conteúdo do registro: chegaria o desgosto de o saber vigente, como obra de infidelidade à palavra (DC 15/168).

E como é pacífico, não se pode deixar de oferecer compensações psicológicas ao ofendido moral que, embora incapacitado de obter a exata satisfação pela lesão sofrida, poderá, porventura, ter os meios ao seu alcance para encontrar substitutivos, ou alívios, ainda que incompletos, para o sofrimento.

Dentro da natureza das coisas, não pode o que sofreu lesão moral recompor o 'status quo ante', restaurando o bem jurídico imaterial da honra, da moral, da auto estima agredidos.

No sistema capitalista a consecução de recursos pecuniários sempre é motivo de satisfação pelas coisas que podem propiciar ao homem.

A indenização, 'in casu', além de servir para compensar o autor pelos danos causados pela negativação de seu nome no SERASA apresenta, sem dúvida, um aspecto pedagógico, pois serve de advertência para que o causador do dano não repita a conduta ilícita.

Esse posicionamento sobre o caráter compensatório e punitivo da reparação do dano extrapatrimonial (ou moral), que vem sendo proclamado pelas nossas Cortes de Justiça, foi haurido na doutrina alienígena, na qual está assentado há várias décadas.

É exatamente esta a justificativa para a condenação por danos morais na espécie - dar ao lesado pela prática abusiva que foi desenvolvida uma compensação pelos reflexos negativos decorrentes da inscrição indevida de seu nome no SERASA. Tal compensação nada mais é do que uma contrapartida pelo mal sofrido, com caráter satisfativo para o autor e punitivo para a requerida, causadora do dano, para que se abstenha de repetir, outras vezes, essa conduta.

É inegável, outrossim, que o autor sofreu um dano em sua intimidade, revelado pela inscrição de seu nome no index dos inadimplentes, circunstância que, hodiernamente, causa sério abalo a qualquer cidadão comum, seja pelo sofrimento de responder por algo que não cometeu, seja pelo descrédito que passa a ter no meio social em que vive (RJTAMG 66/153).

Neste passo, cumpre ainda registrar que a partir do momento em que a esfera jurídica do apelante foi atingida pela inscrição indevida de seu nome no cadastro dos inadimplentes, não há que se perquirir se ele passou por situação vexatória ao ter seu crédito negado em uma loja, ou foi motivo de chacota por causa de cheque não aceito, (...) - é hoje entendimento pacífico o de que a inscrição indevida de nome no SPC/ERASA, por si só, acarreta a responsabilidade de indenização do dano moral, sendo despicienda a prova do efetivo prejuízo:

'MOREIRA DINIZ(...) não seria necessário que o apelado trouxesse qualquer documento ou declaração a demonstrar que teve recusado crédito ou que sua idoneidade financeira tenha sofrido outra forma concreta de abalo. (...) não é necessário, para a caracterização do dano moral, que a vítima sofra constrangimento mediante recusa de crédito por outra pessoa, física ou jurídica. A simples consignação do nome de alguém no cadastro de devedores do SPC já é, por si, suficiente para gerar dano moral reparável, uma vez que qualquer cidadão sofre as conseqüências íntimas da notícia da restrição a seu nome. A angústia e a aflição causadas por essa restrição são suficientes para afetar a vida normal de qualquer pessoa, alterando seu estado orgânico e psíquico.' (RJTAMG 69/392-393) (grifamos)

Exemplo de tal entendimento temos ainda com o julgamento do Recurso Especial n° 171.084-MA - Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, corroborando o entendimento ora exposto. O ilustre relator deste acórdão assim se posicionou:

'A questão da reparabilidade de danos morais e a desnecessidade de comprovação de prejuízo constituem matérias sedimentadas no atual direito brasileiro, tendo a Constituição de 1988 posto fim a antiga discussão a respeito da possibilidade ou não de se apurar danos morais fora dos casos expressamente previstos no Código Civil, muito embora a dicção do art. 159 desse texto já fosse suficiente para se posicionar afirmativamente à tese'.

A jurisprudência deste E. Tribunal e de diversos outros Pretórios, bem como a doutrina, não discrepam desse entendimento:

'Suficiente, pois, a prova da possibilidade de conhecer os efeitos danosos de nossos atos para que nasça a obrigação de indenizar o prejuízo ocorrido' (AGUIAR, Henoch, 'in' 'Hechos e Actos Jurídicos', Buenos Aires: Ed. Tea, 1950, p. 255 - ApC. nº 270.948-0 - TAMG)

'Após a Constituição de 1.988, tornou-se definitivamente assentado o entendimento de que responde pela reparação do dano moral a empresa que, de forma errônea, registra o devedor no SPC, sendo dispensável qualquer perquirição quanto à existência também de prejuízos patrimoniais' (CAHALI, Yussef Said, Dano Moral, 2ª Ed., São Paulo: Ver. Tribs., 1998, p. 426)

Ressai do acima exposto que a inscrição indevida do nome do autor no Serasa gerou seu direito de ser indenizado pelos danos morais correlatos, não sendo seu ônus demonstrar quaisquer prejuízos advindos, já que subjetivos.

Importante mencionar que as diversas outras anotações constantes dos autos, todas contra o autor, foram devidamente rechaçadas pelas alegações exordiais, sendo identificadas como originárias da mesma abertura indevida de conta-corrente pelo falsário que se utilizou dos dados e documentos do suplicante, sendo de se ressaltar, ainda, que as inscrições negativas tiveram início nas mesmas épocas e resultaram de negociações feitas logo após o boletim de ocorrência de fls. 17, que atesta o extravio dos documentos do requerente, fato este alegado na inicial e não contestado pela ré, donde se infere não terem sido provocadas pelo apelante.

Resta, então, avaliar o montante indenizatório fixado.

Carlos Alberto Bittar, estudando os critérios para a fixação dos danos morais, ensina que 'ainda se debate a propósito de critérios de fixação de valor para os danos em causa, uma vez que somente em poucas hipóteses o legislador traça nortes para a respectiva estipulação, como no próprio Código Civil (art. 1.537 e ss.), na lei de imprensa, na lei sobre comunicações, na lei sobre direitos autorais, e assim mesmo para situações específicas nelas indicadas.'

Ensina ainda o ilustre professor:

'Tem a doutrina, todavia, bem como algumas leis no exterior, delineado parâmetros para a efetiva determinação do quantum, nos sistemas a que denominaremos abertos, ou seja, que deixam ao juiz a atribuição. Opõem-se-lhes os sistemas tarifados, em que os valores são pré-determinados na lei ou na jurisprudência. Levam-se, em conta, basicamente, as circunstâncias do caso, a gravidade do dano, a situação do lesante, a condição do lesado, preponderando, a nível de orientação central, a idéia de sancionamento ao lesado (ou punitive damages, como no direito norte-americano).' (grifos nossos)

No caso em comento, as circunstâncias do caso (negligência da requerida ao examinar os documentos de estelionatário, somada a negativação do nome do autor em razão de cheque fraudado devolvido por insuficiência de fundos; as condições da ofensora e a gravidade do dano, principalmente, impõem uma condenação equivalente a R$ 3.000,00 (três mil reais), quantum este que venho arbitrando em casos de tal jaez.

Mediante tais considerações, dá-se provimento ao recurso para julgar procedente a demanda e assim condenar a ré ao pagamento de indenização ao autor pelos danos morais sofridos no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigido monetariamente pelos índices da TCGJMG a partir da data da publicação deste acórdão e acrescido de juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso. Condeno ainda a suplicada no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da condenação.

Custas recursais, pela apelada.

O SR. DES. WAGNER WILSON:

De acordo com o Relator.

O SR. DES. BATISTA DE ABREU:

VOTO

Estou negando provimento à apelação para manter a sentença apelada que julgou improcedente o pedido inicial.

Embora não referido no voto do Relator os motivos da improcedência do pedido mas por ser matéria que invade os escaninhos da justiça como costumeiro.

A obrigação de indenizar exige ato ilícito, culposo e danoso. E ainda exige provas da sua existência, do procedimento culposo e do dano.

Isso não está demonstrado no voto do Relator que a eles não se refere.

Não há que se falar em fornecedor de serviços que atrai responsabilidade objetiva porque ocorreu uma venda em supermercados onde a compra foi feita com cheque 'por outra pessoa que utilizou junto com documentação furtada. Se detectável pela operadora da caixa não é sua obrigação a consulta que pode até gerar constrangimento no emitente se verdadeiro.

Não há no voto do Relator a menor referencia à atitude culposa e a forma da culpa na aferição dos documentos apresentados na hora da compra. Não quem possa garantir que não fora diligente a operadora do caixa.

Não houve qualquer burla a CDC conforme citado pelo Relator: de o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. O serviço foi prestado corretamente tanto que o verdadeiro consumidor o possível falsário nada reclamou. O serviço não pode ser declarado defeituoso por quem não o recebeu.

Na verdade, de sã consciência, não há como garantir que não foi o próprio apelante quem fez a compra com seu cheque e não pagou por ela e sordidamente vem agora reclamar prevendo a facilidade de uma condenação como esta.

Quando se inicia um silogismo em cima de premissas falsas e inseguras o resultado será sempre equivocado.

Assim sendo, com estas poucas considerações estou negando provimento à apelação.

Custas, pelo vencido.

SÚMULA : DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL.

Fonte: TJMG